Como os eventos de tecnologia se transformaram numa feira de recrutamento

O Collision, evento irmão do Web Summit em Toronto, é uma amostra do que já se vê em Lisboa: as conferências de tecnologia deixaram há muito de ser - apenas - isso.

Umas vezes mais escondidas e só ao alcance dos mais atentos; outras à vista de todos os que, alinhados ou não com a tentativa, se aproximam dos stands para ver melhor.

As feiras de tecnologia como o Web Summit ou o Collision, que decorreu pela primeira vez esta semana em Toronto, no Canadá, deixaram há muito de ser apenas eventos de inspiração e partilha de conhecimento: com a guerra por talento cada vez mais renhida, as empresas carregam as “armas de atração” na bagagem e trazem-nas para as conferências internacionais para não desperdiçarem um palco que tem tudo em escala: milhares de pessoas, talento jovem à procura de uma boa oportunidade e, claro, dias inteirinhos de exposição.

“Tal e qual. Vejo-o assim e, também, não só no recrutamento como de novos projetos”, assinala Isabella Antonaccio, especialista do setor de tecnologias da informação e a trabalhar na agência de promoção de investimento e exportações do Uruguai. Pelo seu stand passaram centenas de pessoas entre os cerca de 25 mil participantes confirmados pela organização. Entre essas, várias empresas em pleno “processo de contratação”.

“É sempre bom aproveitar estes eventos para conseguir novas oportunidades em diferentes mercados. Em termos de recrutamento, percebes isso porque a organização também faz um esforço grande para trazer público jovem, estudantes, tens as universidades muito envolvidas. Há também muita gente de organizações e consultoras de Canadá que te oferecem o serviço de ajudar-te a tratar do visto, toda a papelada, se conseguires algum trabalho. Estas consultoras não expõem mas vêm ao evento, dão-te o cartão, etc..”, descreve a especialista.

Em termos de recrutamento, percebes isso porque a organização também faz um esforço grande para trazer público jovem, estudantes, tens as universidades muito envolvidas.

Isabella Antonaccio

Agência de promoção de investimento e exportações do Uruguai

Para Murray Newlands, empreendedor e speaker, a procura de talento em lugares como estes é óbvia, sobretudo pelas características da maioria de assistência nestas conferências. “Se olharmos para o ecossistema de startups, todas elas precisam de duas coisas essenciais: dinheiro e talento para crescerem. E muitas das pessoas que vêm a este tipo de eventos, fazem-no porque sabem que determinadas empresas ou pessoas cá vão estar. Obviamente há uma base importante de networking. Este evento traz pessoas um pouco de todo o mundo, e temos aqui a oportunidade de conhecer empreendedores apaixonados pelo que estão a fazer que, ainda que talvez consigam (ou não) levantar dinheiro, precisarão de expandir equipas, de pessoas. Aqui há talento de todo o mundo e pode-se falar com ele pessoalmente”, assinala o empreendedor.

A própria empresa de Newlands é caso disso: durante os três dias de exposição do evento, o especialista recebeu visitas de cerca de 50 engenheiros de software interessados em trabalhar para a Turing, um marketplace criado especificamente para aqueles profissionais.

Empresas andam à procura de talento e de oportunidades e novos projetos noutros países.Sam Barnes/Collision via Sportsfile

 

“Na Touring trabalham connosco engenheiros de software de todo o mundo em empresas norte-americanas. Muitos dos participantes que vêm até nós são este tipo de pessoas e estão à procura de trabalho”, explica, acrescentando ter feito contacto com pelo menos 50 engenheiros interessados em trabalhar durante os três dias de conferências. “Se procuras um trabalho numa startup, a Collision ou o Web Summit são ótimos lugares para ir e encontrar um trabalho“, detalha o empreendedor que criou um marketplace para engenheiros de software que marca presença no Collision.

Isabella Antonaccio concorda: além de empresas à procura de talento, à talento à procura de oportunidades nestas conferências, garante. “Uns que claramente são estudantes e estão à procura de novas oportunidades, muita gente que vem com a sua startup ou que quer empreender e anda a observar o que há, que aceleradoras, à procura de validação”, diz.

Organização tem feito parcerias com universidades para atrair e facilitar a participação de estudantes nas conferências.Cody Glenn/Collision via Sportsfile

 

Joanna Leobach, na equipa que gere o programa de aceleração para startups com base no Canadá do Lazaridis Institute, refere que ainda que o foco da sua vinda ao Collision não seja “recrutamento”, a instituição que representa veio conhecer e dar-se a conhecer aos outros.

“O que estamos a tentar fazer é focar-nos é em criar condições para que o talento não saia do Canadá. Este tipo de eventos está focado naquilo que é o networking e é aí que tudo começa, certo?”, questiona.

“Muitas das pessoas que te falam em networking, é para recrutamento. O Web Summit e o Collision têm no pacote para parceiros, a questão do recrutamento”, revela Pedro Oliveira, cofundador da landing.jobs. “Quando começámos e lançámos o landing.fest no mercado, foi uma festa, mas depois passou a ser job fair. Só que isso não fazia sentido porque já tínhamos a plataforma online, para quê a feira? Evoluímos, e agora o festival assenta em áreas como o desenvolvimento de carreira, training e tech. Claro que tem a componente de recruitment, mascarada de networking. Em qualquer conferência, para que é que as empresas estão lá? Marca, vendas e recrutamento, não que vão resolver os problemas de pipeline aqui mas que estejam abertos, ver como está o mercado, etc.”, assinala Pedro.

Mas é fácil recrutar numa conferência onde andam, de um lado para o outro, 25.000 pessoas? “É difícil saber onde colocar a nossa energia porque no networking nunca se sabe que relação vai ser a que teremos com a pessoa que estamos a conhecer. No entanto, aqui podemos fazê-lo rapidamente, através de conversas curtas em que conseguimos perceber se é daquela pessoas que precisamos de momento ou dentro de dois anos. Gosto realmente da forma como esta lógica está construída, porque podemos contactar diretamente com as pessoas na app, não precisamos de andar a carregar cartões-de-visita para o nosso escritório e nem nos lembrarmos do porquê de estarmos a carregar determinado contacto”, desmistifica Joanna Leobach.

Atrair e reter talento é um dos grandes desafios do mercado global.Eóin Noonan/Collision via Sportsfile

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