As empresas não valem votos
O Portugal 2020 não pode ser desaproveitado, mas a diferença entre os pagamentos já realizados e o que está programado mostra que, para o governo, as empresas não dão votos.
O Portugal 2020 é hoje a única alavanca de cooperação económica entre a União Europeia e Portugal. É também uma das poucas alavancas de financiamento disponíveis à economia portuguesa. Não pode ser desaproveitado nem pode ser empatado. Tem de ser espoletado de forma célere, mas responsável. Por outras palavras, tem de chegar rapidamente à economia real e perdurar na forma de investimentos estruturantes, que coloquem a economia nacional noutro patamar de valor acrescentado, e também noutros nichos de especialização internacional.
Numa altura em que o investimento em Portugal representa somente 15% do PIB, e atendendo a que continuamos com uma produtividade de apenas 60% da média europeia, será dessa forma que o PIB potencial aumentará, com isso aumentando o nível de vida dos portugueses.
Sem prejuízo dos argumentos anteriores, devo confessar a minha falta de admiração pelo modelo que subjaz aos fundos estruturais. A lógica de subsídio é perniciosa, a avaliação centralizada das candidaturas é perversa, os regulamentos são desnecessariamente complexos, a multiplicidade de avisos e concursos é absurda, e os atrasos constituem a face (mais) visível da inoperância funcional de toda a burocracia estabelecida no processo.
Na verdade, no plano das ideias, estou persuadido de que Portugal teria vantagem em trocar os fundos estruturais pela redução plurianual dos impostos, por exemplo, utilizando aqueles dinheiros para financiar um IRC nulo durante cinco ou mais anos para todas as empresas com estabelecimento no nosso país. Mas, claro, uma coisa é aquilo que seria melhor em teoria, outra é o que é possível na prática.
Ora, segundo o último boletim de monitorização do PT 2020, no final de Setembro deste ano, já estavam aprovados quase oito mil milhões de euros em fundos comunitários no âmbito de mais de 250 mil operações aprovadas em todo o universo de programas. Sim, mais de 250 mil operações aprovadas. De facto, só a grandeza daquele número assusta.
Na realidade – e aqui reside a minha incompreensão –, que controlo, que eficiência, que responsabilização, se poderá ambicionar com uma tal avalanche de candidaturas entre as quais escolher? Pouca ou nenhuma, creio eu. Aliás, por alguma razão os fundos comunitários foram tão desaproveitados em ocasiões anteriores. Mas os números anteriores evidenciam também outra coisa: a fome por fundos que hoje em dia existe em Portugal, quer no sector privado, quer no público. A pergunta é: estarão estes fundos a fluir para a economia?
No sector privado, o programa COMPETE é aquele que por definição é mais dirigido às empresas. Porém, na relação entre os pagamentos efectivamente realizados e a respectiva programação financeira (o orçamento disponível de cada programa), o COMPETE exibe um rácio de apenas 5% entre pagamentos e programação, bem abaixo da média globalmente observada no PT2020 e que é de 10%.
Ao mesmo tempo, os programas regionais do Continente, ao abrigo dos quais também se preveem incentivos às empresas, estão ainda pior: apenas 3% da programação financeira foi efectivamente paga aos seus beneficiários.
Assim, numa altura em que o Governo se diz próximo da meta definida para 2016, que passaria pelo pagamento de 450 milhões de euros às empresas, alguma coisa não está a correr bem. Porque as médias globais vão indicando a falta de realização do PT2020 ao nível das empresas.
O que é que está a faltar? Confiança? Diligência? Fundos próprios? Provavelmente de tudo um pouco. Enfim, é uma pena que, do ponto de vista da racionalidade política, esteja mais do que visto que para este executivo as empresas não valem votos. Ai se valessem…!
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