Editorial

Galp (sem) Energia (verde)

A Galp desistiu do projeto da refinaria de lítio em Setúbal, um projeto estratégico para Portugal e para a Europa, e encontrou um bode expiatório sueco para sair de onde não queria estar.

A Galp Energia desistiu do investimento na refinaria de lítio em Setúbal, uma decisão que tem tanto de surpreendente como revela um falhanço da petrolífera portuguesa… A Galp arranjou um bode expiatório — a parceira sueca Northvolt, em situação económica e financeira difícil — para abandonar um projeto de investimento que tinha anunciado em 2021.

Nos últimos anos, somaram-se os anúncios de milhões na chamada indústria verde, uma espécie de corrida ao ‘petróleo renovável’, seja no hidrogénio verde ou nas refinarias de lítio. Talvez com excesso de voluntarismo como reconhecia, ainda há semanas, o antigo secretário de Estado João Galamba relativamente ao hidrogénio. E começaram-se a somar logo a seguir dúvidas sobre a efetiva viabilidade destes investimentos de milhões. No caso da Galp, anunciava-se um projeto de mil milhões de euros em velocidade de cruzeiro, o projeto Aurora, em parceria com a sueca Northvolt.

A refinaria de lítio é um dos projetos estratégicos da indústria verde — o hidrogénio, esse, está mesmo em compasso de espera –, é crítico para Portugal e até para a Europa, que não tem uma refinaria sequer, e na cadeia de valor assume uma particular relevância. Escreveram-se manchetes sobre o investimento da Galp nas energias renováveis, a mudança do negócio para o ‘verde’. Foi no mínimo pouco sustentável. Já no início de outubro, conforme o ECO noticiou, a Galp e a Northvolt anunciavam estar a avaliar a possibilidade de obter financiamento do novo sistema de incentivos a investimentos em setores estratégicos de mil milhões de euros para avançar com o empreendimento, uma vez que o faseamento permitido pelo PRR não era “compatível com calendário de execução do projeto Aurora”. Na altura, segundo a Galp, continuava-se a avaliar oportunidades de financiamento, incluindo “ao abrigo da ajuda pública”, que tinha sido aprovado na semana anterior pela Comissão Europeia.

A refinaria de lítio é um dos projetos estratégicos da indústria verde — o hidrogénio, esse, está mesmo em compasso de espera –, é crítico para Portugal e até para a Europa, que não tem uma refinaria sequer, e na cadeia de valor assume uma particular relevância. Escreveram-se manchetes sobre o investimento da Galp nas energias renováveis, a mudança do negócio para o ‘verde’. Foi no mínimo pouco sustentável.

Mais recentemente, a 28 de outubro, o CEO da companhia dizia aos investidores que não havia pressa em decidir sobre o projeto da refinaria de lítio. Afinal, havia… Na verdade, as palavras de Filipe Silva já serviam para preparar o mercado. O gestor deixava cair que a capacidade de minerar lítio em Portugal era motivo de preocupação. E seria necessário que existissem certezas sobre se o lítio português será “parte da equação”, sendo que de momento os projetos “parecem estar atrasados”.

Agora, depois de a empresa sueca ter anunciado que não tinha condições para avançar com a sua parte do investimento, a Galp confessa em comunicado ao mercado a incapacidade para encontrar uma alternativa. Será!? “Apesar dos esforços significativos, que incluíram a constituição de uma equipa qualificada, a realização de estudos de engenharia, a preparação de processos de licenciamento e a procura de incentivos e financiamento, o contexto atual e a impossibilidade de contar com um parceiro internacional impossibilitam a continuidade do projeto“, avança a Galp na informação enviada à CMVM. Portanto, a Galp diz ao mercado que não havia uma única empresa internacional interessada num projeto que ainda há 36 meses era considerado estratégico para a empresa e até para o país? Falta mais informação…

Nem o investimento inicial era de mil milhões de euros, nem haveria falta de fundos ao nível dos sistemas de incentivos (aliás, a linha de mil milhões já foi anunciada pelo ministro Pedro Reis). O que fica claro é que a Galp encontrou a desculpa perfeita para desistir do projeto, e os suecos foram os ‘idiotas úteis’ da petrolífera liderada por Filipe Silva.

A pergunta, portanto, é outra: Qual é a verdadeira razão que explica a decisão da Galp? A petrolífera está a dar sinais de desinvestimento em projetos que eram considerados estratégicos. Um exemplo? Em maio deste ano, a Galp assinou um acordo com a ADNOC para vender dos seus ativos upstream (gás natural) em Moçambique por 650 milhões de dólares. Antes, em abril, a Galp tinha anunciado uma descoberta muito importante de poços de petróleo na Namíbia, que exigiriam investimento.

Filipe Silva disse ao mercado que a Galp quer manter a posição na Namíbia, mas admite estar a avaliar uma short-list para vender parte da operação. O objetivo é financiar a exploração daquela descoberta que puxou pelo valor da Galp, essa sim de centenas de milhões de euros. Aparentemente, a desistência do projeto da refinaria de lítio evidencia que a venda de uma posição na Namíbia não chega, é preciso mais. Ou menos.

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