Há 24 detidos por crime de incêndio, 80% em prisão preventiva
A ministra da Justiça admite que a fuga de reclusos da cadeia de Vale de Judeus foi "uma situação grave" e realçou que o Governo está a adotar medidas para evitar que a repetição destes casos.
A ministra da Justiça disse esta sexta-feira no parlamento que em setembro havia 24 pessoas detidas por crime de incêndio, 80% das quais em prisão preventiva, ouvindo críticas do Bloco de Esquerda ao “populismo penal” do primeiro-ministro sobre os incêndios.
Na audição regimental da equipa do Ministério da Justiça que decorreu no parlamento, a ministra Rita Alarcão Júdice, apresentou dados da Polícia Judiciária (PJ) sobre incendiários detidos.
A governante respondia ao deputado Fabian Figueiredo, do Bloco de Esquerda, sobre os “alegados interesses que sobrevoam os incêndios” em Portugal, em referência às declarações do primeiro-ministro, Luis Montenegro, na sequência dos grandes fogos das regiões norte e centro.
A ministra disse que em setembro havia 24 pessoas detidas por “fortes indícios” de terem causado incêndios, florestais e não florestais, e que 80% se encontravam em prisão preventiva, com detidos em várias regiões do país.
“O que está a ser feito é a investigação profunda destas matérias de quem alegadamente perpetrou estes incêndios e perceber se existe um padrão que motive novas investigações. Não podemos é ficar apenas satisfeitos com a mera detenção, porque temos de perceber se existe um padrão”, disse a ministra, referindo não poder acrescentar mais sobre matérias em investigação criminal.
Acrescentou que está a ser estudada a inclusão da PSP nas equipas que investigam os incêndios e que às duas que funcionam no norte e centro pode vir a juntar-se uma terceira na zona sul, onde ainda não existe nenhuma equipa dedicada.
“Respondeu com dados sobre incendiarismo, que é um fenómeno que é preciso atender, combater, com base no conhecimento científico, evitando o populismo penal, que foi o que aconteceu”, comentou o deputado bloquista.
O parlamentar referia-se às declarações de Montenegro, que invocou alegados interesses em torno dos incêndios, entretanto desmentidos por investigadores especializados da PJ.
Questionada pelo Livre sobre a impugnação judicial dos termos do concurso para recrutamento de 570 novos funcionários judiciais, aberto a 10 de setembro, a ministra reiterou que os termos são iguais aos aplicados no concurso interior e que não foram questionados pelo Sindicato dos Oficiais de Justiça (SOJ), que interpôs a ação, acrescentando que ao contrário do concurso anterior, com pouco mais de 100 lugares e aos quais apenas houve cinco candidatos, este tem já 1.700 candidatos.
“Não obstante existir esta vontade de criar problemas numa solução que é urgente, temos de lidar com ela“, disse a ministra sobre a ação judicial.
Sobre o Centro de Estudos Judiciários (CEJ), Rita Alarcão Júdice disse que está a ser revisto o modelo de ingresso, prevendo-se alterações nas quotas, no processo de seleção e nos exames previstos, e adiantou que as obras do novo polo de Vila do Conde não estarão prontas a tempo do arranque do próximo ano letivo, mas que este vai arrancar com 60 vagas, em instalações provisórias, ainda em estudo com a autarquia local, segundo informações também prestadas pelo gabinete da ministra.
Depois de na intervenção inicial a ministra ter apresentado um primeiro balanço da agenda anticorrupção, do qual ressalta o código de conduta para o Governo e a criação do grupo de trabalho que vai preparar o novo regime jurídico da perda de vantagens da atividade criminosa — liderado pelo professor da Universidade de Coimbra Pedro Caeiro — PS e Iniciativa Liberal (IL) deixaram críticas à falta de ação e medidas concretas nesta matéria.
A ministra remeteu para a comissão eventual criada junto do parlamento o envio das propostas de diploma sobre as matérias em causa, como a regulamentação do ‘lobby’, algo que Mariana Leitão (IL) criticou, assim como a “falta de densificação” de algumas medidas da agenda.
Sobre reinserção social, o Governo reafirmou a intenção de rever a carreira dos vários técnicos afetos a esta área e adiantou que neste momento já não existe lista de espera para entrada em centros educativos para cumprimento de medidas tutelares educativas.
Fuga de Vale de Judeus foi “situação grave” que não pode repetir-se
A ministra da Justiça admitiu também que a fuga de reclusos da cadeia de Vale de Judeus foi “uma situação grave” e realçou que o Governo está a adotar medidas para evitar que a repetição destes casos.
“Isto que aconteceu não poderá voltar a acontecer“, vincou Rita Alarcão Júdice, garantindo que o seu ministério está a atuar para melhorar os aspetos de segurança das cadeias, onde decorre uma auditoria com esse propósito.
Na Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, em audição requerida pela Iniciativa Liberal (IL) e PS por causa da evasão ocorrida em Vale de Judeus, Rita Alarcão Júdice reconheceu que a fuga de cinco reclusos teve contornos “caricatos” e justificou que até então a única situação que tinha sido reportada era a “falta de água”, problema crónico que já constava de um relatório de 2017.
Rita Alarcão Júdice referiu que este problema da água em Vale de Judeus “está a ser resolvido” e lamentou a situação em que encontrou o sistema prisional, referindo que “a situação que encontrou é pior do que imaginava”, com problemas ao nível da sobrelotação e do edificado, entre outras.
A ministra prometeu “acautelar a situação” para melhorar as condições nas prisões, dando seguimento às obras “necessárias e urgentes”, e gerindo da melhor forma os recursos humanos e outros que disse serem “escassos”.
Questionada pela deputada Isabel Oneto (PS) sobre a “fita do tempo” que se seguiu à fuga, Rita Alarcão Júdice não entrou em pormenores, preferindo indicar que estão em curso investigações de natureza criminal (a cargo do Ministério Público e PJ) e disciplinar para apurar os factos ocorridos, não sendo nenhuma dessas investigações “da sua alçada”.
A ministra revelou que, em casos de fuga nas prisões, existia um protocolo de atuação que datava de 2017, o qual “nunca foi atualizado”, tendo este protocolo interno da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais desadequado contribuído para que houvesse atrasos e dificuldades de comunicação e de alerta após a fuga.
“O processo subsequente à fuga não correu bem. O protocolo de fuga estava desatualizado“, disse a titular da pasta da Justiça, garantindo que a atualização devida está a ser feita com a DGRSP.
Rita Alarcão Júdice rebateu as críticas de alguns deputados por a ministra só ter falado publicamente ao país dias depois da evasão, considerando que a sua conferência foi “dada quando devia ser dada”.
E assegurou que desde que a fuga foi conhecida, em 7 de setembro, manteve sempre uma estreita ligação e coordenação, quer com o Ministério da Administração Interna, quer com o diretor da PJ, Luís Neves.
Tendo sido criticado por Pedro Pinto (Chega) por não ter pedido o fecho imediato das fronteiras, a ministra replicou que “não se fecham fronteiras assim”, com toda a facilidade, pois trata-se de “um processo lento e burocrático” que exige a colaboração de órgãos de polícia internacional.
A ministra, que já nomeou um novo diretor para a cadeia de Vale de Judeus, considerou ser preferível que as escolhas dos diretores das prisões seja feita por nomeação e não por concurso, frisando que os concursos podem arrastar-se durante meses ou anos e não acautelar a escolha certa do responsável.
Na audição, Rita Alarcão Júdice anunciou que, em janeiro de 2025, avança o processo para a concretização de 205 promoções de chefias da guarda prisional, abrangendo 45 chefes, 150 guardas, cinco chefes principais e cinco comissários principais.
Por iniciativa de alguns deputados, foi trazida à discussão o fecho anunciado do Estabelecimento Prisional de Lisboa (EPL), tendo a ministra dito que “não é aconselhável que se deixe de fazer investimentos” nesta cadeia apenas porque a mesma vai ser encerrada e já não pertence ao património do Ministério da Justiça.
“Não podemos fazer isso (deixar de investir) só porque o EPL vai ser desativado”, disse, notando que ali estão muitos reclusos, incluindo presos preventivos.
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