Mutualista anuncia prejuízo histórico. Governo “está atento” mas não prevê intervenção
Desvalorização do banco dita prejuízos recorde na mutualista. O Governo vai intervir? "Acompanhamos com atenção e responsabilidade, mas não existe nada previsto neste Orçamento", disse João Leão.
As contas da Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG) conheceram finalmente a luz do dia, depois de um longo braço de ferro com o novo auditor, a PwC, que não deixou de fazer alertas sobre a situação da instituição. Os números que a mutualista acaba de apresentar ficarão para a história pelas piores razões: prejuízos recorde de 408,8 milhões de euros em 2019, que compara com o lucro magro de 1,6 milhões registado em 2018.
Esta terça-feira, questionado sobre a dimensão dos prejuízos e se o Estado vai ser chamado a intervir, o novo ministro das Finanças, João Leão, disse que o Governo está a acompanhar “com atenção e responsabilidade” o tema do Montepio, “mas não existe nada previsto” no Orçamento Suplementar.
Os prejuízos históricos devem-se sobretudo à desvalorização do Banco Montepio (-377,5 milhões) e da Montepio Seguros (-14,8 milhões) no balanço da mutualista e que foi exigida pela PwC, o que forçou a AMMG a reforçar as imparidades com as duas participadas em 392 milhões de euros, tal como o ECO já tinha avançado. No caso do banco, o principal ativo da instituição, passou a estar avaliado em 1.500 milhões de euros, em vez dos 1.870 milhões com que a instituição financeira liderada por Pedro Leitão estava registada no balanço em 2018.
Esta situação teve repercussões imediatas nos capitais próprios da instituição, que baixaram dos 753 milhões de euros para os 337,4 milhões. Foi uma “sangria”, como fez questão de notar o conselho fiscal da mutualista, lançando críticas duras ao auditor.
Por seu turno, a AMMG considera que a nova avaliação do Banco Montepio parte de uma análise muito conservadora do que é realidade do banco. E adianta que, sem o impacto destas desvalorizações, teria registado lucros de 9,3 milhões.
Com a revisão em baixa das avaliações do banco e da seguradora, o ativo da instituição encolheu 8,5%, situando-se agora nos 3.455,6 milhões de euros. É este o património de que a mutualista dispõe para fazer face às responsabilidades do passivo (onde se incluem as poupanças dos mais de 600 mil associados) de cerca de 3.118,2 milhões de euros. Mas mesmo este ativo continua sobrevalorizado aos olhos da PwC, já depois do ajustamento do valor das participadas.
Em causa estão os ativos por impostos diferidos (DTA) que a AMMG contabiliza em 833 milhões de euros no final de 2019. Como o ECO também já tinha adiantado, a PwC queria baixar o valor destes créditos fiscais por considerar que dificilmente a mutualista vai conseguir gerar lucros para recuperar “parte substancial” dos DTA. O conselho de administração liderado por Virgílio Lima fez finca-pé e manteve a sua posição. E por isso a certificação legal de contas emitido pelo auditor vem com uma reserva por desacordo com a mutualista em relação a este tema.
Segundo a PwC, estes créditos fiscais — criados ainda no tempo de Tomás Correia — “encontram-se sobreavaliados por um montante materialmente relevante, a magnitude do qual não estamos em condições de quantificar, dada a incerteza inerente às projeções dos resultados tributáveis”.
Também nesta questão o conselho fiscal foi em defesa do conselho de administração, duvidando da metodologia adotada pela PwC. Foi mesmo pedido um parecer a uma terceira auditora, que validou os critérios do anterior auditor (a KPMG) e os créditos fiscais no valor de 833 milhões.
Entre as várias críticas à PwC, o conselho fiscal da mutualista referiu que a posição da auditora “não deve ser entendida como uma espada de Dâmocles sobre a cabeça da AMMG“. E pediu “prudência” neste tema para não “ocasionar dúvidas na confiança” dos associados. É que, feitas as contas, sem os ativos por impostos diferidos de 833 milhões, os capitais próprios da AMMG seriam negativos em quase 500 milhões de euros. O que significaria que a mutualista não teria património suficiente para cobrir todas as responsabilidades.
No que diz respeito à parte operacional, a AMMG voltou a registar uma margem associativa positiva, em cerca de 27 milhões de euros, depois de ter perdido 191 milhões em 2018. Tal desempenho se deveu à captação de 664 milhões de euros de poupanças junto dos associados, que permitiu fazer face a saídas de 638 milhões.
Além disso, a maior mutualista do país voltou a perder associados em 2019: registou saídas líquidas após entradas de 10.823 associados, tendo fechado o ano passado com 601 mil associados. Nos últimos quatro anos já perdeu 30 mil associados.
As contas agora apresentadas vão ser votadas na Assembleia Geral de associados marcada para o dia 30 de junho, no Coliseu dos Recreios, em Lisboa.
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