100% remotos? “Trabalho remoto não é home office”

100% remota, a WEBrand Agency tem mostrado que é possível trabalhar à distância, poupar no tempo, apostar na inclusão, e até reduzir a pegada ecológica.

630 quilómetros por mês em viagens, 21 horas por mês no trânsito, 57 euros por mês em combustível, e uma pegada ecológica equivalente a plantar quatro árvores, por ano, para compensar as emissões de carbono. Estes são os números que Henrique Paranhos, fundador da WEBrand Agency, garante ter conseguido reduzir a zero com o trabalho totalmente remoto, além dos custos fixos da empresa que deixaram de existir.

Ninguém melhor que cada um de nós sabe como é que somos produtivos e quando é que queremos trabalhar, como é que queremos trabalhar”, defende o fundador, que fora da agência trabalha para o seu segundo negócio, de pet sitting.

Na empresa, apesar da distância entre os sete trabalhadores da empresa, é mais o que une os une do que aquilo que os separa. Fundada em 2018, a empresa de marketing digital WEBrand Agency é composta por sete contratados a full time, que trabalham a partir de Lisboa, Coimbra, Aveiro, Sintra, Viseu e até da Colômbia. Sem escritório fixo, a empresa tem mostrado que é possível fazer uso da tecnologia para poupar tempo, ser eficiente no trabalho remoto, ser mais inclusiva e, ainda, ajudar o ambiente.

Porque é que tenho de fazer 20 quilómetros por dia para o trabalho, e 20 de regresso? Aos fins-de-semana ainda tenho de ir a Coimbra, e tudo isto em deslocações, numa dinâmica em que aquilo que faço é ir para um escritório, estar fechado oito horas em que estou com headphones para não ser interrompido pelos colegas, e ligado ao computador”, começa por contar Henrique Paranhos, fundador da WEBrand Agency.

Como é que vou explicar [à medicina no trabalho] que tem de ser articulado de outra forma, porque um trabalhador está em Aveiro, outro está em Coimbra, outro na margem sul, dois estão em Lisboa, e um está na Colômbia?

Henrique Paranhos

fundador da WEBrand Agency

Antes de fundar a empresa, Henrique era responsável pelo marketing digital da Tranquilidade, empresa que acabou por ser a primeira cliente da WEBrand. “Isso não é a política da empresa”, “a chefia não deixa” ou “queres tirar férias, é isso?” faziam parte das respostas que Henrique recebia cada vez que tentava implementar o trabalho remoto nas empresas por onde passou. Com a WEBrand quis “provar que era possível”, e hoje a empresa tem clientes um pouco por todo país, desde companhias de teatro, lojas online, empresas de software, seguradoras, e até imobiliárias. “Ganhamos e perdemos clientes como qualquer outra agência. Em termos de equipa, entram e saem colaboradores como qualquer outra empresa”, refere o fundador. Mas para adotar o modelo do trabalho remoto no mercado de trabalho nacional é preciso “quebrar mentalidades e lógicas de trabalho”, acredita Henrique.

Os grandes desafios em Portugal continuam a ser a fraca digitalização do tecido empresarial português, a falta de regulamentação e de preparação do mercado de trabalho, refere o fundador. Na WEBrand, algo simples como a medicina no trabalho pode tornar-se bastante complexo. “Como é que vou explicar [à medicina do trabalho] que tem de ser articulado de outra forma, porque um trabalhador está em Aveiro, outro está em Coimbra, outro na margem sul, dois estão em Lisboa, e um está na Colômbia?”, exemplifica. “Não há regulamentação nem legislação que preveja este modelo de trabalho, o que é no mínimo curioso, porque tanto se fala em automatização de processos e digitalização das empresas”, relata.

Olhos que não veem, chefe que não sente?

Na WEBrand, os trabalhadores nunca se encontram presencialmente mas há regras a cumprir. “A comunicação tem de ser muito lapidada e fluir de forma muito natural. Precisamos de comunicar muito quando trabalhamos remotamente, até no sentido de gerir as expectativas do colega, quem é que está a trabalhar, a que horas. Tem de ser tudo bem explícito“, conta. Na WEbrand, a comunicação faz-se através de plataformas como o Slack, ou em videoconferências no Skype. “Isto continua a ser um negócio e a minha empresa tem de continuar a ser sustentável, preciso de colaboradores produtivos, mas não me interessa saber onde é que eles estão a produzir”, declara.

Henrique Paranhos, em videoconferência com Camilo Luna (Bogotá, Colômbia), José Neto (Viseu), Daniela Gonçalves (Aveiro), Joana Falcão (Sintra) e Bianca Jonas (Coimbra).Hugo Amaral/ECO

A WEbrand, só o primeiro contacto com potenciais clientes é presencial, e não se repete. “Sempre que estamos a falar de startups, de empresas viradas para a área de tecnologia, o remoto é só uma vantagem”, defende. “A comunicação remota não substitui esta conversa, mas não é um impedimento para que uma empresa funcione. Houve conversas que naturalmente já tivemos de ter presencialmente, mas 99% das vezes tudo se resolve numa chamada em videoconferência. É muito mais rápido, mais prático, e resolve-se no momento”, acrescenta.

Recrutamento remoto (e mais inclusivo)

Na WEbrand não há entrevistas presenciais mas o processo de recrutamento pode demorar três meses. “No nosso caso, o recrutamento tem de ser visto de uma forma muito séria, para ter a certeza que determinado profissional é a pessoa certa para integrar na empresa e para trabalhar remotamente, com os colegas, em diferentes fusos-horários e com toda a nossa dinâmica”, conta Henrique. “A maior parte das pessoas já vem com um background no modelo tradicional e é muito complicado conseguir uma mudança de mindset”, explica.

Trabalho remoto não é home office.

Henrique Paranhos

fundador da WEBrand Agency

Na WEBrand valoriza-se a capacidade de comunicar, a disponibilidade, a fluidez nas respostas e o contacto com os colegas e com a chefia. A forma de trabalhar é diferente, mas as ambições são iguais pois, “apesar de termos uma equipa exclusivamente remota, continuamos a ter colaboradores que têm expectativas de aumentos salariais, e quando geres pessoas continuas a ter este desafio”, sublinha.

No trabalho remoto, pode haver mais distância mas na WEBrand pode significar uma maior integração e a aposta num recrutamento mais diverso e inclusivo. “Consigo contratar um profissional que está em Castelo Branco ou em Viseu, e não é um fator discriminatório não estar em Lisboa, não estar a pagar uma renda de 600 euros no centro de Lisboa, ou o facto de não ter carro“, exemplifica. “Posso contratar profissionais que têm, inclusivamente, limitações de saúde, desde que tenham boa capacidade intelectual, acesso à internet e um computador“, declara Henrique.

Trabalho remoto não é home office. O caminho não há de ser dar a sexta-feira à tarde a um colaborador. A nossa experiência diz-nos que aquele colaborador vai sair prejudicado“, adverte o fundador. Em outubro do ano passado, Henrique Paranhos foi cofundador da Remote Shift, a primeira conferência sobre trabalho remoto em Portugal, que juntou profissionais e empresas nacionais e internacionais para falar sobre o trabalho remoto.

Diria que esta é a próxima grande revolução, que é a revolução da lógica laboral. Gostava que houvesse mais empresas a trabalhar remotamente e empresários como eu a trabalhar remotamente para eu poder trocar ideias. Temos de falar mais sobre isto em Portugal”, remata.

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