Alargamento do período experimental de 180 dias é para “poucas centenas de milhares” de pessoas, diz o Governo
Quando, há dez anos, chumbou o alargamento do período experimental, as questões apontadas pelo TC não se referiam ao período "em si", diz Governo. E nota que estão agora em causa grupos circunscritos.
O Governo quer aplicar o período experimental de 180 dias a trabalhadores à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração. E estes são “dois grupos específicos e quantitativamente circunscritos”, de “poucas centenas de milhares de pessoas numa população ativa de mais de 5,2 milhões”, refere fonte oficial do Ministério do Trabalho ao ECO.
A exposição de motivos da proposta de lei que altera o Código do Trabalho dá especial atenção às mudanças previstas no período experimental no âmbito de contratos sem termo. Em 2008, o Governo tentou aplicar os 180 dias à generalidade dos trabalhadores, o que significava duplicar a duração do período experimental no caso de pessoas que exercem trabalho indiferenciado, mas a medida foi travada pelo Tribunal Constitucional (TC). O ministro Vieira da Silva já tinha assinalado que a alteração agora proposta era diferente. A ideia volta a ser reiterada.
“As questões apontadas pelo Tribunal Constitucional há cerca de uma década referiam-se a uma norma de alargamento generalizado do período experimental para todos os trabalhadores para os 180 dias”, indica fonte do Ministério de Vieira da Silva. Não estava em causa o período “em si”, nota o Governo — acrescentando até que este é hoje discutido “no plano europeu” no “âmbito de uma diretiva” — mas o que os “juízes consideraram, na altura, a falta de fundamentação dessa medida”. Agora, a exposição de motivos da proposta do Governo verte um conjunto de argumentos e chega a citar o acórdão de 2008.
Alguns especialistas em direito do trabalho já apontaram para novos riscos de inconstitucionalidade com esta medida. Mas fonte do ministério de Vieira da Silva diz que o que está em causa hoje “é de natureza inteiramente diversa” face ao que se propunha há dez anos. “O que se prevê é que, para dois grupos específicos e quantitativamente circunscritos (poucas centenas de milhares de pessoas numa população ativa de mais de 5,2 milhões), o período experimental que se aplica é de 180 dias — grupos cuja especial dificuldade de entrada no mercado de emprego está há décadas reconhecida em vários instrumentos das políticas públicas, como sejam isenções de Taxa Social Única, políticas ativas de emprego, e até no próprio Código de Trabalho, com a norma que permitia a contratação a termo destas pessoas”, indica.
Aliás, a aplicação deste período experimental de 180 dias surge como contraponto ao fim da possibilidade de contratar a prazo, mas para postos permanentes, jovens à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração, mantendo-se esta norma apenas para desempregados de muito longa duração. Para o Governo, neste cenário “é mais do que razoável” utilizar o período experimental de 180 dias no âmbito de contratos sem termo. Mais: o Executivo recorda ainda que esta duração de período experimental já hoje pode ser aplicada, “a estes ou a outros trabalhadores”, dependendo das funções a desempenhar.
“No preciso momento em que se elimina esta norma, até aqui amplamente usada, é mais do que razoável e cautelar continuar a reconhecer e prevenir a desvantagem destes grupos na entrada ou reentrada no mercado de emprego, aplicando-lhes um período experimental de 180 dias nos contratos sem termo, que aliás já se aplica, a estes ou a outros trabalhadores, no caso, por exemplo, de cargos de complexidade técnica ou elevado grau de responsabilidade ou que pressuponham uma especial qualificação“, refere o ministério de Vieira da Silva.
E acrescenta: “Trata-se, no fundo, de não permitir que trabalhadores sem experiência ou em desemprego de longa duração ficassem perante o mercado de trabalho exatamente nas mesmas condições de contratação que todos os outros – o que, na verdade, os desprotegeria face aos demais, reproduzindo a desigualdade de partida que têm”. O Governo não concretizou o conceito de trabalhador à procura de primeiro emprego, mas, tal como o ECO noticiou, os especialistas em direito do trabalho notam que este conceito, atualmente, também abrange trabalhadores que tiveram apenas contratos a termo.
Para o Executivo, o que está em causa é “um imperativo de equidade”. “Acautelar que, numa altura em que se revoga uma norma, específica e (muito mais) excecional para estes públicos, eles continuem a ser defendidos no nosso ordenamento jurídico, reiterando o reconhecimento de uma condição que é objetivamente de desvantagem, em Portugal como em todos os países, e impedindo assim que possam ser (ainda mais) prejudicados na competição pelo emprego com pessoas com mais capital de experiência e perante os empregadores”. Mas esta não é uma opinião unânime.
A CGTP, único parceiro social que não assinou o acordo laboral, sublinha, em comunicado, que a medida deixa os grupos abrangidos “reféns do patronato, que os pode despedir sem fundamentação e sem qualquer tipo de compensação”. O PCP e o Bloco de Esquerda também já deixaram críticas a esta mudança. E o próprio PS — que já avisou que vai apresentar propostas de alteração às medidas do Governo e que é possível introduzir normas para evitar abusos — referiu que “existem dúvidas” sobre o período experimental.
Além desta mudança, a proposta do Governo também indica que o contrato de estágio anterior ao contrato também conta para efeitos de período experimental, à semelhança de outras relações de trabalho já previstas na lei.
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