Investir contra a conjuntura económica

Face a uma conjuntura económica desfavorável, resolver os problemas de gestão no investimento público e aumentar o seu volume permitirá um aumento sustentado do crescimento económico.

Como se esperava, a economia portuguesa está a abrandar, e terá mesmo contraído no terceiro trimestre deste ano, quando comparado com o trimestre anterior. A explicação mais provável é o abrandamento económico na zona euro, especialmente nos principais parceiros comerciais de Portugal, como Espanha, França e Alemanha, que se traduziu na redução das exportações de bens. Trata-se de um desenvolvimento natural dadas as condições económicas, com taxas de juro elevadas, inflação ainda relativamente alta, e uma redução da procura externa.

O próximo trimestre continuará esta tendência. Apesar da inflação na zona Euro estar abaixo do que era esperado, não se antevê para já uma redução das taxas de juro. A escalada da guerra no Médio Oriente constitui um novo choque energético. Isto deve-se ao facto de Israel ser um produtor importante de gás natural. Depois do ataque do Hamas, Israel parou por razões de segurança a maior plataforma de exploração de gás natural, em Tamar. Este gás natural é essencial para a produção de energia em Israel, mas também no Egito, onde além de ser consumido domesticamente, é exportado para a Europa como gás natural liquificado. Num mercado cada vez mais complicado, qualquer carregamento falhado de gás natural pode ter efeitos no preço. Adicionalmente, se o conflito se alastrar geograficamente, poderemos ter efeitos duradouros também no petróleo, e um retorno às tendências inflacionistas.

Não parece também que o Governo irá implementar novas medidas para crescer a economia ainda este ano, mesmo que isso implique um valor anual abaixo das previsões do Governo. Com o orçamento aprovado, uma estratégia de comunicação baseada em excedentes fiscais, e sem eleições este ano, um pequeno desvio do crescimento em relação à previsão inicial será pouco significativo para o Governo. De qualquer forma, será um ano bastante positivo para Portugal, com um crescimento acima da zona euro, nível de desemprego relativamente baixo, e saldos nas contas públicas e nas contas externas.

Com o orçamento aprovado, uma estratégia de comunicação baseada em excedentes fiscais, e sem eleições este ano, um pequeno desvio do crescimento em relação à previsão inicial será pouco significativo para o Governo. De qualquer forma, será um ano bastante positivo para Portugal, com um crescimento acima da zona euro, nível de desemprego relativamente baixo, e saldos nas contas públicas e nas contas externas.

Gonçalo Pina

Mais importante será o ano de 2024, que terá eleições europeias. Dada a conjuntura, é de esperar que a procura externa continue relativamente baixa e que a tendência de abrandamento económico em Portugal se mantenha. Se o turismo esteve acima do esperado nos anos pós-pandemia, deveremos estar preparados se em 2024 ficar abaixo do esperado. Uma das opções seria estimular a procura interna.

O melhor candidato para este estímulo será o investimento público em capital físico, ou seja, o investimento em estruturas e equipamentos usados para fornecer serviços públicos. Estes serviços incluem, por exemplo, a educação, os transportes, a habitação, e a saúde. É importante notar que apesar do que diz o governo, injeções de “capital financeiro” como se fez na Efacec por si só não aumentam a capacidade de produção do país, logo não são consideradas “investimento” em termos macroeconómicos.

O investimento público em capital físico, corrigindo para a inflação, continua o mais baixo dos últimos 25 anos. Sem surpresa, o capital físico público corrigido para a inflação tem vindo a decrescer nos últimos anos. Não é fácil saber qual é o nível de capital público óptimo para um país. Uma das dificuldades é que grande parte do sector público opera fora do mercado, logo não se pode usar preços de mercado para medir o valor da produção. No entanto, a investigação económica sugere que o capital público está cronicamente abaixo do valor óptimo.

Por exemplo, o artigo “What Have We Learned From Three Decades Of Research On The Productivity Of Public Capital?” por Pedro R.D. Bom e Jenny E. Ligthart, mostra que a produção privada aumenta com o capital público. Em “The Public and Private Marginal Product of Capital”, Matt Lowe, Chris Papageorgiou e Fidel Pérez Sebastián mostram que a produtividade da última unidade de capital pública usada na produção é maior do que a privada (em Portugal, duas a cinco vezes maior). Ou seja, se o capital privado e o capital público fossem substitutos perfeitos, poderia aumentar-se a produção da economia se transferíssemos uma unidade de capital do sector privado para o sector público. Obviamente, estes dois sectores não são substitutos perfeitos. Além disso, os inúmeros exemplos de problemas de gestão no investimento público complicam estas comparações. No entanto, estes problemas representam também oportunidades.

Face a uma conjuntura económica desfavorável, resolver os problemas de gestão no investimento público e aumentar o seu volume permitirá um aumento sustentado do crescimento económico português.

  • Professor de Economia Internacional na ESCP Business School

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