Steve Clayton, chief storyteller da Microsoft: “As melhores histórias têm de ser sobre pessoas”

Criam narrativas dentro e fora da Microsoft. Em entrevista à Pessoas, o "contador de histórias" da empresa fala sobre o impacto de uma boa narrativa para atrair, reter e criar memórias nas pessoas.

Como contar boas histórias? Qual o impacto dentro e fora de uma organização e qual deve ser o seu propósito? Steve Clayton, chiefstoryteller da Microsoft, foi um dos oradores convidados do primeiro dia do evento Building the Future, no Pavilhão Carlos Lopes, em Lisboa. Na apresentação “Bridging the physical and digital world“, o especialista refletiu e falou sobre a forma como a tecnologia já está incorporada no mundo.

Em conversa com a revista Pessoas, explicou qual a importância de contar histórias num mundo cada vez mais digital e, em particular, numa empresa tecnológica como a Microsoft e que soma mais de 40 anos de existência.

Qual a importância de contar histórias? E, em particular, numa empresa como a Microsoft?

Há sete anos, não havia pessoas a utilizar o termo “storyteller” como designação do seu cargo profissional. Hoje, são mais de 400 mil. Algures nos últimos cinco a sete anos, temos visto emergir a profissão de storyteller [contador de histórias, em inglês], e deve-se ao facto de nos deparamos com um mundo onde a atenção está sob ataque. Desde que aqui chegámos, esta manhã, estamos a ser bombardeados com informação. Cartazes, websites, televisão, e-mail, blogs. Perante esse cenário, dizemos: “como saímos da confusão? E como voltamos a contar histórias que realmente ficam com as pessoas?”. Porque muita da informação que recebemos durante o dia, não permanece connosco. Enquanto espécie, crescemos a contar histórias. Contamos histórias aos nossos filhos antes de dormirem, por alguma razão. O homem das cavernas contava histórias na caverna. Temos esta predisposição genética para contar histórias, é por isso que está a tornar-se importante.

É uma forma de agregar a informação importante e passá-la às pessoas?

Capta a imaginação das pessoas. No fim de semana, vais sair com amigos, ou com a família, e provavelmente contas histórias sobre algum evento ao qual tenhas ido, ou alguma viagem que tenhas feito, ou sobre umas férias. Nós contamos histórias, e essas histórias são recebidas e serão recontadas a outras pessoas. Por isso, as pessoas memorizam mais facilmente histórias do que factos. É mais fácil conseguir contar uma história, porque as melhores histórias ficam connosco e captam a nossa imaginação e as nossas memórias.

E como se faz essa seleção? Que histórias devem ser contadas?

É difícil e simples. A resposta simples é: todas as melhoras histórias — penso que quase todas as histórias – têm de ser sobre pessoas. Há sete anos, quando comecei neste percurso de storytelling, a primeira história que criámos era muito focada num único indivíduo e no seu percurso, nas tensões e nos conflitos dessa jornada, e tinha as melhores características de uma boa história. A minha história preferida é o StarWars e a história tinha todas essas características: um herói que começa uma viagem que se depara com alguns conflitos e tensão e que, no final, atinge o sucesso. Não era tão épica como o Star Wars, mas era uma boa história corporativa, teve muito sucesso e foi muito partilhada.

Mas depois disso, algumas pessoas dentro da Microsoft vieram ter connosco e disseram: “gostávamos que usassem as mesmas técnicas para contar toda a história sobre este produto”. E as perguntas que fizemos foram: “quem é o herói por detrás do produto e qual é o seu percurso?”. Todas as boas histórias envolvem pessoas que fazem coisas que captam a imaginação de outras pessoas.

"As pessoas memorizam mais facilmente histórias do que factos. É mais fácil conseguir contar uma história, porque as melhores histórias ficam connosco e captam a nossa imaginação e as nossas memórias.”

De que forma as histórias podem criar envolvimento das pessoas dentro da Microsoft, e fora da empresa?

Passamos muito tempo a contar histórias, dentro e fora da empresa, por isso posso dar-lhe o exemplo de que, parte do trabalho que a minha empresa faz é criar um site de recrutamento para a Microsoft. Há 14 anos, esse website chamava-se Microsoft Jobs Blog. Há cerca de três anos, alterámo-lo completamente para ser tornar num conjunto de perfis das pessoas na empresa, porque estamos numa missão de tentar continuar a contratar e recrutar uma força de trabalho diversa para a empresa. E a forma que descobrimos para o fazer foi através da construção de perfis das pessoas dentro da empresa. As mulheres, porque queremos atrair mais mulheres para a indústria, etc..Dedicámos a nossa energia a contar histórias, dentro e fora da empresa, mas sempre com este foco de contar histórias sobre pessoas.

Qual é a importância de contar histórias para a atração de talento? Qual é o efeito que tem nas pessoas que procuram a Microsoft?

Às vezes há uma perceção atípica sobre a Microsoft dentro da indústria da tecnologia, de que tem muitos homens mais velhos e brancos, mas há uma força de trabalho muito diversa e talentosa dentro da Microsoft. Por isso, o efeito tem sido a possibilidade de conseguir falar com públicos que adoraríamos ter a trabalhar na Microsoft, e conseguir dizer-lhes: “há pessoas exatamente como tu nesta empresa, e com os mesmos backgrounds. As melhores narrativas ajudam a quebrar e a mudar a perceção das pessoas e isso é o que estamos a tentar fazer com esta narrativa no recrutamento.

Durante algum tempo, a missão não era muito clara. Agora está a tornar-se muito evidente que o nosso papel é capacitar as pessoas a alcançarem algo através da tecnologia. Não é tanto sobre nós, é sobre o que as pessoas podem fazer com a tecnologia que nós criamos.

E no processo de recrutamento, como conseguem condensar uma história de 45 anos, em poucos minutos?

Tem-se tornado mais fácil nos últimos cinco anos. Há cinco anos, renovámos as afirmações que estavam na base da missão da empresa, para empoderar todas as pessoas no Planeta a conseguirem chegar mais longe. Quando a empresa começou, a mensagem da sua missão era um computador em cada secretária, dentro da cada casa, e conseguimos alcançá-la em dez anos. E durante algum tempo, a missão não era muito clara. Agora está a tornar-se muito evidente que o nosso papel é capacitar as pessoas a alcançarem algo através da tecnologia. Não é tanto sobre nós, é sobre o que as pessoas podem fazer com a tecnologia que nós criamos.

"Quando penso em contratar pessoas para a minha equipa, procuro ótimos escritores, que entendam a narrativa e o ofício de escrever e contar histórias, e curiosas sobre o mundo. Podes ensinar os computadores a escrever, mas é a combinação destas duas coisas que cria boas histórias.”

Penso que se está a tornar mais fácil, em muitas formas, de contar o percurso da Microsoft através de histórias. Tem havido uma grande mudança nos últimos seis anos para que hoje possamos dizer que somos uma empresa com uma missão clara e com um propósito.

Como tem evoluído a forma como contam histórias?

Sem dúvida, temos vindo a adaptar a forma de contar histórias nos últimos cinco anos. Há cinco anos, contávamos muito mais histórias sobre nós e sobre os nossos produtos e, agora, se olhar para a narrativa da minha equipa — e até para eventos como este –, é muito mais sobre o impacto que a nossa tecnologia está a ter noutras pessoas.

Enquanto espécie, crescemos a contar histórias. Contamos histórias aos nossos filhos antes de dormirem, por alguma razão. Temos esta predisposição genética para contar histórias, é por isso que se está a tornar importante.

À medida que a tecnologia avança, procuram-se mais características humanas?

Hoje em dia, há cada vez mais o elemento humano na tecnologia. Tivemos este percurso com a tecnologia, onde tivemos de aprender e compreendê-la, seja um teclado ou um rato, e agora — em particular devido à inteligência artificial — a tecnologia está a começar a compreender-nos. Consegue reconhecer os nossos gestos, pode entrar nos nossos computadores através das nossas caras, pode reconhecer a nossa forma de escrever, pode traduzir o nosso discurso. Sobretudo devido a três fatores: a cloud, a quantidade de informação e os avanços da inteligência artificial dos últimos três anos. Estamos no ponto em que a tecnologia consegue ver, ouvir e compreender de uma forma que nunca tinha sido possível.

A forma como, enquanto humanos, conseguimos construir uma narrativa, pode dar-nos alguma vantagem?

Espero que continue a haver trabalho para pessoas como tu e como eu, que gostam de contar histórias. Quando penso em contratar pessoas para a minha equipa, procuro ótimos escritores que entendam a narrativa e o ofício de escrever e contar histórias, e curiosas sobre o mundo. Podes ensinar os computadores a escrever, mas é a combinação destas duas coisas que cria boas histórias.

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