Prós e contras do novo aeroporto no Montijo ou em Alcochete
Mesmo com a oposição de alguns concelhos, o Governo ainda não desistiu do Aeroporto do Montijo, mas voltou a colocar Alcochete em cima da mesa. O ECO explica os prós e contras de cada opção.
A Covid-19 veio dar mais tempo ao país para encontrar uma solução para o aumento da capacidade aeroportuária em Lisboa. Há dois anos que tudo se encaminhava para a construção do novo aeroporto internacional no Montijo, reconvertendo uma base aérea da Força Aérea Portuguesa num aeroporto comercial. Contudo, a decisão do regulador da aviação, ANAC, aliado ao tempo “ganho” com a pandemia, de travar essa solução veio reacender a discussão sobre qual o melhor local, regressando a opção de Alcochete. Há apenas 15 quilómetros a separar a base aérea do Montijo do campo de tiro de Alcochete, mas a distância é maior quando se fala nos prós e contras de cada solução para o novo aeroporto de Lisboa.
Esta terça-feira a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) anunciou que não vai fazer a “apreciação prévia de viabilidade para efeitos de construção” do aeroporto no Montijo por não existir parecer favorável de todos os concelhos afetados. A ANAC justifica a decisão com a lei que o Governo quer alterar, a qual determina que o parecer desfavorável de um dos concelhos potencialmente afetados bloqueia a obra. Uma lei que o Executivo quer mudar e que agora o PSD se mostra favorável a ajudar.
Em reação, o Ministério das Infraestruturas e da Habitação revelou que vai “avançar, no quadro da expansão da capacidade aeroportuária da região de Lisboa, para a realização de um processo de Avaliação Ambiental Estratégica”. Essa avaliação incidirá não só sobre o Montijo, mas também sobre a opção de Alcochete, a qual passa a estar novamente em cima da mesa. Ao mesmo tempo, o Governo vai propor a alteração da legislação que permite que uma só autarquia tenha o poder de veto sobre o desenvolvimento destas infraestruturas e que levou ao travão da ANAC.
A solução do Montijo foi a escolhida pelo Governo PSD/CDS, liderado por Pedro Passos Coelho, e foi concretizada pelo primeiro Governo PS de António Costa a 8 de janeiro de 2019 quando a ANA (Aeroporto de Portugal, detida pela Vinci) e o Estado assinaram o acordo de 1,15 mil milhões de investimento até 2028 para expandir o aeroporto Humberto Delgado (Portela) e transformar a base aérea do Montijo num novo aeroporto. O investimento seria feito integralmente pela ANA e existiria um novo modelo de fixação das taxas aeroportuárias, o que poderia refletir-se nos bilhetes. O objetivo é que o Montijo fosse um aeroporto secundário essencialmente para transportadoras low cost, aliviando o aeroporto principal na Portela.
Os prós foram defendidos tanto pelo Governo anterior como pelo atual: seria a opção mais rápida de implementar perante a urgência de encontrar uma solução pré-pandemia, era a hipótese mais barata (cerca de 500 milhões de euros) com um custo dez vezes inferior a construir um aeroporto de raiz (cerca de 5 mil milhões de euros, segundo uma estimativa de 2008 do LNEC) e foi um incentivo para a ANA investir na Portela (garantido que se mantém o aeroporto principal). O Governo diz que o Montijo permitirá duplicar a capacidade atual para 72 movimentos por hora e 50 milhões de passageiros por ano na região de Lisboa, manter o uso militar por parte da Força Aérea e ter bons acessos à capital através de barco ou autocarro pela Ponte Vasco da Gama.
Um estudo da consultora Roland Berger para a Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC) datado de 2017 concluía que o Montijo era a melhor opção disponível, apesar do impacto ambiental. A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) viria a dar o “sim”, mas impondo mitigações de impacte ambiental no valor de 48 milhões de euros que terão de ser implementadas pela ANA. As medidas visam proteger as espécies de aves que fazem ninho e se alimentam naquela área, que totaliza 2.500 hectares, e reduzir o ruído dos aviões e das operações na própria infraestrutura.
Montijo acumula oposição: aves, ruído, segurança e prazo de vida
Os prós têm ganho na avaliação dos Governos, mas os contras fizeram levantar uma onda de contestação por parte das associações ambientalistas uma vez que este novo aeroporto se estenderia pelo estuário do Tejo por onde passam centenas de milhares de aves, correndo o risco de colisão com os aviões. Acresce o problema do ruído — tendo o Governo prometido resolver o assunto ao oferecer isolamento sonoro aos moradores do Montijo –, a reduzida dimensão da pista que permitiria apenas aviões de curta e média dimensão e o próprio prazo de vida do aeroporto que poderia estar esgotado até 2030, segundo algumas previsões. Esta opção obriga também a Força Aérea a deslocar alguma operação para Sintra e Beja, o que tem custos associados que terão de ser “acomodados” entre o Estado e a Vinci (cerca de 100 milhões de euros, segundo o ministro da Defesa, João Cravinho).
Já a opção pelo Campo de Tiro de Alcochete — que é a opção defendida pelo PCP, cujas autarquias do distrito de Setúbal estão a bloquear a construção no Montijo (câmara do PS) — custaria mais dinheiro, um argumento a que o bastonário da Ordem dos Engenheiros, Carlos Mineiro Alves, é “sensível”, mas seria mais seguro, tendo sido essa a conclusão de muitos estudos sobre o tema. Nesta opção, os aviões não iriam sobrevoar “áreas densamente populacionais” — o que acontece no caso do Aeroporto da Portela — e deixaria de existir “o problema do choque contra aves” que se coloca no Montijo. Mineiro Alves argumentou que esta é a solução adotada na maioria dos países: um aeroporto “distante da cidade, com capacidade de expansão e que tem condições para ser construído faseadamente, se necessário”.
A mesma opinião tem o engenheiro e antigo ex-presidente do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), Carlos Matias Ramos, instituição que em 2008 concluiu que Alcochete era a melhor opção (por comparação com a Ota). “Quando se diz que no Montijo é mais barato porque já há uma pista, é falso”, disse Carlos Matias Ramos em 2018, que subscreveu um manifesto a favor da opção Alcochete. Além disso, o engenheiro disse que a opção Montijo pode ser “um atentado à segurança industrial” porque o Parque Empresarial Fisipe é “um autêntico barril de pólvora”. “Se cai aqui um avião ou uma aeronave pode haver uma explosão de dimensões catastróficas”, avisou.
A segurança é também uma preocupação da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) que emitiu um parecer desfavorável a esta obra por causa da “suscetibilidade elevada” a sismos e ‘tsunamis’ e ao risco de acidentes com aves e aeronaves. Onze cientistas universitários identificaram os mesmos problemas, acrescentando o risco de inundação devido à subida do nível médio do mar e o aumento das emissões dos gases de efeito estufa da aviação.
Alcochete é uma opção que o Partido Socialista já tinha admitido no passado e, segundo o primeiro-ministro, seria a escolhida se as condições fossem outras. No início de 2020, Carlos César admitiu essa hipótese, mas disse que era pior: “Significa um calendário muito diferente, custos mais elevados e outros aspetos como, por exemplo, a transferência do atual campo de tiro, onde a força aérea manda bombas, faz esses treinos”.
Outras soluções podem passar por Alverca, Leiria e Beja
Há outras opções que já têm sido sugeridas, mas que têm vindo a ser excluídas. Desde logo, a opção da Ota que foi prevista pelo Governo PS de José Sócrates, mas que não se concretizou. Na altura, um estudo da CIP deu gás à opção por Alcochete, assim como o estudo do LNEC, mas a crise travou o projeto (assim como a terceira travessia sobre o Tejo).
Mais recentemente, tanto Carmona Rodrigues como Pedro Santana Lopes, ambos ex-presidentes da câmara municipal de Lisboa, sugeriram Alverca. “Está na margem com mais de 90% das origens e destinos, tem uma boa acessibilidade ferroviária e o custo para a dotar dessas condições não é superior aquilo que se prevê para o Montijo”, disse Santana Lopes. Segundo a proposta de Carmona Rodrigues, o novo aeroporto em Algarve teria uma capacidade para 75 milhões de passageiros por ano, tornando a Portela num aeroporto secundário.
Restam ainda as duas opções de bases aéreas que já existem, mas que estão significativamente mais longe de Lisboa do que o Montijo e Alcochete. É o caso de Leiria, na base militar de Monte Real (onde aterrou o Papa quando esteve em Fátima), onde se está a ponderar a criação de um aeroporto civil, mas para servir o centro do país, tendo sido afastada a hipótese de Coimbra.
No caso de Beja, o Governo planeia construir uma ligação ferroviária para estabelecer uma viagem de comboio até Lisboa de cerca de 1 hora e 30 minutos. Esta é a uma opção que o PAN quer ver estudada: “É preciso avaliar todos os prós e contras, do ponto de vista ambiental e do interesse do país. Além de Alcochete há mais alternativas como Beja, em que temos vindo a insistir. Há que aproveitar as infraestruturas já existentes”, disse André Silva.
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