Portugal manifesta “grande preocupação” com situação em Moçambique e pede contenção

  • Lusa
  • 13:56

Dispersadas pela polícia manifestações convocadas pelo candidato da oposição nas eleições de 9 de outubro, Venâncio Mondlane, para quem "verdadeiros terroristas" são as forças de defesa e segurança.

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, disse esta segunda-feira que o Governo português continua a acompanhar “com grande preocupação” a situação em Moçambique e apelou à contenção de todas as forças políticas e autoridades do país.

“Estamos a seguir a passo e passo, com grande preocupação”, disse Paulo Rangel, referindo-se aos últimos desenvolvimentos em Moçambique, onde nas últimas horas manifestações convocadas pelo candidato da oposição nas eleições de 9 de outubro Venâncio Mondlane foram dispersadas pela polícia.

A polícia moçambicana lançou também gás lacrimogéneo contra o local onde Venâncio Mondlane fazia declarações aos jornalistas, obrigando o político a fugir.

Paulo Rangel lembrou que Portugal já condenou na semana passada “de forma muito categórica” a violência que levou aos assassínios do assessor jurídico e do mandatário de Venâncio Mondlane e pediu agora contenção a “todas as forças políticas e a todas as autoridades”, de forma a haver garantia de “regularidade e estabilidade no processo eleitoral”.

“É fundamental para Moçambique que o processo eleitoral corra bem e que dele resultem autoridades legítimas e respeitadas por todos”, acrescentou o ministro português, que falava aos jornalistas em Madrid, onde hoje se reuniu com o homólogo espanhol, Jose Manuel Albares, e com os ministros da Defesa de Portugal e Espanha, Nuno Melo e Margarita Robles.

Rangel acrescentou que os últimos desenvolvimentos em Moçambique são também preocupantes “porque a imprensa foi afetada no seu trabalho”, reiterando que o Governo está a seguir a situação com preocupação.

“É fundamental que todo o processo eleitoral (…) decorra com caráter ordeiro, com caráter legal, com caráter regular. Moçambique tem uma democracia que precisa de ser afirmada”, sublinhou, acrescentando que, neste contexto, haver violência, “necessidade de intervenção policial”, desacatos ou “intervenções que podem pôr em causa a estabilidade” é algo que “preocupa muito” o governo português.

Também a União Europeia (UE) já classificou como “bastante preocupantes” as “notícias de dispersão violenta” de uma manifestação em Maputo, capital moçambicana, convocada pelo candidato Venâncio Mondlane, e disse que “continua a monitorizar” o desenrolar da situação.

“As notícias de dispersão violenta são bastante preocupantes”, disse um porta-voz do executivo comunitário numa resposta enviada à Lusa. A mesma fonte pediu “contenção máxima” de todas as partes envolvidas no processo eleitoral e o “respeito pelas liberdades fundamentais e direitos políticos”.

“A UE continua a monitorizar os desenvolvimentos em Moçambique, depois dos homicídios chocantes de Elvino Dias e Paulo Guambe”, acrescentou o porta-voz.

Venâncio Mondlane reivindica vitória nas eleições e apelou à realização de marchas pacíficas após o duplo assassínio dos seus apoiantes. A polícia moçambicana está a dispersar com gás lacrimogéneo desde hoje de manhã os manifestantes que pretendem repudiar o assassínio de sexta-feira.

A polícia moçambicana confirmou no sábado, à Lusa, que a viatura em que seguiam Elvino Dias, advogado de Venâncio Mondlane, e Paulo Guambe, mandatário do Podemos, partido que apoia o candidato, mortos a tiro, foi “emboscada”.

As eleições gerais de 9 de outubro incluíram as sétimas presidenciais em simultâneo com legislativas e para assembleias e governadores provinciais.

A Comissão Nacional de Eleições (CNE) tem 15 dias para anunciar os resultados oficiais, data que se cumpre em 24 de outubro, cabendo depois ao Conselho Constitucional a proclamação dos resultados, após concluir a análise, também, de eventuais recursos, mas sem prazo definido para esse efeito.

Mondlane diz que verdadeiros terroristas são as forças de segurança

O candidato presidencial Venâncio Mondlane considerou, entretanto, que os verdadeiros terroristas em Moçambique são as lideranças das forças de segurança, em reação à carga policial que dispersou as marchas que tinha convocado para hoje.

“Se o cidadão não consegue exercer os seus direitos, então isto é pior do que um estado de guerra. Estes aqui é que são os verdadeiros terroristas. Em Cabo Delgado temos insurgentes, mas aqui em Maputo, nas forças de defesa e segurança, é onde nós temos os verdadeiros terroristas”, disse Mondlane, em declarações aos jornalistas pouco antes de ele próprio ser alvo do gás lacrimogéneo lançado pela polícia.

A capital moçambicana está a ser palco de confrontos entre manifestantes, que atiram pedras e incendeiam pneus nas ruas perto da Avenida Joaquim Chissano, e a polícia, que está a dispersar os populares com recurso a gás lacrimogéneo e tiros para o ar.

Na sequência da resposta da polícia, pelo menos três jornalistas ficaram feridos. Mondlane considerou que os manifestantes estão a cumprir o seu papel, mas a polícia não.

“O problema deste país não está com o povo, o verdadeiro vandalismo está com as forças de segurança, com as lideranças das forças de segurança que não têm nenhuma perceção cívica, política, não sabem o que são direitos fundamentais, não sabem o que são os direitos constitucionais”, acusou, defendendo que “a manifestação é um direito cívico, não é vandalismo”.

“Estamos todos de parabéns, o povo moçambicano está de parabéns, é um sinal que mostra a capacidade de a gente se mobilizar para lutar pelos nossos direitos e eu creio que quando anunciarmos a segunda etapa vai ser muito mais interessante do ponto de vista cívico e politico do que foi agora”, acrescentou o candidato.

Mondlane referiu que a manifestação de hoje foi a etapa “mais branda”, prometendo mais três fases de protestos até à proclamação dos resultados das eleições gerais de 09 de outubro pelo Conselho Constitucional.

S&P desce rating de Moçambique para emissões em moeda local

A agência de notação financeira Standard & Poor’s (S&P) desceu o rating das emissões de dívida em moeda nacional de Moçambique num nível, para CCC, temendo que falhe pagamentos, e manteve a classificação das emissões externas em CCC+.

“Acreditamos que existe uma elevada probabilidade de Moçambique falhar os pagamentos da dívida interna em moeda local, inclusivamente por razões administrativas, ou implementar uma troca de dívida ‘problemática’ no que diz respeito à dívida soberana interna, e por isso baixámos o ‘rating’ das emissões em moeda local, de CCC+ para CCC”, lê-se na nota divulgada pelos analistas.

Na explicação da manutenção da avaliação de risco (rating) da dívida soberana externa em CCC+, a S&P escreve que não tem havido atrasos e que “os pagamentos de dívida em moeda externa continuam comparativamente modestos até os Eurobonds atingirem a maturidade, em 2028”.

Para a S&P, “os desafios de gestão de liquidez continuam consideráveis, com alguns atrasos aparentes no pagamento aos credores internos, acumulação de dívidas a fornecedores e empreiteiros, para além de uma derrapagem orçamental”, num contexto macroeconómico em que os ajustamentos nos salários dos funcionários públicos, os choques relacionados com o clima, o pagamento de juros e a época pré-eleitoral causaram “pressões sobre a despesa pública”.

Mantendo a perspetiva de evolução do rating em estável, a S&P nota que apesar do crescimento de 4,3% previsto para este ano ser “relativamente robusto”, esta expansão está assente nas obras de construção necessárias para a exploração do gás natural no norte do país, e não num enriquecimento da população.

Estima por isso que o crescimento real do Produto Interno Bruto (PIB) seja de apenas 2%. “A manufatura, a construção e a atividade do setor da importação estão também limitadas pelas dificuldades de acesso a moeda externa através dos bancos”, lê-se na nota divulgada pela S&P, que lembra que “no ano passado o governo cortou a distribuição de moeda externa para importação de produtos petrolíferos, deixando o mercado local com menos acesso a divisas externas”.

Moçambique, conclui a S&P na nota divulgada na sexta-feira à noite, “vai continuar a enfrentar desafios persistentes de políticas a médio prazo”, entre os quais os “elevados níveis de pobreza e o subdesenvolvimento no território fora de Maputo, o que levou a fracas condições socioeconómicas e aumenta a pressões sobre as finanças públicas”.

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