Margem financeira dos bancos nacionais está a abrandar, mas mantém-se entre as mais elevadas da Zona Euro

Apesar de estar a cair há seis meses seguidos, o diferencial entre as taxas de juro ativas e passivas dos bancos portugueses permanece entre os mais elevados do espaço da moeda única.

A banca nacional está a atravessar um “momento único” na sua história, como descreveu há dias o governador do Banco de Portugal, Mário Centeno. Os 3,3 mil milhões de lucros que os cinco maiores bancos alcançaram nos primeiros nove meses do ano reforçam essa ideia.

Mais ainda porque o bom desempenho alcançado somente pelo quinteto bancário em 2023 permite, desde já, anular os elevados prejuízos que a totalidade do setor acumulou ao longo da década de 2010, que ficou marcada por falências e resgates a diferentes instituições financeiras.

A sustentar os resultados de 2023 tem estado a subida das taxas de juro ao longo deste ano, como resultado da política monetária do Banco Central Europeu que, desde julho de 2022, promoveu um aumento de 450 pontos base nas taxas diretoras.

Segundo cálculos do ECO, o diferencial de taxas de juro ativas e passivas da banca portuguesa quase que duplicou no espaço de um ano até agosto. Mais nenhum país da Zona Euro registou um incremento tão expressivo. A agência creditícia canadiana DBRS, num relatório publicado recentemente, referiu inclusive que os bancos portugueses estão entre os que mais têm beneficiado com a subida das taxas de juro no espaço da Zona Euro.

Não é para menos: além de, no último ano, a banca nacional ter deixado de ter a sexta oferta de crédito à habitação mais barata da Zona Euro, para disponibilizar atualmente a sétima proposta mais cara do espaço da moeda única, também a remuneração dos novos depósitos permanece entre as menos generosas do espaço do euro.

O nível da margem financeira dos bancos portugueses é atualmente o sétimo maior da Zona Euro, apenas superada pelos países bálticos, Grécia e Chipre. Além disso, no espaço de um ano, apenas baixou 0,21 pontos percentuais, quando na Zona Euro a queda da margem financeira foi de quase quatro vezes superior.

“A banca nacional é relativamente competitiva na concessão de crédito, mas neste momento é menos competitiva na atração dos depósitos”, refere Carlos Santos, professor do ISEG, justificando essa situação por “a banca nacional ter liquidez suficiente, pelo que não tem necessidade de ser agressiva a competir para atrair depósitos.”

De acordo com dados do Banco de Portugal e do BCE, apesar da taxa de juro dos novos depósitos em Portugal ter quadruplicado desde janeiro, passando de 0,56% para 2,29% em setembro, é a quinta remuneração mais baixa da Zona Euro, cuja média se situa nos 3,08%.

 

Nas contas dos cinco maiores bancos nacionais, a recente dinâmica das taxas de juro ativas (tomando por base as taxas de juro do crédito à habitação, que representa a maior fatia do crédito concedido pelos bancos) e das taxas de juro passivas (oferecidas nos depósitos) traduziu-se numa margem financeira de 4,7 mil milhões de euros nos primeiros 9 meses do ano, cerca de 62,5% acima dos valores registados no mesmo período em 2022.

No entanto, este período áureo da banca está a resfriar. Desde março que o diferencial entre taxas de juro ativas e passivas está a cair em Portugal – na Zona Euro, essa queda acontece desde setembro do ano passado. Atualmente, são 1,97 pontos percentuais que separam as duas taxas.

Apesar de ser o nível de margem financeira mais baixo desde agosto de 2022, ainda é mais do dobro da média do que se regista entre os bancos da Zona Euro, e acima da média dos últimos 5 e 10 anos em Portugal.

O nível da margem financeira dos bancos portugueses é atualmente o sétimo maior da Zona Euro, apenas superada pelos países bálticos, Grécia e Chipre. Além disso, no espaço de um ano, apenas baixou 0,21 pontos percentuais, quando na Zona Euro a queda da margem financeira foi de quase quatro vezes superior, cerca de 0,81 pontos percentuais.

Os casos mais extremos são Malta e França, onde o diferencial entre as taxas de juro ativas pelas passivas passou para valores negativos, como resultado das taxas de juro dos novos empréstimos serem já inferiores à taxa de juro dos novos depósitos.

 

“O diferencial entre as taxas de juro ativas e passivas está relacionado com o comportamento da procura de depósitos a prazo pelas famílias em Portugal e a existência de produtos financeiros concorrentes”, refere Patrícia Sofia Figueiredo Martins, professora da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), apontando o dedo à reduzida literacia financeira dos portugueses

A docente nota, por exemplo, que “a maioria das famílias portuguesas aforradoras quando tem que escolher entre fazer aplicações no mercado monetário ou no mercado de capitais, prefere fazer aplicações no mercado monetário, mesmo quando as taxas de juro reais [desses produtos] são negativas”, como tem acontecido no passado recente.

“Este comportamento da procura de depósitos a prazo, menos sensível a variações da taxa de juro, implica que os bancos portugueses não tenham incentivos para aumentar significativamente as taxas de juro de remuneração dos depósitos para atrair novos depositantes“, conclui Patrícia Martins.

Observando os dados do Banco de Portugal, verifica-se também que, desde maio, a taxa de juro dos novos créditos à habitação tem-se mantido praticamente estável em níveis historicamente elevados, enquanto a remuneração dos novos depósitos quase que duplicou no mesmo período.

É típico dos processos de evolução das taxas de juro que, quando estas sobem, a margem financeira aumenta, e quando descem, a margem aperta, devido às diferentes velocidades de ajustamento entre taxas ativas e passivas”, refere fonte oficial da Associação Portuguesa de Bancos (APB), notando que “à medida que o tempo passa e a concorrência faz o seu efeito, as margens tendem a reduzir-se.”

Em agosto, numa nota enviada aos seus clientes, a DBRS considerava que o crescimento da margem financeira pode já ter atingido o pico nalguns bancos portugueses ou estar próximo disso noutros. Para João Pedro Oliveira e Costa, presidente do Banco BPI, o pico da margem financeira do seu banco só deverá ser atingido no último trimestre deste ano, e só começar a descer no próximo.

“O aumento do custo dos recursos e o abrandamento vai contrabalançar com o processo de repricing que ainda exista. Contamos que a estabilização [da margem] aconteça neste trimestre ou no próximo. Em 2024 irá reduzir”, apontou o banqueiro no decorrer da apresentação dos resultados dos primeiros nove meses do ano.

A mesma expectativa é partilhada por Pedro Castro e Almeida, presidente do Santander Totta. “É difícil estimar o momento de pico da margem financeira, mas não deveremos estar muito longe do seu pico”, referiu o banqueiro na apresentação das contas do último trimestre do banco.

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