BRANDS' ECO Pobreza habitacional reflete-se em menos saúde, produtividade e dignidade

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  • 30 Outubro 2025

Cerca de 6% da população é afetada pelo fenómeno que se traduz em casas com falta de condições de habitabilidade e conforto térmico. O Just a Change juntou peritos em Lisboa para debater soluções.

A construção de uma casa não se inicia pelo telhado, mas, por vezes, é preciso inverter a lógica de intervenção para conseguir resolver desafios importantes em matéria de habitação. Esse tem sido um dos eixos de atuação do Just a Change, a associação sem fins lucrativos que tem um propósito bem definido: “reabilitamos casas e reconstruímos vidas”, resumiu Eduardo Lopes, diretor de operações da instituição na região Norte.

Eduardo Lopes, diretor de operações do Just a Change na região Norte
Eduardo Lopes, diretor de operações na região Norte do Just a Change

A propósito da conferência “Sob o mesmo teto 2025”, que tomou conta da Fundação do Oriente, em Lisboa, o Just a Change juntou organizações não-governamentais, parceiros e outras instituições de solidariedade social para, mais do que fazer diagnósticos, apresentar soluções para combater a pobreza habitacional.

“Este ano vamos reabilitar mais de 130 casas”, partilhou Eduardo Lopes, lembrando o papel de milhares de voluntários que se juntam, todos os anos, para cumprir esta missão. Em 2024, a associação conseguiu concluir obras de reabilitação em 115 casas espalhadas por 27 municípios, além de ter intervencionado 68 instituições de solidariedade. Os resultados são claros: mais de 6.600 beneficiários diretos que viram as suas vidas melhoradas.

Ricardo Mexia, médico e presidente da Junta de Freguesia do Lumiar, em Lisboa

“A relação entre habitação e saúde é muito próxima”, reconheceu Ricardo Mexia, médico e presidente da Junta de Freguesia do Lumiar, em Lisboa, para quem não há dúvidas de que “as casas no sul da Europa são mais mal construídas do que no Norte, são mais frias e isso tem impacto na saúde”. Os estudos demonstram isso mesmo – no final do ano passado, um inquérito sobre “Conforto térmico e saúde humana no concelho de Lisboa” revelava que mais de metade dos participantes relataram sentir desconforto térmico nas suas habitações durante o verão (56,5%) e quase dois terços no inverno (63,2%).

Segundo contas do Just a Change, que estima que 625 mil pessoas vivam em situação de pobreza habitacional, só em Lisboa este problema verifica-se em 30 mil casas. “É um problema porque tem impacto direto naquilo que são, por exemplo, as doenças respiratórias”, apontou a líder da Direção Geral da Saúde (DGS). Rita Sá Machado lembrou que o Plano Nacional de Saúde 2030 já reconhece esta como uma situação preocupante, mas admite que é preciso fazer mais. “E aqui, sem dúvida alguma, estratégias municipais de saúde, planos específicos de outras áreas que contenham também a esfera da saúde, é a pedra de toque”.

“O problema da habitação tem de ser resolvido pensando em todas as suas dimensões”, afirmou a ex-ministra da saúde Maria de Belém Roseira, que garantiu: “é do interesse público termos políticas públicas de habitação que sejam efetivas”.

Muito mais do que apenas um teto

Uma casa degradada é, mais do que um problema de paredes ou telhados, um fator que mina a saúde física, a estabilidade emocional e até a produtividade. “Muitas vezes estamos a trabalhar com pessoas que estão no extremo da pobreza habitacional, que vivem situações de violência física e psicológica, e que estão em constante vigilância. É impossível ter saúde mental a partir da rua”, alertou Cristiana Merendeiro, coordenadora do programa Housing First da Associação Crescer, com muito trabalho realizado junto da população em situação de sem-abrigo.

Maria João Sousa, Fundadora da Associação SOUMA, Eduardo Lopes, Diretor de operações na região Norte do Just a Change, e Cristiana Merendeiro, Coordenadora do Programa Housing First da Associação Crescer

O impacto é profundo. “Trabalhamos com pessoas que têm um tempo médio na rua de 15 anos. A habitação aqui não é um prémio, é um direito humano”, acrescentou, sublinhando que o acesso a uma casa é o ponto de partida para recuperar a autonomia e a dignidade.

Também Maria João Sousa, da Associação SOUMA, sublinhou que a pobreza habitacional está muitas vezes associada à solidão e à ausência de rede de apoio. “Há muitas pessoas muito sozinhas na cidade de Lisboa, e não são necessariamente idosas. É muito fácil chegar a este ponto”, referiu. A SOUMA trabalha com mais de 300 voluntários e 200 parceiros, e o seu modelo assenta na autonomia: “Não somos uma resposta assistencialista. Tudo o que fazemos visa capacitar as pessoas para recuperarem o controlo das suas vidas”.

O impacto das condições de habitação faz-se sentir até na economia, garantem os especialistas. Casas degradadas representam mais despesas em saúde e menos produtividade. “Uma boa parte dos nossos beneficiários diz que houve um impacto direto na sua saúde em resultado da nossa intervenção”, destacou Eduardo Lopes, do Just a Change. Segundo a associação, 59% das famílias acompanhadas em 2024 relataram melhorias significativas na saúde após as obras de reabilitação, e 74% disseram que a sua vida melhorou muito.

Fazer muito com pouco

A articulação entre entidades públicas e organizações sociais tem sido essencial para multiplicar o impacto. “O Lumiar é fértil em associações e organizações que nos fazem chegar informação. Essas parcerias são importantes. Ao criarmos este ecossistema de entidades que trazem diferentes competências, temos mais eficácia”, assegurou Ricardo Mexia.

Entre os projetos em curso, o autarca destacou a comunidade de energia renovável do Lumiar, que junta moradores e instituições locais, mas também as obras para melhoria de conforto térmico na habitação social. “Colocámos painéis fotovoltaicos nos telhados da junta e a adesão é voluntária. As pessoas podem comprar a sua quota e amortizar o investimento, mas temos também uma vertente social que permite que outros beneficiem”, explicou.

Ana Carolina Gomes, diretora de estratégias e operações da Habitat for Humanity, e Pedro Mexia, médico e presidente da Junta de Freguesia do Lumiar, em Lisboa

Outro exemplo vem da Habitat for Humanity, cuja diretora de estratégias e operações, Ana Carolina Gomes, defendeu que as soluções não passam apenas por construir mais. “Já existem espaços suficientes na Europa. Defendemos a conversão de espaços vazios em habitação social e acessível”, afirmou. A organização, com quase 50 anos de experiência e presença em vários países europeus, atua também na área da eficiência energética e no combate à pobreza energética.

“Uma ONG, por maior que seja, tem sempre uma capacidade de impacto muito menor do que os Estados”, reconheceu Ana Carolina. “Por isso, o nosso trabalho é também influenciar políticas públicas e produzir conhecimento que ajude os governos a agir melhor”.

Desafios a superar

Apesar do esforço crescente, os obstáculos são muitos e têm de ser superados diariamente. “O nosso maior desafio é o número de voluntários. Crescemos em casas reabilitadas, mas o número de voluntários não acompanha”, admitiu Eduardo Lopes, do Just a Change. A associação procura também mais financiamento e sinalizações de casos urgentes: “Muitas vezes temos os voluntários e os fundos, mas não temos casas identificadas onde intervir”. Esta sinalização pode, aliás, ser feita por qualquer pessoa através do site oficial da associação Just a Change.

Para Maria João Sousa, o financiamento continua a ser uma corrida constante. “Temos de correr atrás dos financiamentos continuamente”, disse, acrescentando que a SOUMA criou um projeto inovador de reabilitação e arrendamento acessível em parceria com senhorios na zona de Lisboa. “Já fizemos 16 intervenções e alojámos 32 pessoas, sempre com um teto máximo de 400 euros”, assinalou. O objetivo é continuar este trabalho e aumentar o número de casas arrendadas por preços acessíveis e prazos prolongados no tempo.

Maria João Sousa, Fundadora da Associação SOUMA

Já Cristiana Merendeiro apontou o desequilíbrio entre medidas paliativas e respostas estruturais. “Continuamos a ver um grande gasto público em projetos que não resolvem o problema. Falta visão de longo prazo”, lamentou, pedindo que o dinheiro público seja aplicado em projetos com impacto real na vida das pessoas.

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