Os publicitários não vendem absolutamente nada
A ideia de que a prioridade da publicidade é vender está datada. Porque um publicitário não é um vendedor.
Existe por aí uma visão deturpada da realidade que tende a confundir publicidade com estratégia de vendas. Em nada estão ligadas e invariavelmente quem percebe muito de uma nada percebe da outra.
A visão de que o que importa na publicidade é vender, é algo de datado e que fazia sentido numa época em que as marcas mais não eram do que chancelas distintivas de produtos. Hoje a história é outra.
As marcas transformaram-se em símbolos e em elementos identificativos de valores. Hoje escolhermos aquela marca de tecnologia, ou de roupa, ou de carros, ou de cosmética, não só porque gostamos dela, mas principalmente porque ela nos diz a nós e aos outros muito sobre nós próprios.
Confuso? É simples: já não basta explicar ao consumidor o porquê de sermos a melhor escolha. É preciso que o consumidor sinta a nossa marca como sua.
Este fenómeno faz com que as marcas se tenham transformado numa cadeia de valores, que só podem ser transmitidos com recurso a uma boa e criativa comunicação publicitária.
O mundo das marcas tornou-se pois mais complexo e se juntarmos a isto a dispersão que existiu nos media, a falta de preparação da maioria das agências e profissionais para a comunicação digital e a crise que o nosso país enfrentou, percebemos facilmente o porquê de terem aparecido publicitários a berrarem aos sete ventos que conseguem vender mais do que os outros.
Se está a ler esta crónica e um dia tiver que escolher uma agência de publicidade, fixe bem esta frase: os publicitários não vendem absolutamente nada. Falo por mim, que a única coisa que vendi enquanto publicitário foram campanhas.
Se está a ler esta crónica e um dia tiver que escolher uma agência de publicidade, escolha a que na sua opinião faz as melhores campanhas e a que possa ajudar a sua empresa a transformar a sua marca em algo de verdadeiramente relevante para a sua audiência.
Se escolher uma boa agência e esta fizer uma boa campanha é provável que as suas vendas subam. Mas essa subida está dependente de muito mais coisas, tais como a sua distribuição, o poder de reação da sua concorrência e o preço dos seus produtos. Entre muitos mais factores que a sua agência não pode, nem deve, controlar.
E sabe o que irá acontecer caso opte antes por uma daquelas agências que dizem que vendem muito, mas das quais não gostou das campanhas? As pessoas vão fazer skip no YouTube, fast foward no comando da box e instalar um adblocker só para não verem mais os seus banners.
Por muito que adorasse, nós publicitários não somos milagreiros. Somos apenas profissionais que devíamos estar comprometidos com a missão de colocar o poder da criatividade ao serviço das marcas, conseguindo criar uma empatia tão forte entre os consumidores e as mesmas que os leve a preferi-las no momento da compra.
Não quero com isto dizer que as vendas não importam. Bem pelo contrário, são invariavelmente aquilo que mais importa em qualquer empresa. A única coisa que digo é que as mesmas, por norma, apenas dependem em parte da publicidade.
Se amanhã for a uma imobiliária não se preocupe, não estará lá nenhum publicitário a tentar vender-lhe uma casa. Porque o publicitário não é um vendedor. Quem disser o contrário ou vive no século passado ou simplesmente estará a camuflar a falta de talento criativo da sua agência, desviando o assunto para um tema que aparentemente se arroga de conhecer melhor.
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