A desertificação do interior não é um problema
Para quem tenha emprego, a qualidade de vida tende hoje a ser bastante superior em ambientes rurais, e em especial nas pequenas cidades, do que nos grandes meios urbanos.
O pensamento dominante em Portugal vai no sentido de que se deve investir fortemente no interior do país, de modo a impedir o seu envelhecimento e desertificação. Muito dinheiro se tem gasto de acordo com este raciocínio.
No entanto, a verdade é que, se nos limitarmos a um ponto de vista estritamente económico, este tipo de políticas representa, de forma geral, um desperdício de recursos. A desertificação do interior deve ser gerida de modo a garantir as necessidades básicas da população que ainda lá reside, assim como a defesa do património de interesse cultural. Mas querer parar a desertificação do interior é o mesmo que querer parar o vento com as mãos. Só por si, a desertificação não é um problema. Pelo contrário, é o resultado de um processo de mudança estrutural, através do qual a população fugiu dos trabalhos de pouca produtividade disponíveis “na terra”, e abraçou a modernidade das cidades. A desertificação do interior é bom sinal. É o resultado de um Portugal moderno.
Investigações recentes em matéria de História Económica têm mostrado que, regionalmente, ou seja, dentro de cada país, as partes mais ricas da Europa em 1800 continuam a ser as mais ricas de cadapaís hoje (só há uma exceção digna de nota, a Bavária). Pelo menos desde essa altura, senão já antes, as cidades constituem a principal fonte de crescimento económico das sociedades.
O crescimento económico moderno depende das cidades. Como Paul Krugman notou nos seus trabalhos científicos, este é um processo em que os ganhos de escala, designados como economias de aglomeração, vencem os rendimentos marginais decrescentes resultantes de falta de espaço. Por isso mesmo, tem toda a razão Nuno Garoupa quando diz que:
“O conjunto de infra-estrututras disponibilizado à população do interior é muito melhor do que era há 20 anos, mas todas aquelas populações não produzem riqueza para pagar esses equipamentos. Mas alguém vai ter de os pagar. Esta é a discussão que temos de ter, em vez de continuar a fazer paliativos e a discutir subsídios e isenções fiscais.”
Aliás, quase toda a gente sabe que, pelo menos para quem tenha emprego, a qualidade de vida tende hoje a ser bastante superior em ambientes rurais, e em especial nas pequenas cidades, do que nos grandes meios urbanos, os quais sofrem de um claro défice de investimento relativamente à sua dimensão e à riqueza que geram. Também está bem demonstrado que os que “ficam” têm níveis de educação mais baixos (em parte por já terem à partida menos inclinação para isso) do que os cosmopolitas, um processo que, acumulado, leva por vezes a implicações políticas importantes, como tem acontecido em vários lugares, não só no Reino Unido e nos EUA, mas também em países da Europa do Leste ou na Turquia.
Podemos, e devemos, cuidar do interior por motivos redistributivos, de equidade, e até de segurança. Mas não devemos esquecer que a eficiência económica também tem que ser considerada. E, neste aspeto, são as cidades que devem ter prioridade. Até porque só criando riqueza hoje se conseguirá ter mais para redistribuir amanhã.
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