O património da Santa Casa é vasto. E é na saúde que a entidade liderada por Edmundo Martinho tem apostado mais. Vai criar um centro de reabilitação em Lisboa, semelhante ao de Alcoitão.
Os investimentos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) não se limitam ao Montepio. Além das apostas no setor financeiro e imobiliário, é na saúde que esta entidade se tem distinguido pelo seu trabalho. E vai continuar a reforçar a sua presença. Edmundo Martinho, provedor da SCML, garante em entrevista ao ECO que a entidade quer expandir o acesso aos serviços de saúde, nomeadamente através da criação de mais um centro de reabilitação de grandes dimensões, em Lisboa. “Eventualmente sem internamento, como é o caso de Alcoitão”, afirmou o provedor, no dia em que a entidade que lidera oficializou a entrada no capital do Montepio.
A Santa Casa tem uma forte aposta no imobiliário. Que papel pode ter no programa das rendas acessíveis?
A Santa Casa tem três tipos de ativos imobiliários. Tem aqueles que utiliza para os seus próprios fins — os hospitais, centros de saúde, lares e creches. Tem depois património de natureza cultural e religiosa (os museus, as igrejas). E tem um terceiro que tem a ver com o rendimento. A Santa Casa não tem prédios. É disperso e está ocupado com inquilinos de longa data. Temos dois ou três projetos pensados e desenhados para Lisboa, habitacionais, de maior dimensão, que estamos a reconverter na perspetiva de nos podermos associar ao programa da renda acessível, que penso ser a obrigação da Santa Casa. Daí termos disponibilizado 300 fogos para este programa.
Qual é o valor de uma renda acessível?
Não tenho um valor. Aquilo que está previsto é que o valor está sempre referenciado a uma taxa de esforço em relação ao rendimento do agregado. Não há um valor pré-fixo. A Santa Casa associa-se ao programa através de uma parte do seu património. Vamos beneficiar desse programa como qualquer operador. A Santa Casa vai receber rendas.
Mas podiam receber mais?
Claro que sim.
E na saúde? A Santa Casa ganhou peso neste setor, seja por novos equipamentos, seja por equipamentos que vai gerir em nome da CML.
A saúde é uma área de claro investimento social da Santa Casa. Temos três unidades mais pesadas: o Centro de Reabilitação de Alcoitão, Hospital de Santana, na Parede, e outro que é a Unidade de Cuidados Continuados Maria José Nogueira Pinto na Aldeia do Juzo. São as unidades mais pesadas que temos com caráter residencial e hospitalar.
Depois, temos um conjunto de unidades em Lisboa para ambulatório. Isto além do rastreio móvel que fazemos na cidade Lisboa. Depois, há aqui toda esta área dos cuidados continuados… Estamos para abrir uma ala no Hospital Pulido Valente, de que assumimos a responsabilidade de reabilitação e do funcionamento da Unidade de Cuidados Continuados do hospital. E temos o Hospital da Estrela, que vai ser reconstruído para ser uma Unidade de Cuidados Continuados.
Esse vai ser pesado?
Vai. Ainda por cima, porque tem uma configuração física que o torna ainda mais pesado porque é em altura… Mas é uma resposta. Não sei se têm esta ideia, mas Lisboa não tem cuidados continuados. Tem uma pequenina unidade, uma mutualidade, mas não tem mais nada na cidade.
A saúde tem tido um peso crescente?
Tem. E tem de ganhar ainda mais. Além dos cuidados continuados que são uma coisa estruturante da nossa resposta cuidados em termos nacionais, e particularmente na cidade de Lisboa, a saúde na Santa Casa tem de responder em áreas de trabalho que estão insuficientemente cobertas, ou não cobertas, pelo sistema de saúde público. Esse é o nosso papel, o de tornar acessíveis cuidados a pessoas que têm mais dificuldades no acesso a eles por variadíssimas razões. Queremos desenvolver, e vamos desenvolver em Lisboa, um centro de reabilitação grande. Eventualmente sem internamento, como é o caso de Alcoitão.
É um plano para este mandato?
Sem dúvida nenhuma. A não ser que o meu mandato se interrompa de repente… Temos duas grandes áreas que representam um património significativo da Santa Casa em termos de saúde: uma é a reabilitação, e o modelo de reabilitação tem vindo a ser desenvolvido em Alcoitão, outra é a cirurgia ortopédica, e o modelo tem vindo a ser utilizado, por exemplo, nós temos uma intensidade no domínio da reabilitação e da cirurgia ortopédica geriátrica que não tem paralelo em nenhuma entidade hospitalar. Tudo isto significa dizer que a nossa obrigação é estender a disponibilidade deste património técnico e científico a tantas pessoas quanto formos capazes.
Queremos desenvolver, e vamos desenvolver em Lisboa, um centro de reabilitação grande. Eventualmente sem internamento, como é o caso de Alcoitão.
Que marca vai ficar da sua gestão?
Uma casa que faz 520 anos… Ninguém pode ter a pretensão de que deixa marcas, a não que cá esteja dez ou 12 anos.
Mas com tudo o que quer fazer na saúde…
Mas isso só corresponde a um aprofundamento da estratégia. Não estou a inventar nada. Podemos dizer que a intensidade das prioridades pode ser alterada, certo. Se fosse outro provedor poderia fazer mais para um lado ou para o outro. Mas a Santa Casa tem uma linha de continuidade. A estas grandes áreas da Santa Casa tenho que dar o meu contributo para que elas possam consolidar-se e desenvolver-se.
Temos um projeto que, se o conseguir fazer, já me posso ir embora descansado [risos]. Vamos arrancar, e estamos a desenhar isso já numa fase com alguma proximidade, um projeto grande virado para a empregabilidade das pessoas com deficiência. Uma empregabilidade afastada daquilo que é o emprego protegido, dos enclaves de emprego. É sermos capazes de ajudar pessoas com deficiência, em função obviamente das capacidades que tenham, a construir uma carreira profissional ainda que limitada.
Como é que o quer fazer?
Quero profissionalizar completamente… Imagine uma empresa de recursos humanos, mas vocacionada para pessoas com deficiência. Ou seja, vai perfilar as pessoas, perceber que capacidades têm disponíveis, ser capaz de ajudá-la na construção de processos formativos, formar, preparar as pessoas para uma entrevista de emprego. Por exemplo, ajudar as pessoas na primeira fase de relação com o emprego. Temos pessoas fantásticas no país e que têm muitas vezes dificuldade de aceder a empregos porque lhes falta, às vezes, o suporte adequado.
E porque as empresas não estão preparadas…
Certo. E é esse trabalho que temos de fazer.
A única coisa que quero quando sair daqui, seja lá quando for, é que as pessoas pensem que valeu a pena eu ter passado por aqui. Eu não tenho nenhuma espécie de aspirações políticas.
Três anos são suficientes para o seu programa?
Até pode ser demais. Neste sentido: depende da solidez com que as coisas são lançadas. Nenhum de nós precisa de ver as coisas feitas, acabadas. Se a pessoa tiver a consciência de que está a lançar, ou a contribuir para lançar base de soluções sustentadas, partilhadas pelo conjunto da organização… É por isso é que digo que três anos podem ser até demais. Mas numa casa destas o tempo nunca chega porque os desafios são de tal ordem, os estímulos são de tal ordem que há sempre coisas novas para fazer. Vamos fazer coisas novas este ano ainda.
Algumas ainda nem as pensou…
Temos previstas duas ou três coisas que ainda estão na fase de desenhar, de avaliação… Mas temos feito coisas interessantes. Eu não tenho nenhuma aspiração. A única coisa que quero quando sair daqui, seja lá quando for, é que as pessoas pensem que valeu a pena eu ter passado por aqui. Eu não tenho nenhuma espécie de aspirações políticas.
Levo isto com boa disposição, sempre animado e otimista. Alguns acharão que não é otimismo, é inconsciência. Mas isso fica com a opinião de cada um. E digo mais: o que esta casa não for capaz de fazer é porque não sabemos fazer ou não temos talento ou competência para isso. A Santa Casa tem condições de trabalho e condições para trabalhar que muito poucas instituições no país têm. É nossa obrigação fazer o melhor que pudermos com aquilo que temos à nossa disposição. Essa é uma obrigação que temos.
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“Santa Casa vai criar novo centro de reabilitação em Lisboa”
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