UTAO detetou operações pouco habituais para baixar a dívida

Baleiras diz que a compra de obrigações e bilhetes explica 86% da redução em 2023 e que Medina congelou a dívida detida pelo FEFSS para garantir um rácio abaixo de 100% até o Governo sair de funções.

O coordenador da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), Rui Baleiras, revelou esta quarta-feira, no Parlamento, que a entidade que lidera decidiu “inovar” no relatório sobre a evolução da dívida pública, em 2023, porque “chegaram sinais que poderiam ocorrido operações não habituais para antecipar o momento em que dívida pública poderia descer abaixo dos 100%”. De recordar que o rácio ficou em 99,1% do PIB.

“Foi uma curiosidade que levou à inovação na coleção de estudos sobre a evolução da dívida”, afirmou durante a audição do Coordenador da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), Rui Baleiras, no âmbito do requerimento apresentado pelo grupo parlamentar do Chega.

Depois de ter solicitado “dados que não eram públicos ao Banco de Portugal”, a UTAO verificou que a “aquisição de títulos de dívida pública por parte das entidades da Administração Pública” contribuiu em 86% para a redução do rácio.

“Há uma parte importante da queda da dívida que se deve à compra significativa de obrigações do Tesouro e bilhetes do Tesouro. Essas compras líquidas por parte de entidades públicas representaram 8,3 mil milhões de euros. Trata-se de um acréscimo de 52% face ano ano anterior”, esclareceu o líder da UTAO.

Ora a “dívida consolidada na ótica de Maastricht caiu 9.340 milhões de euros”, indicou. Por isso, “as aquisições líquidas explicam 86% da redução” da dívida, concluiu. Por esse motivo, Rui Baleiras mantém que a “redução é artificial, explicada pela compra de dívida por entidades públicas”. “Não é a redução da dívida toda em 2023 que é artificial”, ressalvou.

Medina usou um expediente para garantir rácio abaixo de 100% até Governo sair de funções

Quanto às críticas do ex-ministro das Finanças, Fernando Medina, que classificou de “absurdo” o facto de a unidade que apoia os deputados da COFAP ter usado o decreto-lei de execução orçamental (DLEO) de 2024 para justifica a descida da dívida em 2023, Baleiras esclareceu que “ninguém das cinco pessoas que compõem a UTAO acha que o decreto tem efeitos retroativos”.

“Fizemos essa referência, porque nos pareceu ser um indício da vontade de se manter, até ao fim da vigência do Governo a dívida pública abaixo dos 100% ou próximo desse valor. O ex-ministro disse muito claramente que tinha o objetivo de pôr a dívida pública abaixo dos 100% e pôs”, esclareceu.

O coordenador da UTAO sublinhou que “o Governo sabia que estava de saída quando o decreto-lei de execução orçamental de 2024 foi aprovado”. E, no decreto, existia “uma norma que nos pareceu inovadora, porque a UTAO não a encontrou em diplomas congéneres, e que congelou a exposição do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) à dívida pública, o que daria um contributo muito importante na consolidação da dívida pública, pelo menos até ao final de março, até ao fim de vida útil do Governo”, acrescentou.

Através do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) e da Caixa Geral de Aposentações (CGA), foram investidos mais de 7,7 mil milhões de euros na aquisição de títulos de dívida da República, nomeadamente de obrigações do Tesouro, tal como o ECO noticiou. O DLEO de 2024 impedia que o FEFSS e CGA se desfizessem desses títulos até 31 de março.

O coordenador da UTAO reconheceu a importância da meta da dívida ficar abaixo dos 100%, desse “número mágico”. Porém, “do ponto de vista dos mercados estar a 100,1% ou 99,1% é o mesmo”, frisou. Face à reação exasperante de Fernando Medina pelo facto de ter mencionado o DLEO, Baleiras reconheceu que, “se pudesse voltar atrás, teria acrescentado a explicação” que deu no Parlamento, “de que era um indício para que a dívida pública não caísse logo no primeiro trimestre”.

“As contas trimestrais são muito importantes, mas, para o efeito das regras europeias, o que releva é a 31 de dezembro. No entanto, os mercados, as entidades independentes acompanham a dívida ao longo de todo o ano”, reforçou.

Baleiras ressalvou que, apesar da orientação para o FEFSS comprar dívida pública, “não foram desviados fundos para pagar pensões”. “Isso não está no relatório da UTAO. Não se deixou de pagar nenhuma pensão pelo facto do excedente de receita fiscal ter sido aplicado em dívida pública”, afirmou. Mas chamou a atenção para outro risco: “Até que ponto é prudente elevar a exposição desses ativos”.

No início da audição, o coordenador da UTAO quis deixar um alerta em relação à sua ida ao Parlamento: “Não é com prazer que chego à COFAP, correndo o risco legítimo de entrar no conflito político-partidário a propósito das Finanças Públicas. Sempre pretendi manter a entidade que lidero e a minha pessoa fora dessa luta. É-me penoso estar aqui, é desagradável censurar o comportamento do dr. Fernando Medina que conheço há muito tempo, mas compareço para responder as questões por respeito à casa da democracia e porque tenho o dever de prestação de contas”.

“Após esta audição espero que surja a oportunidade de trabalhar com a COFAP no sentido de avançar com estatutos da UTAO que permitam sobreviver à ameaça do status quo, sinalizou.

(Notícia atualizada às 16h58)

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