Ministério Público tem de concluir investigação a Mexia até 30 de setembro
Desde maio de 2018 até aos dias de hoje, já foram 23 pedidos de prorrogação do prazo, segundo consta no processo dos CMEC. Quer no mandato de Joana Marques Vidal, quer no mandato de Lucília Gago.
O Ministério Público (MP) tem de encerrar o inquérito do processo dos Custos de Manutenção de Equilíbrio Contratual (CMEC) até 30 de setembro. Este foi o derradeiro prazo autorizado esta segunda-feira pela PGR para os magistrados responsáveis pela investigação a Manuel Pinho, António Mexia e Manso Neto.
No documento, a que o ECO teve acesso, o gabinete de Lucília Gago sublinha que se “encontra em curso uma avaliação sobre a validade de diversos elementos de prova recolhidos no decurso do inquérito, avaliação que se tem por relevante para o saneamento (probatório) do processo e precípua formulação do juízo indiciário a realizar”.
No dia 10 de julho de 2017 – era ainda Joana Marques Vidal procuradora-geral da República –, o processo dos CMEC ganhava o ‘estatuto’ de aceleração processual. A investigação já durava há cinco anos (desde 2012) e a titular da investigação criminal dava o prazo de dez meses para o encerramento do inquérito. Ou seja, para os procuradores do MP arquivarem a investigação ou acusarem os arguidos no processo, até maio de 2018. Mas, nesse mês, os magistrados pediram a prorrogação desse prazo por tempo indeterminado mas com a obrigação de, três meses depois, darem conta à PGR como estava o desenrolar da investigação.
E este foi o início de um longo calvário de adiamentos de uma acusação a António Mexia, João Manso Neto, João Conceição e Manuel Pinho. Desde maio de 2018 até aos dias de hoje, já foram 23 os pedidos de prorrogação do prazo, segundo consta no processo dos CMEC. E, desses 23 pedidos (que foram sempre atendidos pela Procuradoria-Geral da República), 13 foram feitos de maio de 2018 a novembro de 2022 sempre sem fixação de prazo para o encerramento. O caso começou a ser investigado há 12 anos mas entretanto foi dividido em dois. Nesse segundo, Manuel Pinho e Ricardo Salgado já foram condenados (dez anos para o ex-ministro da Economia e seis para o antigo banqueiro por crimes como corrupção e branqueamento de capitais).
“Consideramos que este inquérito que dura inexplicavelmente há mais de 12 anos, e que já conta com 23 pedidos de adiamento ou prorrogação, já há muito que deveria ter sido encerrado”, dizem os advogados de Mexia: João Medeiros, Rui Costa Pereira e Inês Almeida Costa
A última data do prazo para encerramento do inquérito era precisamente o dia 1 de julho. Mas foi pedido novo adiamento. Isto porque, na sequência de um despacho do juiz de instrução Nuno Dias Costa, que ordenou a destruição de vários emails do processo, as defesas alegaram que essas comunicações contaminaram outras provas recolhidas posteriormente.
Os advogados de António Mexia, Manso Neto e João Conceição elencaram uma série de factos que também devem ser retirados do processo. Enquanto Nuno Dias Costa não decidir, o Ministério Público não irá acusar, sob pena de utilizar prova que, entretanto, foi retirada.
Logo em abril, os advogados de defesa de António Mexia e João Manso Neto pediam à Procuradoria-Geral da República que esclarecesse se os magistrados do caso EDP/CMEC , Carlos Casimiro e Hugo Neto, iam mesmo insistir em deduzir uma acusação ou se pediram uma nova prorrogação do prazo.
Em causa estão as decisões, quer do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), quer do juiz de instrução, que declararam nulos os emails apreendidos na investigação, mas que o MP insiste em usar como prova. Os advogados invocam a nulidade dos emails decretada pelo juiz de instrução a 17 de abril. Dizem então os advogados João Medeiros, Rui Costa Pereira e Inês Almeida Costa que – caso o faça – “o Ministério Público estaria dolosamente a frustrar e a violar, em toda a medida processual útil, uma decisão judicial a que deve obediência”.
Defendendo que “seria mesmo – e por isso não queremos acreditar que seja ou possa vir a ser – um golpe de Estado judiciário, através do qual o Ministério Público, achando-se acima de decisões jurisdicionais e lançando mão de manobras que, se acaso proviessem das defesas, seriam taxadas, no mínimo, como inadmissível chicana, agiria como se decisões não houvesse, que há, ou que não estivesse obrigado a cumpri-las, como está, Assim, aliás, pouco ou nada contribuindo para o prestígio da justiça em geral e do Ministério Público – prestígio, de resto, como é sabido, que bem preciso é, sempre, e agora em particular”.
Dizendo que, caso o MP o faça, estará a incorrer numa série de “ilícitos disciplinares”, bem como num crime de violação de correspondência e de prevaricação.
Dias antes, os advogados de João Conceição – Rui Patrício e Tiago Geraldo – enviaram um requerimento ao juiz de instrução do processo, alertando que, caso o MP insista em usar os emails considerados inválidos como prova para a acusação, estará a cometer o crime de desobediência à lei, de violação de correspondência e de prevaricação.
A 18 de abril, o juiz de instrução Nuno Dias Costa decidiu que a principal prova recolhida no caso do processo EDP/CMEC não é válida, já que a apreensão de emails tinha de ser feita com autorização de um juiz de instrução e não meramente por iniciativa do MP, como aconteceu. Assim, ordenou a destruição de centenas de milhares de emails apreendidos na sede de EDP, em junho de 2017, relativos a comunicações entre Mexia e Manso Neto.
Assim, o juiz de instrução ordenou a destruição da totalidade dos emails apreendidos em junho de 2017 na sede da EDP, discordando dos argumentos invocados pelo MP e recusou o pedido do MP para declarar a validade da utilização desses emails, socorrendo-se da decisão do STJ. O juiz ordena, assim, “a destruição de qualquer cópia digital ou impressão que conste do processo relativa aos 3.277 emails que foram objeto do despacho judicial”, mas também a destruição de “qualquer cópia digital ou impressão que conste do processo relativa aos restantes emails apreendidos aquando da apreensão daqueles 3.277”. E terão de ser os arguidos a dizer que emails consideram que têm de ser destruídos.
O que é o processo dos CMEC?
Foi há quase 12 anos que se deu a abertura de inquérito deste processo. O foco da investigação centrava-se nas suspeitas de favorecimento do Governo, na altura de José Sócrates, à EDP.
Com o decorrer da investigação, várias outras suspeitas foram nascendo, como a dos subornos superiores a cinco milhões de euros de Ricardo Salgado, ex-líder do BES, a Manuel Pinho, à data ministro da Economia de Sócrates. O processo acabou por ser dividido em dois: este relativo a Pinho, Manso Neto e Mexia, ainda sem acusação; e o segundo relativo a Pinho e Ricardo Salgado, ex-líder do BES, cujo julgamento já terminou e em que ambos foram condenados.
O caso está relacionado com os CMEC (Custos para a Manutenção do Equilíbrio Contratual) e o eventual favorecimento da EDP, no qual Mexia e Manso Neto são suspeitos de corrupção e participação económica em negócio para a manutenção das rendas excessivas, no qual, segundo o Ministério Público, terão corrompido o ex-ministro da Economia Manuel Pinho e o ex-secretário de Estado da Energia Artur Trindade. Em causa estão benefícios de mais de 1,2 mil milhões de euros alegadamente concedidos por Manuel Pinho à EDP, entre outubro de 2006 e junho de 2012.
Mexia foi constituído arguido a 2 de junho de 2017, na sequência de buscas à EDP. Tal como Manso Neto, antigo administrador da elétrica, é suspeito de quatros crimes de corrupção ativa e de alegados subornos ao antigo ministro Manuel Pinho (Governo Sócrates), ao ex-diretor-geral da Energia Miguel Barreto e a João Conceição, antigo consultor de Pinho no Ministério da Economia e atual administrador da REN.
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