2025 traz mercado de trabalho estável, mas com “entorses” persistentes
O mercado de trabalho português tem dado provas de resiliência e o próximo ano deverá ser sinónimo de estabilidade. O desemprego jovem gera, contudo, preocupações.
Ainda que nem tudo vá bem no mercado de trabalho português, os sinais dos últimos anos têm sido de resiliência. Com o desemprego consistentemente próximo de mínimos históricos e a população empregada em níveis recorde, o desempenho global do mundo do trabalho nacional tem sido positivo. E, apesar dos desafios à espreita, o próximo ano deverá ser sinónimo de estabilidade, projetam os especialistas. Há, contudo, “entorses” – a palavra é da própria ministra da tutela – que importa cuidar, como os altos níveis de desemprego jovem.
Comecemos pelo retrato global. Depois de em 2023 o desemprego ter ficado em 6,5% e, portanto, abaixo das expectativas do Governo (então, liderado por António Costa), este ano está em rota para um recuo: a média dos primeiros três trimestres do ano aponta para uma taxa de 6,3%.
Desemprego trimestral está estável
Fonte: INE
Tanto a Comissão Europeia, como o Banco de Portugal e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) estão a contar com um decréscimo anual desse indicador, prevendo uma taxa de 6,4% (ou seja, 0,1 pontos percentuais abaixo de 2023).
E para 2025 as previsões apontam para novas reduções do desemprego: o executivo comunitário e a OCDE concordam com uma nova redução de 0,1 pontos percentuais, para 6,3%.
O próprio Governo de Luís Montenegro projeta uma redução dessa dimensão do desemprego no próximo ano (estima um decréscimo de 0,1 pontos percentuais para 6,5%), usando a expressão “relativa estabilização” para descrever o mercado de trabalho, no relatório do Orçamento do Estado para 2025 que entregou no Parlamento.
Governo até é dos menos otimistas quanto a 2025
Fonte: CFP
Mesmo entre as confederações empresariais, é esse o sentimento que impera. “A estabilidade do desemprego deverá continuar“, diz ao ECO o diretor-geral da Confederação Empresarial de Portugal, Rafael Alves Costa. “Globalmente, não haverá grandes alterações”, corrobora João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal.
“Estima-se que a taxa de desemprego se manterá, com tendência para uma ligeira descida“, atira, por sua vez o presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), Álvaro Mendonça e Moura.
Já Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do Fórum para a competitividade, faz uma ressalva importante: sim, a estabilidade do desemprego deverá prosseguir, mas para tal é preciso que as “potenciais perturbações não se concretizem” e que a economia cresça acima dos 2%.
Se as potenciais perturbações não se concretizarem e a economia crescer acima dos 2%, como é consensual, a estabilidade do desemprego deverá prosseguir.
A eleição de Donald Trump para presidente dos Estados Unidos, por exemplo, veio agravar a incerteza, observa o especialista. “Haverá uma escalada protecionista mundial, de que a União Europeia será simultaneamente vítima e ator?”, questiona Pedro Braz Teixeira.
Diferente alerta vem da professora catedrática Helena Lopes, do ISCTE: “É provável que haja uma ligeira subida do desemprego anunciada pela diminuição das ofertas de trabalho registada nos centros do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP)”.
Os dados mais recentes (que são referentes a novembro) revelam uma descida homóloga de 2,1% das ofertas de emprego em ficheiro. Em causa estão menos 280 oportunidades de trabalho do que há um ano.
O “entorse” do desemprego jovem
Portugal está próximo do pleno emprego, considerando o conjunto do mercado. Mas os dados relativos aos jovens geram preocupação: a taxa de desemprego jovem em Portugal foi de 19,7% no terceiro trimestre, mais do triplo da taxa registada para o conjunto do mercado de trabalho.
Depois de no verão ter dito que o desemprego jovem atingiu “níveis inadmissíveis“, a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, usou mesmo a palavra “entorse” para descrever esse cenário, e sinalizou que esta será uma das prioridades do seu trabalho.
Por isso, logo em agosto o Governo reformulou os programas de estágio apoiados pelo IEFP. E no próximo ano já firmou o compromisso de lançar uma nova estratégia nacional para combater o desemprego jovem e reduzir o número de jovens que nem trabalham, nem estudam.
Portugal sai mal na fotografia europeia do desemprego jovem
Fonte: Eurostat
O objetivo, lê-se no Orçamento do Estado, é atrair e reter o talento jovem em Portugal, “em particular dos que possuem qualificações profissionais de nível superior“, bem como incrementar “a participação na procura ativa de emprego ou em atividades de educação e formação por parte dos jovens que pertençam a grupos que estão mais afastados do mercado de trabalho”.
O desemprego jovem atingiu taxas que não são admissíveis.
O sentimento entre especialistas e parceiros sociais é, porém, de ceticismo quanto à resolução deste problema, nos próximos tempos.
“Esta não é uma situação que se resolva de um momento para o outro“, sublinha João Vieira Lopes, que apela a “políticas orientadas para um adequado planeamento e antecipação das necessidades de competências“.
“Precisamos de reforçar o nosso ensino profissional, e possivelmente teremos que refletir sobre a racionalidade de ofertas ao nível do ensino superior que não têm procura no mercado de trabalho”, afirma o presidente da CCP.
Da parte da Confederação do Turismo, Francisco Calheiros até deixa elogios às mudanças que o Governo tem feito e anunciado, mas realça que “até à data” não se vislumbra “nada de muito assinalável”, em termos de medidas que possam pôr um ponto final robusto neste problema.
“Muito preocupado”, Álvaro Mendonça e Moura, da CAP, sugere políticas públicas de estímulo à contratação de jovens, como programas de reconversão de licenciados com licenciaturas sem empregabilidade, bolsas e empréstimos para mestrados com garantia de empregabilidade.
Precisamos de desenvolver os setores da economia que tenham capacidade empresarial elevada, empresários qualificados, processos organizacionais e produtivos criadores de valor, que puxem a média da produtividade para cima.
Propostas à parte, o diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade deixa claro: o desemprego jovem parece ser um fenómeno “de caráter mais estrutural, relacionado com uma evolução mais rápida da formação do que da qualidade do emprego”.
“Se continuarmos a privilegiar setores de baixa qualificação, como o turismo, não são de esperar grandes melhorias“, atira Pedro Braz Teixeira.
Em linha, em declaração ao ECO no verão, o professor universitário José Reis dizia, a propósito da “receita” contra o desemprego jovem, que é preciso “desenvolver os setores da economia que tenham capacidade empresarial elevada, empresários qualificados, processos organizacionais e produtivos criadores de valor, que puxem a média da produtividade para cima“.
Despedimentos coletivos a aumentar
Um outro ponto que tem merecido atenção no mercado de trabalho português são os despedimentos coletivos. Até ao fim de outubro, foram entregues 409 processos deste tipo, mais 21% do que no mesmo período do último ano.
A ministra do Trabalho já disse que está atento a esta evolução, sublinhando que os despedimentos coletivos “são sempre preocupantes”. Maria do Rosário Palma Ramalho não deu, no entanto, sinais de maior alerta e Pedro Braz Teixeira acompanha-a na atitude, uma vez que, apesar destes processos, o desemprego continua baixo.
“Em princípio, estão-se a destruir empregos sem grande futuro e estão-se a criar novos empregos em número equivalente. O desemprego de longa duração baixou de 130,2 milhares no segundo trimestre para 127,2 milhares no terceiro trimestre, o que sugere que os trabalhadores despedidos estão a encontrar novas colocações“, destaca o diretor do gabinete de estudos do Fórum para a competitividade.
Os economistas ouvidos pelo ECO ao longo de 2024 argumentaram que o aumento dos despedimentos coletivos está ligado ao abrandamento das economias e ao impacto das exportações e no consumo. O desempenho no próximo ano deverá, portanto, continuar ligado à evolução de economias como a alemã, que influenciam as vendas portuguesas e os resultados dos empregadores nacionais.
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