Maior eficiência hospitalar permitia subir em 20% as consultas e urgências mantendo a despesa
Economistas do Banco de Portugal alertam para a persistente deterioração do nível de eficiência dos hospitais públicos, apesar do aumento de recursos que têm sido canalizados para o sistema.
Aumentar a eficiência dos hospitais públicos portugueses permitiria aumentar em 20% o número de consultas, urgências, cirurgias e altas de internamento, mesmo mantendo inalterada a despesa com pessoal, consumos intermédios e número de camas, segundo um estudo publicado, na quinta-feira, na revista de Estudos Económicos do Banco de Portugal que teve por base a realidade de 22 hospitais públicos empresariais entre 2012 e 2022.
As autoras do estudo, cujas opiniões não vinculam o Banco de Portugal, concluem que a eficiência média dos hospitais públicos portugueses tem vindo a deteriorar-se há vários anos, sendo sobretudo notada a partir de 2017. “Os resultados por hospital apontam para uma elevada persistência daqueles que formam a fronteira de eficiência em cada anos e para uma diminuição generalizada das medidas de eficiência”, destacam.
De acordo com Cláudia Braz, Sónia Cabral e Leonor Cunha, o grau de ineficiência do sistema é de tal ordem que seria possível reduzir em 20% as despesas com pessoal, consumos intermédios e número de camas, e manter o mesmo de número de consultas, urgências, cirurgias e altas de internamento.
Utilizando a mesma lógica, que estima um valor médio de eficiência técnica de cerca de 0,8, consideram que seria também possível, em 2022, aumentar em 20% os resultados dos números de consultas, urgências e cirurgias, mantendo exatamente a mesma despesa.
As economistas destacam que os resultados do estudo apontam para “ineficiências consideráveis e para uma grande dispersão nos resultados de eficiência entre hospitais”.
Embora se tenha verificado em Portugal um aumento continuado da afetação de recursos financeiros das administrações públicas aos hospitais e aos serviços médicos, continua a ser incerta uma melhoria tangível da eficiência, e é visível algum descontentamento entre a população.
O modelo de análise que sustenta o trabalho académico denominado de “Uma Análise da Eficiência Hospitalar em Portugal” não tem em conta fatores exógenos ou efeitos de qualidade, mas as economistas incluem um indicador para avaliar a qualidade dos serviços de saúde prestados por estes hospitais, que revela “uma estabilização geral da qualidade média durante o período analisado”.
As autoras referem ainda que “os hospitais com maior eficiência técnica tendem também a prestar serviços de saúde superiores” e que “embora se tenha verificado em Portugal um aumento continuado da afetação de recursos financeiros das administrações públicas aos hospitais e aos serviços médicos, continua a ser incerta uma melhoria tangível da eficiência e é visível algum descontentamento entre a população”.
Entre os fatores que consideram contribuir para esta situação identifica o processo de orçamentação do SNS, que defendem carecer de “um controlo centralizado e tem enfrentado persistentemente um subfinanciamento, apesar da introdução de contratos-programa em 2003”.
Gastar mais não se tem traduzido numa maior eficiência do sistema
Apesar dos baixos níveis de eficiência verificados entre 2012 e 2022, destacam-se dois hospitais que se mostraram capazes de contrariar a tendência negativa, apresentando melhorias dos seus padrões de eficiência. Segundo as economistas, o Centro Hospitalar Baixo Vouga EPE e o Hospital Espírito Santo Évora foram a exceção à regra, tendo o Centro Hospitalar Trás-os-Montes Alto Douro aumentado a eficiência técnica, utilizando um outro modelo.
Segundo o estudo, os hospitais identificados como eficientes, constituindo a fronteira, permanece “limitado e consistente ao longo do período, variando entre três e cinco hospitais, consoante os anos”, como, por exemplo, o Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga EPE, Centro Hospitalar Universitário São João EPE e Hospital Santa Maria Maior EPE (Barcelos).
“A despesa hospitalar em Portugal tem registado uma tendência consistente de aumento ao longo das últimas duas décadas. Esta tendência pode ser atribuída, em grande medida, à crescente contribuição dos hospitais privados, cujas despesas são atualmente financiadas em metade pelo Estado”, referem as autoras.
As economistas recordam que, durante este período, “verificou-se uma mudança significativa na composição das atividades hospitalares e um aumento notável do número de serviços médicos prestados, exceto no período mais afetado pela pandemia”.
Existe insatisfação entre a população, frequentemente evidenciada pelas longas listas de espera para procedimentos médicos ou pela escassez de médicos a trabalhar para o setor público, bem como por falhas na orçamentação e no controlo centralizado. Neste contexto, a importância da realização de análises de eficiência torna-se ainda mais proeminente
“Ainda assim, existe insatisfação entre a população, frequentemente evidenciada pelas longas listas de espera para procedimentos médicos ou pela escassez de médicos a trabalhar para o setor público, bem como por falhas na orçamentação e no controlo centralizado. Neste contexto, a importância da realização de análises de eficiência torna-se ainda mais proeminente”, defendem.
Para as economistas Cláudia Braz, Sónia Cabral e Leonor Cunha, é necessário “estabelecer um benchmark absoluto para a atividade hospitalar em Portugal e determinar as estratégias mais eficazes para o atingir”.
“É também importante reconhecer a evolução contínua da arquitetura do SNS, nomeadamente com a introdução das ULS [Unidade Local de Saúde], o que implica uma transformação gradual no cenário de cuidados de saúde prestados pelos hospitais“, argumentam.
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