Jane Hoffer, a CEO da GoWithFlow, empresa de mobilidade sustentável da Galp, diz que o objetivo para 2021 é triplicar, para 15 mil, as frotas de de carros, motas, scooters e trotinetas que gerem.
Nasceu no CEiiA – Centro de Engenharia e Desenvolvimento de Produto como uma startup e depressa atraiu investidores pelo software inovador que permite fazer uma gestão de mobilidade sustentável para empresas e cidades que têm como objetivo descarbonizar a pegada da sua mobilidade urbana. A solução criada pela GoWithFlow — que tem como base uma tecnologia que coordena os utilizadores e os ativos de mobilidade das empresas para fornecer análises e informações em tempo real sobre como são utilizados veículos, scooters e estações de carregamento –, cativou a atenção da Galp, que hoje é acionista maioritário.
Com uma vasta experiência no mundo do empreendedorismo, a norte-americana Jane Hoffer aceitou o desafio de trocar os Estados Unidos pelo Porto para se tornar CEO da GoWithFlow, no final de 2019. Entretanto a pandemia de Covid-19 veio abalar o mundo mas nem isso impediu a empresa de lançar em meados de 2020 o seu primeiro produto para o mercado: um sistema de gestão integrada, tanto da energia elétrica como da mobilidade, num único serviço.
Já têm hoje cerca de 25 clientes em Portugal e em 2021 querem expandir a operação para Espanha e triplicar o número de veículos (independentemente do número de rodas e do combustível que usam) que têm sob gestão: de 5.000 para 15.000, garantiu Jane Hoffer ao Capital Verde, numa entrevista presencial que decorreu nos escritórios da GoWithFlow, em pleno cenário da Refinaria da Galp, em Matosinhos.
A GoWithFlow nasceu no final de 2019 e no ano seguinte, apesar da pandemia, não esteve parada. Como foi gerir isto tudo e ainda assim fazer a empresa crescer de uma startup para uma scale-up?
Eu aceitei a posição de CEO da GoWithFlow em dezembro de 2019 e vim dos Estados Unidos para o Porto a meio de janeiro de 2020, conheci a equipa, lançámos o projeto, abrimos o escritório e, no fim de fevereiro, o meu visto de visitante terminou. Tive de voltar para os Estados Unidos e só acabei por regressar a Portugal no final de julho. Durante meses foi tudo remoto, mas a equipa já estava habituada a trabalhar junta desde há muitos anos no CEiiA – Centro de Engenharia e Desenvolvimento, por isso a coesão já existia. Não era como se estivéssemos a contratar toda a gente de raiz. Passámos a primeira metade de 2020 a olhar para as tecnologias que já tínhamos, e que levaram a Galp a querer comprar a startup e a ver como o que poderíamos fazer para criar um produto, comercializar e trazer para o mercado.
Uma empresa mais focada no produto?
Tínhamos de passar dos projetos para um produto comercializável. Para crescer globalmente precisávamos mesmo de um produto. Ainda estamos a percorrer esse caminho. No ano passado lançámos o Flow Sustainable Mobilitity Management Platform e continuamos a refinar este nosso produto. Esta plataforma de software é o que temos agora para oferecer, principalmente às empresas e aos municípios, focando-nos assim em como os podemos ajudar a gerir a transição dos combustíveis fósseis para a eletrificação das suas frotas.
Quais são os objetivos para 2021?
2021 será a fase final de criação do produto e da tecnologia. Será sobre expansão e aprendizagem em relação ao mercado. Vamos continuar a expansão na Península Ibérica (mais em Espanha) e avançar para mercados como os EUA e o Reino Unido. Queremos ter uma carteira sólida de clientes. A empresa tem sido historicamente muito forte na parte de engenharia. Este ano vamos expandir mais a parte relacionada com o mercado e com os clientes. O nosso objetivo é aumentar a nossa base de ativos de mobilidade — seja um veículo de quatro rodas, motociclo elétrico, scooter, trotineta — e também de pontos de carregamento: triplicar o número de ativos de mobilidade elétrica que temos sob gestão, dos atuais 5 a 6 mil para cerca de 15 mil.
E como planeiam fazer isso?
Nós somos uma empresa de software que interage com ativos físicos, como veículos e estações de abastecimento e carregamento elétrico. A eletrificação é uma necessidade, mas para as empresas é também uma disrupção. Será uma das maiores mudanças na forma como as empresas operam os seus transportes para levar a cabo os seus negócios. Isto já está a acontecer por fases. Na primeira fase, ajudamos as empresas a compreender e a planear com base em dados e algoritmos. Muitas empresas já estão nesta viagem, têm alguns híbridos plug-in, têm alguns veículos elétricos e até estações de carregamento. A transição do fóssil para o elétrico levará anos. Não é uma coisa que acontece do dia para a noite. A nossa tecnologia, na nossa plataforma e com o nosso software, reúne essas fontes de dados e ajuda a empresa a gerir essas transições. A segunda fase consiste em saber como vão operar no terreno (com base em informações de consumos, níveis de bateria e níveis de combustível, quilometragem, bem como a infraestrutura de carregamento. E só na fase 3 podem começar a otimizar procedimentos.
Vamos continuar a expansão na Península Ibérica (mais em Espanha) e avançar para mercados como os EUA e o Reino Unido. Queremos ter uma carteira sólida de clientes. A empresa tem sido historicamente muito forte na parte de engenharia. Este ano vamos expandir mais a parte relacionada com o mercado e com os clientes.
As empresas estão ansiosas por mudar as suas frotas para elétrico?
Ainda é cedo, o que é ótimo porque já estamos aqui desde o início, num mercado que vai descolar. E isso vai acontecer porque a paridade de preços do veículos elétricos para o gasóleo e para a gasolina se está a alcançar, à medidas que o preço das baterias baixam. Outro grande driver são as marcas automóveis que estão a comprometer-se em converter toda a sua produção para veículos elétricos. Mas ainda assim continua a existir do lado do consumidor a preocupação com a capacidade de autonomia dos carros, por isso os híbridos plug in são os mais vendidos. O mercado ainda é recente mas está a crescer rápido e a curva vai acelerar. As empresas têm de passar o primeiro obstáculo: “Por onde é que eu começo?”. Como somos membros do BCSD Portugal, temos falado com muitas empresas que já estão despertas para a sustentabilidade e para a mobilidade elétrica. São estas que nos procuram.
Trabalham em parceria com que empresas?
Há parceiros naturais para a Flow. Muitas das frotas que já estamos a gerir hoje são da LeasePlan. Nós temos o software de gestão e eles os veículos. Outra parceria natural é com a Galp, porque eles têm muitos clientes de frota, e podem fornecer a energia elétrica e os carregadores. É uma parceria natural e temos tudo a ganhar com este ecossistema de mobilidade. Fora de Portugal, sobretudo em Espanha, ainda não temos clientes mas estamos à procura de parceiros junto dos fabricantes dos postos de carregamento para podermos entrar em conjunto com uma solução chave na mão, também com leasing. Nos Estados Unidos e no Reino Unido estamos a recrutar este ano. Vamos operar outros mercados europeus, mas a partir de Portugal. Em Espanha, estamos a recrutar vendedores. Não há razão para que até ao final do ano não tenhamos um número de clientes no país vizinho.
Quantos clientes têm já em Portugal?
Cerca de 20 a 25, o que equivale a 2.000 veículos de frota e mais de 500 estações de carregamento nessa rede.
Qual é a maior frota que gerem neste momento?
Cerca de 800 veículos, da Infraestruturas de Portugal.
As frotas que operam já são todas elétricas?
Isto é uma jornada contínua, ninguém começa 100% elétrico. As frotas usam a nossa tecnologia e reúnem dados para poder acelerar a sua transição. Estamos muito interessados em trabalhar com empresas que ainda não têm muitos veículos elétricos, mas está nos seus planos mudar. Neste momento, 46% das frotas que gerimos têm híbridos plug-in e veículos elétricos, o que é, na verdade, muito elevado. O papel da GoWithFlow é ajudar a simplificar a complexidade desta transição, do fóssil para o elétrico, entre o velho mundo e o novo mundo. O facto de existirem diferentes tipos de combustíveis torna tudo mais complexo e, portanto, as empresas precisam da ajuda de alguém para simplificar.
Entre os mais de 400.500 veículos geridos nos últimos 12 meses, as empresas podem ter poupado, em média, 2025 euros por ano num veículo de aluguer (renting). E também calculamos a redução das emissões de carbono, porque registamos os quilómetros percorridos, o combustível gasto, o custo de manutenção, o custo do seguro, o custo do leasing e fazemos uma análise.
Se uma empresa quiser ter uma frota elétrica o que tem de fazer?
Antes de mais temos de saber se os veículos estão a renting ou leasing, ou se a empresa é dona deles, com que rapidez conseguiriam fazer uma mudança, se quisessem, no veículo atual. Mas o que faríamos seria a análise da eletrificação para a empresa, e faríamos isso em tempo real instalando um dispositivo num dos veículos durante 90 dias, registando dados e analisando-os. Depois, com base nos quilómetros, onde param, onde estacionam, onde pernoitam, fazemos o diagnóstico: por exemplos, destes 20 veículos, estes 7 ou 10 devem ser substituídos por elétricos e este e o modelo que recomendamos. Também aconselhamos os locais a instalar pontos de carregamento e estimamos o custo total das suas operações atuais, tendo em conta o combustível, gasto, os custos da manutenção e do leasing. E projetamos os custos para a primeira fase da transição.
Conseguem dizer às empresas quanto vão poupar com a mobilidade elétrica?
Entre os mais de 400.500 veículos geridos nos últimos 12 meses, as empresas podem ter poupado, em média, 2.025 euros por ano num veículo de aluguer (renting). E também calculamos a redução das emissões de carbono, porque registamos os quilómetros percorridos, o combustível gasto, o custo de manutenção, o custo do seguro, o custo do leasing e fazemos uma análise.
E quando as empresas veem esses números, qual é a reação?
Eu acho que, na grande maioria, é de enorme surpresa por causa do que podem poupar e por poderem fazer a transição para a mobilidade elétrica mais rápido do que pensavam. Mas ainda há mitos, como o da autonomia. Acham que vão estar na estrada e não vão ter bateria suficiente para terminar a viagem.
Disse que ainda se trata de um “early market”, mas a transição para uma mobilidade mais sustentável é urgente. Não estamos a ir devagar demais?
A infraestrutura de postos de carregamento vai afetar a quantidade de pessoas que acreditam que podem carregar, com sucesso e confortavelmente, o seu veículo na via pública. A quantidade de investimento em infraestrutura pública, aqui em Portugal e pelo mundo, acelerou. As frotas farão a diferença porque vão impulsionar o número de veículos elétricos a circular. Vai aumentar a procura. Tem sido lento mas vai acelerar. 2025 será um grande marco, e depois 2030, muito por causa das zonas de emissão zero nas grandes cidades europeias. Isto afeta também as entregas e a logística urbana. As frotas são hoje os maiores emissões de gases poluentes e por isso têm o dever de mudar rapidamente.
Qual é o papel da Flow no universo do grupo Galp?
A empresa tem uma base muito grande de clientes com frotas que precisam de fazer a transição para a mobilidade elétrica. A Galp quer ter uma infraestrutura muito grande de postos de carregamento, que precisam de ser monitorizados e geridos com disponibilidade. É uma sinergia natural. Em muitos aspetos, é o melhor dos dois mundos.
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GoWithFlow: “46% das frotas que gerimos já têm híbridos plug-in e elétricos”
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