Restauração e hotelaria temem interrupção dos apoios por causa da crise política

"Janeiro e fevereiro são meses péssimos" para restaurantes e hotelaria, e com a crise política o receio é que sejam ainda piores. Ana Jacinto pede apoios para não deitar tudo a perder na reta final.

Na hotelaria e restauração soaram os alarmes. Os meses que se avizinham há uma tradicional quebra de atividade no setor e havia esperança de que o Executivo fosse sensível à necessidade de prolongar apoios na reta final de 2021 para que 2022 fosse, de facto, um ano de recuperação. Mas à subida dos preços dos combustíveis e da energia veio juntar-se uma crise política com um possível impacto na confiança dos consumidores. A Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) está preocupada porque receia que “tudo pode servir de desculpa” para travar os apoios de que o setor necessita.

“Esta situação da crise política é de facto preocupante, mas já tínhamos sinalizado as nossas preocupações até antes da crise política, que agora veio agravar tudo“, sublinha ao ECO a secretária-geral da AHRESP. “Porque tudo pode servir de desculpa para que as medidas que estavam no papel não saiam cá para fora e para que não sejam criadas novas medidas que são de facto cruciais para esta reta final”, justifica a responsável, antecipando o impacto que terá a realização de eleições antecipadas a 30 de janeiro.

Os apoios acabaram. A única coisa que temos é a retoma progressiva. Depois, há apoios que não foram disponibilizados e não foram pagos. Antes mesmo desta crise política, já estávamos a finalizar junto do Governo a necessidade de continuar a apoiar estas empresas na reta final. Mas desconhecemos a intenção do Executivo de continuar a criar medidas de apoio para estas empresas. E isso preocupa-nos”, conta a Ana Jacinto.

Em causa estão os atrasos “lamentáveis” no pagamento da segunda tranche do Apoiar Rendas, uma ajuda lançada há já quase um ano, mas também a linha já anunciada para ajudar as empresas a capitalizarem-se, mas que ainda não está disponível. O Fundo de Capitalização e Resiliência (FCR), criado em julho, com um capital que poderá ascender a 1.300 milhões de euros, pretende dar apoio público temporário para reforçar a solvência das empresas, pode investir através de instrumentos de capital, de quase-capital, instrumentos de dívida ou uma combinação destes instrumentos, podendo ainda prestar garantias, em determinadas condições.

Agora estamos numa fase complicada porque o Presidente da República dissolveu a Assembleia, estamos numa conjuntura política difícil, há medidas que não saíram do papel e vamos atravessar um período tradicionalmente complicado porque são meses em que a procura diminuiu, não temos o turismo internacional nos níveis que gostaríamos.

Ana Jacinto

Secretária geral da AHRESP

“A AHRESP já alertou que, para prosseguir a recuperação da atividade turística, é necessário que as empresas estejam preparadas e, sobretudo capitalizadas para fazer face aos desafios que se colocam”, diz a secretária-geral da AHRESP. “Há medidas fundamentais de capitalização das empresas e de instrumentos financeiros que não saíram do papel até à data e que devem ser prioridade absoluta deste Governo e do próximo, porque vamos atravessar uma época outra vez complicada e as empresas não têm fôlego ou estofo de tesouraria para aguentar períodos tradicionalmente mais difíceis de menor procura porque foram muitos meses sem faturar nada”, avisa.

“Fomos alertando, ao longo deste período, que as medidas eram anunciadas, mas tardavam em chegar às empresas, para não falar dos processos burocráticos e complexos” que caracterizaram a “maior parte das linhas disponibilizadas”. “Durante meses, algumas empresas não receberam apoios ou foram recebendo de uma forma muito mais tardia e muitas não aguentaram, como revelaram os nossos inquéritos, e fecharam portas“, recorda.

E é esse fantasma que paira novamente sobre as empresas de hotelaria e restauração porque se avizinham meses “tradicionalmente complicados”, com quebras de faturação. “Janeiro e fevereiro são meses péssimos, sempre foram para estes setores de atividade, e vão ser ainda piores este ano e para conseguirmos ultrapassar isto é preciso manter os apoios” e não deitar tudo a perder. Muitas das medidas que a AHRESP tinha apresentado ao Executivo acabaram por não ser incorporadas na proposta de Orçamento do Estado, como por exemplo a descida temporária do IVA, mas o Orçamento não passou; contudo a necessidade de apoios persiste.

O setor que sempre esteve na linha da frente para ajudar a economia nacional a recuperar de crises anteriores — um papel que quer voltar a assumir nesta crise pandémica também, diz Ana Jacinto — está a viver uma espécie de tempestade perfeita. Aos meses tradicionalmente mais parados surge agora uma crise de confiança devido à crise política, a que acresce a subida de preços dos combustíveis e da energia que “impactam diretamente e de forma violenta na atividade, porque estão a fazer com que todas as matérias-primas subam, e até haja escassez de algumas”.

“Com toda a conjuntura, a acrescer a crise política, a AHRESP antecipa grandes dificuldades — que já antecipava antes, na verdade — para estes setores, por isso é preciso fazer alguma coisa“, diz perentoriamente Ana Jacinto.

Se não ajudarmos estas empresas e as alavancarmos, dificilmente o país sai de qualquer tipo de crise.

Ana Jacinto

Secretária geral da AHRESP

“Vamos ver o que vai acontecer agora. Estamos muito preocupados, porque estamos num momento de alguma recuperação, mas é lenta e não é transversal a todo o território“, sublinha Ana Jacinto, reconhecendo que “os meses de agosto e setembro foram positivos e até o mês de outubro foi interessante”. “Houve um respirar e um alívio para estas empresas. Mas não serão suficientes para aguentarmos meses de muito pouca procura e nesta situação política que estamos a atravessar e que nada ajuda”, diz.

Mas, tendo em conta o esforço que o Executivo fez em apoiar as empresas e o emprego — “isso é indiscutível” — “não vamos agora deitar tudo por terra na fase final. É imprescindível que as empresas se aguentem para, no próximo ano, percorrermos um caminho de crescimento”, apela.

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