Mais de sete anos depois, Oliveira e Costa conhece sentença
O antigo banqueiro é acusado de sete crimes, entre os quais burla qualificada, fraude fiscal e branqueamento de capitais. Aos 82 anos, conhece a sentença do processo principal do BPN.
A 24 de novembro de 2009, depois de um ano de investigação, o Ministério Público acusava 24 arguidos no caso Banco Português de Negócios (BPN). Passaram 2.737 dias e os 14 dos 24 arguidos que estão em julgamento conhecem, esta quarta-feira, a sentença do processo principal do BPN. Entre eles, José de Oliveira e Costa, o fundador e antigo presidente do banco que faliu em 2008, acusado de sete crimes. O Ministério Público pede 13 a 16 anos de prisão para o ex-banqueiro, hoje com 82 anos; a defesa fala em “prisão perpétua” para alguém desta idade e argumenta que os acionistas do BPN “nunca foram controlados por Oliveira e Costa”.
Pelas 10h00 desta quarta-feira, no Palácio de Justiça, em Lisboa, os 14 arguidos vão começar a ouvir as sentenças. José de Oliveira e Costa responde pelos crimes de abuso de confiança, burla qualificada, falsificação de documento, branqueamento de capitais, infidelidade, fraude fiscal qualificada e aquisição ilícita de ações. No epicentro destas acusações, o seu envolvimento no caso das offshore através das quais o BPN detinha o Banco Insular de Cabo Verde.
Para além deste processo, que é o principal do caso BPN, o antigo banqueiro está envolvido em vários outros ainda sem fim à vista, que implicam também nomes como o de Arlindo de Carvalho, antigo ministro da Saúde, ou Luís Filipe Vieira, presidente do Benfica. Ao todo, a Polícia Judiciária entregou ao Ministério Público os relatórios finais relativos a 12 inquéritos relacionados com o BPN. Já o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), segundo o Jornal de Notícias, terá aberto entre 20 e 24 inquéritos relacionados com o colapso e nacionalização do BPN.
Entre estes, e ainda de acordo com o Jornal de Notícias, há oito inquéritos que já foram encerrados: três arquivados e cinco com despacho de acusação contra 41 arguidos. Nos processos arquivados conta-se o de Dias Loureiro, ex-ministro do PSD.
Da renúncia à nacionalização em nove meses
Oliveira e Costa abandonou a presidência do grupo Sociedade Lusa de Negócios/BPN em fevereiro de 2008, invocando problemas de saúde, numa altura em que a sua liderança era colocada em causa por alguns dos acionistas. Dias depois da renúncia, o antigo banqueiro vê-se envolvido na Operação Furacão, o processo que se arrasta desde 2005 e que investiga crimes financeiros.
Em outubro de 2008, Miguel Cadilhe, antigo ministro das Finanças que entretanto tinha assumido a presidência da SLN, denunciou crimes financeiros que envolviam três quadros superiores do grupo SLN.
No centro das “irregularidades” estava a identidade do proprietário do Banco Insular de Cabo Verde, que, veio a saber-se depois, era detido pelo BPN. O banco ocultou este facto através de uma offshore de Londres, detida, por sua vez, por outras duas offshore, sedeadas em Gibraltar. Através do Banco Insular, terão sido realizadas operações de crédito num balcão virtual, nunca reportadas ao Banco de Portugal, que resultaram em perdas calculadas entre os 700 e os 800 milhões de euros. Foram estas perdas que fizeram com que o BPN deixasse de cumprir os rácios de solvabilidade exigidos pelas entidades reguladoras.
Chegados a novembro de 2008, o governo de José Sócrates anuncia que vai propor a nacionalização do BPN, depois de ter descoberto um buraco de 700 milhões de euros nas contas do banco. A nacionalização foi aprovada a 5 de novembro de 2008. No dia 20, Oliveira e Costa é constituído arguido e detido por suspeitas de burla, branqueamento de capitais e fraude fiscal.
16 anos de prisão por “ludibriar acionistas”? É “prisão perpétua”
Oliveira Costa é considerado pelo Ministério Público como o principal responsável pelos crimes, juntamente com os ex-administradores Luís Caprichoso e Francisco Sanches. No despacho de acusação emitido em 2009, o Ministério Público dizia que estes três arguidos “atuaram com o propósito de impor os seus interesses individuais de perpetuação nos cargos e de prevalência dos negócios por si idealizados, sobre os interesses das sociedades que lhes competia administrar”. Ao mesmo tempo, “conjugaram esforços no sentido de ludibriar acionistas e criar falsos cenários às entidades de supervisão de forma a fazerem impor estratégias de negócio pessoais, aceitando fazer as entidades por si administradas pagar e sofrer perdas para criar os referidos cenários e formas de engano de terceiros”.
Os administradores terão também alterado “registos contabilísticos de forma a ocultar e a justificar as suas atuações de apropriação de fundos e de obtenção de ganhos, em particular ocultando o seu benefício e a utilização de contas junto do Banco Insular e do BPN Cayman“.
"[Oliveira e Costa, Luís Caprichoso e Francisco Sanches] conjugaram esforços no sentido de ludibriar acionistas e criar falsos cenários às entidades de supervisão de forma a fazerem impor estratégias de negócio pessoais.”
O Ministério Público acusa ainda Oliveira e Costa e Luís Caprichoso de terem atuado com o objetivo de “deitarem a mão a fundos criados ou disponíveis nas instituições que geriam, apesar de saberem que não lhes pertenciam e que deviam atuar perante esses fundos como entidades autónomas”. Por fim, acusa o Ministério Público, o antigo banqueiro procurou “obter vantagens fiscais, para si e para terceiros, através da utilização de documentos que fez produzir e sem correspondência com a realidade em atos públicos e com relevância fiscal”.
Por todas estas acusações, o Ministério Público pede uma pena de prisão entre os 13 e os 16 anos para Oliveira Costa. Mas o antigo banqueiro, “obviamente, não foi o único” a cometer crimes dentro do BPN, admite o procurador Jorge Malhado. Por isso, pediu penas de prisão para 14 dos 16 arguidos. Para o “número dois” Luís Caprichoso, pede entre dez a 12 anos de prisão.
"Os acionistas que se diz terem sido controlados por Oliveira e Costa são os mesmos que o obrigaram a renunciar aos cargos no grupo em fevereiro de 2008.”
A defesa de Oliveira Costa, por seu lado, argumenta que “os acionistas nunca foram controlados por Oliveira Costa“. Nas alegações finais deste julgamento, o advogado Filipe Baptista referiu que “os acionistas acreditaram no projeto que Oliveira Costa liderava até meados de 2007” e que “o alegado controlo acionista é uma mera teoria que ficou desmascarada”. Prova disso, defende, é que “os acionistas que se diz terem sido controlados por Oliveira e Costa são os mesmos que o obrigaram a renunciar aos cargos no grupo em fevereiro de 2008”.
A defesa invoca ainda “erros grosseiros” na contabilização das perdas. Segundo Filipe Baptista, o Ministério Público terá duplicado os créditos concedidos pelo Banco Insular e as perdas terão sido, no máximo, de 550 milhões, e não de 700 a 800 milhões, como referido pela acusação.
Sobre os 13 a 16 anos de prisão que o Ministério Público, a defesa não tem dúvidas: tendo em conta a idade de Oliveira Costa, e “considerando a esperança média de vida”, este é “um pedido de prisão perpétua”, o que “não é sequer aplicável” no sistema judicial português.
Fatura do BPN já ultrapassa três mil milhões
No final de 2009, quando avançou com a acusação no caso BPN, o Ministério Público sustentava que as práticas levadas a cabo pelos 24 arguidos lesaram o Estado em 104,9 mil euros sem sede fiscal, pedindo, em representação do Estado, uma indemnização desse mesmo valor. Hoje, como se sabe, a fatura é bem mais elevada que isso.
Os dados do Tribunal de Contas relativos a 2015 apontam para que o prejuízo com as empresas herdeiras do BPN (a Parvalorem, a Parups e a Parparticipadas, que gerem os ativos tóxicos do banco falido) seja já de 3.241 mil milhões de euros. A somar a este montante estão capitais próprios negativos, destas três empresas, no valor de 2.201 milhões de euros, que também poderão ser suportados pelo Estado.
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