A Assembleia Geral da OA está a aproximar-se e a Advocatus foi perceber junto de dois advogados, do bastonário e de um membro da CPAS pontos relevantes para a discussão do regime de previdência.
É já amanhã, dia 26 de março, que os advogados vão votar, eletronicamente, se querem ou não ir a referendo para decidir qual o sistema de previdência: manter a atual Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS) ou mudar para o regime geral da Segurança Social. À Advocatus, os advogados mostram-se divididos quanto à sua preferência, mas garantem que a CPAS necessita de se reinventar.
“A CPAS será boa se se souber reinventar e servir adequadamente a maior parte dos seus beneficiários. Caso contrário, estará condenada a ser integrada na Segurança Social. Honestamente, nem sei se ainda irá a tempo dessa reinvenção”, considera Paulo Valério, sócio da Valério, Figueiredo & Associados (VFA).
Por outro lado, José Luís Moreira da Silva, sócio da SRS Advogados, acredita que a atual caixa de previdência é o melhor regime para os advogados. Ainda assim, refere que a comparação não pode ser feita com o regime geral da Segurança Social mas antes com o regime especial dos trabalhadores independentes, “que é muito lacunar e não oferece a proteção do regime geral”.
Sem assumir uma posição sobre qual será o melhor regime, o bastonário da Ordem dos Advogados (OA), Luís Menezes Leitão, garante que fruto da sua posição nunca irá “assinar uma cruz” na primeira proposta que lhe apresentem de alteração ao regime de previdência dos advogados.
“Qualquer eventual alteração só deve fazer-se depois de serem estudadas todas as suas implicações nas pensões em pagamento, nas pensões em formação, nos benefícios a atribuir e nas contribuições dos beneficiários. E também só deve fazer-se depois de se ter a certeza de que é isso o que efetivamente a maioria dos advogados deseja”, sublinha o líder dos mais de 33 mil advogados do país.
"Os advogados têm muitas queixas da CPAS, mas também existem muitas queixas dos cidadãos relativamente à Segurança Social. O relatório da Provedoria da Justiça de junho passado revelava que 36% das queixas recebidas respeitam à Segurança Social.”
CPAS ou Segurança Social? Enquanto que a resposta de José Luís Moreira da Silva é assertiva, o atual regime, para Paulo Valério a escolha não está decidida.
“Acho que este assunto deve ser abordado mais numa lógica coletiva. Os interesses de cada um são necessariamente diferentes, porque têm condições de exercício profissional diferentes ou estão sujeitos a diferentes variáveis de ordem pessoal ou familiar”, nota o sócio da VFA.
Para o advogado o mais importante é que o sistema seja “justo, solidário, sustentável e apto a responder aos desafios que se colocam à advocacia nos dias de hoje, que são muito diferentes dos desafios do passado. Eu estarei sempre disposto para contribuir num sistema com essas características”.
Paulo Valério refere que o setor da advocacia será mais forte se todos os advogados forem respeitos e ouvidos, quer exerçam em prática individual, em contexto societário ou de empresa. “No fundo, ninguém ganha com clivagens como as que temos visto ao longo dos últimos anos. (…) E a Ordem, em diversos mandatos, tem contribuído menos para isso do que deveria”, refere.
Convicto que a CPAS é o melhor regime, o sócio da SRS Advogados sustenta a sua posição na fraca comparação com o regime da segurança social dos trabalhadores independentes e por sempre preferir um regime de previdência adequado à sua profissão, que não dependa do Estado e que mantenha o cerne de independência que caracteriza a profissão.
“Se os advogados estivessem dependentes do Governo, designadamente para a sua reforma, a nossa independência sofreria e os alicerces da profissão cairiam“, garante José Luís Moreira da Silva.
CPAS: Reforma de 2015, assimetrias e contribuições elevadas
A discussão sobre o regime de previdência social dos advogados tem sido recorrente ao longo dos anos, mas face ao período de estado de emergência que o país enfrentou, intensificou-se. Durante este período os tribunais estiveram encerrados impedindo que os advogados tivessem direito a qualquer apoio social por parte da CPAS.
Uma vez que os advogados não descontam para a Segurança Social, mas antes para a CPAS, estes profissionais não têm direito aos apoios do Estado. Ainda assim, Susana Afonso, membro da direção da CPAS, explicou à Advocatus que o desígnio exclusivo da instituição continua o mesmo desde o início: proteger os advogados das eventualidades da velhice e da invalidez e as suas famílias da morte do beneficiário
"A CPAS será boa se se souber reinventar e servir adequadamente a maior parte dos seus beneficiários. Caso contrário, estará condenada a ser integrada na Segurança Social. Honestamente, nem sei se ainda irá a tempo dessa reinvenção.”
“Com o tempo alargou o seu âmbito de aplicação subjetivo a solicitadores e a agentes de execução e também o seu escopo, sendo hoje uma Instituição com características mistas, principalmente previdenciais mas também assistenciais. Este é o desígnio que a CPAS tem de continuar a prosseguir, cabendo à geração presente continuar a trabalhar para reforçar, melhorar e alargar cada uma dessas valências, mas sempre com a independência que a caracteriza e com a prudência que se exige“, refere a advogada.
Caso seja aprovado o referendo, os advogados vão poder debater os pontos positivos e negativos, tanto da CPAS como da Segurança Social. Ambos os sistemas não são perfeitos, segundo o bastonário, por isso é necessário haver cuidado para garantir que qualquer opção dos advogados os coloca numa situação melhor.
“Os advogados têm muitas queixas da CPAS, mas também existem muitas queixas dos cidadãos relativamente à Segurança Social. O relatório da Provedoria da Justiça de junho passado revelava que 36% das queixas recebidas respeitam à Segurança Social”, revela Luís Menezes Leitão.
Focando no atual regime de previdência dos advogados, a CPAS, a Advocatus foi tentar perceber quais os seus principais problemas. Desde assimetrias entre os interesses, à elevada fixação do valor mínimo das contribuições, até à reforma levada a cabo a 2015, vários são os pontos apontados pelos beneficiários da CPAS.
“Creio que o principal problema é uma clara assimetria entre os interesses dos advogados que, em maioria, compõem a base da pirâmide – muito desprotegidos no seu exercício profissional – e o benefício que o sistema ainda dá a uma relativa minoria de beneficiários, que teve condições de exercício e crescimento profissional bastante mais favoráveis”, explica Paulo Valério.
O sócio da SRS aponta a reforma de 2015 como o principal problema da CPAS, uma vez que acredita que tenha sido feita com pouco debate entre os advogados e os solicitadores e por isso “muito mal compreendida”.
"Se os advogados estivessem dependentes do Governo, designadamente para a sua reforma, a nossa independência sofreria e os alicerces da profissão cairiam.”
“Também, pode haver uma errada perceção dos beneficiários sobre o regime da CPAS, que não é um regime assistencial total, senso principalmente um regime de reformas ao qual se têm vindo a agregar outros benefícios ao longo dos anos. Os problemas causados pela pandemia também trouxeram preocupações novas que a CPAS não estava preparada para resolver, o que só demonstra a necessidade se fazerem reformas“, acrescenta José Luís Moreira da Silva.
Já Luís Menezes Leitão sublinha que a elevada fixação do valor mínimo das contribuições é um problema e apresenta-se como “insustentável” nos casos de baixos rendimentos. “Outro problema era ainda o facto de não atribuir qualquer proteção em caso de incapacidade para o trabalho, que felizmente se conseguiu mitigar este ano através da contratação pela CPAS de um seguro de grupo para cobrir essa eventualidade”, acrescenta.
O líder dos mais de 33 mil advogados admitiu à Advocatus preferir o regime que existia na CPAS antes da reforma de 2015, embora reconhecesse os abusos praticados no regime anterior e a evolução dos sistemas de segurança social justificassem que se tivesse feito essa alteração.
Susana Afonso não tem dúvidas, contrariamente aos restantes colegas de profissão que conversaram com a Advocatus, que a CPAS é o melhor, o mais seguro e o mais sustentável sistema de previdência.
“É dever dos seus beneficiários estarem conscientes disto, pois só assim estão em condições de cumprirem a sua parte nesta missão: a defesa cabal dos seus interesses individuais e coletivos. Esta afirmação é incontestável, os números falam por si. Os estudos atuariais não só concluem ano após ano que a CPAS é uma instituição sólida, robusta e equilibrada, como afirmam e reforçam que é bastante mais sustentável do que a Segurança Social” garante a membra da direção da CPAS.
“A CPAS é a joia da coroa dos advogados”, diz Susana Afonso
À Advocatus, Susana Afonso apresentou vários indicadores, que segundo a própria, comprovam a solidez da CPAS. “O Fundo de Garantia que é três vezes superior porque tem uma sustentabilidade que assegura mais de cinco anos de pagamento de pensões, ao contrário do da Segurança Social que está neste momento nos 18 meses, considerando que nesse período não seria recebida mais nenhuma contribuição”, explica.
Outros dos indicadores apresentados é o número de ativos versus pensionistas. “5,5 ativos por cada pensionista, que compara com os 1,6 ativos da Segurança Social por pensionista”, nota Susana Afonso.
A advogada sublinha também que a CPAS, do ponto de vista da sustentabilidade, é um sistema que, mesmo daqui a 20 anos, terá um rácio de ativos por pensionista superior, em dobro, em relação ao rácio que atualmente apresenta o sistema da Segurança Social.
“A idade de reforma da CPAS, aos 65 anos, compara muito melhor que a da Segurança Social (66 anos e 7 meses) o que significa, nesta data, mais um ano e sete meses de recebimento de pensão e menos um ano e seis meses de pagamento de contribuições pelos Beneficiários da CPAS comparativamente com os da Segurança Social, diferencial com tendência para aumentar”, acrescenta.
"O futuro da CPAS depende de saber o quanto os advogados, solicitadores e agentes de execução de hoje se preocupam com a sua reforma e quanto estão conscientes de que a CPAS é sem dúvida alguma o sistema de previdência que melhor defende os seus interesses.”
Outros dos fatores apresentados ainda pela membra da direção da CPAS são a base de incidência, que no regime de previdência atual é livre através da escolha entre 21 escalões, e o regime de proteção da parentalidade, tendo em conta que o benefício de maternidade tem um valor mínimo, independentemente de os beneficiários estarem no escalão mínimo.
Ainda assim, admite que existem pontos que a CPAS precisa de continuar trabalhar de forma a melhorar a proteção dos beneficiários. Entre esses aspetos está um melhoramento do método de contribuições e um aprofundamento sustentado do quadro assistencial.
“Em matéria de contribuições, por exemplo, hoje já existe a previsão de não pagamento de contribuições nas situações de incapacidade temporária para o trabalho por doença grave ou por situação particular de parentalidade. No mesmo contexto a redução do prazo de garantia de 15 anos para 10 anos foi também um benefício, relacionada com a constatação de que havia situações em os Beneficiários ingressavam tardiamente na profissão”, constata.
"Qualquer eventual alteração só deve fazer-se depois de serem estudadas todas as suas implicações nas pensões em pagamento, nas pensões em formação, nos benefícios a atribuir e nas contribuições dos beneficiários. ”
À Advocatus, Susana Afonso garantiu ainda que uma das prioridades desta direção da CPAS tem sido a assistência média e a proteção na doença, por exemplo através da atribuição gratuita do seguro de proteção de rendimentos por acidente ou doença, que garante uma prestação pecuniária equivalente a 70% da remuneração convencional mensal escolhida pelo beneficiário, nas situações de baixa médica.
“O futuro da CPAS depende de saber o quanto os advogados, solicitadores e agentes de execução de hoje se preocupam com a sua reforma e quanto estão conscientes de que a CPAS é sem dúvida alguma o sistema de previdência que melhor defende os seus interesses”, refere.
Susana Afonso alerta ainda que os os advogados, solicitadores e agentes de execução não estão mais protegidos e mais seguros com a sua integração na Segurança Social e que a CPAS é e pode continuar a ser a “joia da coroa dos advogados”.
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CPAS ou Segurança Social: Advogados mostram-se indecisos quanto ao sistema de previdência
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