Advogados com “cerco mais apertado” à lavagem de dinheiro. Sociedades preparadas
Branqueamento de capitais e financiamento de terrorismo eram já preocupações das firmas de advogados antes da nova lei da OA. Ainda assim, entre 2017 e 2019 apenas cinco denúncias foram feitas.
O dever dos advogados denunciarem casos suspeitos de lavagem de dinheiro não é de agora, mas com o novo regulamento da Ordem dos Advogados (OA) as firmas viram reforçados os deveres nesta matéria, como a cooperação, abstenção e identificação. À Advocatus, os escritórios de advogados garantem que já controlavam as operações suspeitas de branqueamento de capitais e financiamento de terrorismo.
Tanto na PLMJ, como na Abreu Advogados, Vieira de Almeida (VdA) e Morais Leitão, existem há vários anos advogados destacados para “fiscalizar” casos duvidosos. Ainda assim raramente os advogados denunciam casos suspeitos. Entre 2017 e 2019 apenas foram recebidas pela OA cinco denúncias.
Na firma liderada por Luís Pais Antunes e Bruno Ferreira, a PLMJ, desde 2018 que foi implementado um sistema de compliance interno que está a cargo de Nuno Castelhanito, general counsel & head of compliance. “Este advogado tem como obrigação garantir, em articulação com o conselho de administração, o cumprimento do quadro normativo vigente, e, bem assim, desempenhar o papel de interlocutor junto da OA”, refere Castelhanito.
Também a VdA possui um general counsel, desde 2017, que zela pelo cumprimento dos deveres de prevenção do branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo a que os advogados estão adstritos. “O exercício desta função tem sido, ao longo dos anos, complementado com formações específicas e com um forte investimento em sofisticadas ferramentas e recursos técnicos de apoio ao exercício da função, que continuará a desempenhar”, refere fonte oficial da firma à Advocatus.
"O regulamento só é o mecanismo mais adequado se for visto sempre em conjunto com a lei.”
“Também já antes desta regulamentação da OA, a sociedade tinha, além de um membro do seu conselho de administração diretamente responsável por estas matérias, advogados designados para as funções em causa, e até uma comissão destinada a acompanhar estas matérias na sociedade e junto de cada advogado. O que o regulamento da Ordem estipula já estava pois em aplicação na sociedade, desde há algum tempo”, nota Rui Patrício, sócio da Morais Leitão.
Mas apesar de desde cedo existir a preocupação, no âmbito destas matérias, por parte das firmas, a verdade é que as denúncias feitas à OA têm sido muito poucas. À Advocatus, o bastonário dos advogados explicou que no mandato anterior, de Guilherme Figueiredo entre 2017 e 2019, apenas foram recebidas cerca de cinco denúncias. Ainda assim, “nos primeiros seis meses deste mandato já ultrapassámos esse número”, referiu o líder dos cercas de 32 mil advogados.
O novo regulamento da OA veio facilitar o cumprimento das obrigações legais por parte dos advogados que decorriam da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto – lei de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. A partir do dia 11 de setembro, os advogados tem de passar a comunicar as operações que considerem suspeitas ao bastonário, que posteriormente reporta a situação ao Departamento Central de Investigação e Ação Penal e à Unidade de Informação Financeira da Polícia Judiciária
Entre as operações suscetíveis de denúncia por parte dos advogados estão as de compra e venda de imóveis, gestão de fundos e valores mobiliários, abertura e gestão de contas bancárias, ou até as de criação, constituição, exploração ou gestão de empresas.
Devido à carteira de clientes internacionais, Duarte de Athayde, managing partner da Abreu Advogados, assegura que a preocupação de controlo de segurança existe na firma há vários anos. “Ao responsável pela monitorização da conformidade cabem as tarefas de articulação interna entre os vários departamentos e as entidades competentes, num trabalho de diagnóstico, observação, preparação e implementação de medidas concretas de prevenção do risco”, conta.
Para as firmas, a nova regulamentação é “fundamental” para que sejam assegurados os deveres dos profissionais. “O regulamento só é o mecanismo mais adequado se for visto sempre em conjunto com a lei, mas tem a vantagem de clarificar e atribuir segurança e certeza jurídicas ao papel que o advogado deve desempenhar enquanto entidade obrigada ao cumprimento de certos deveres jurídicos em matéria de prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo”, explica o general counsel & head of compliance da PLMJ.
Uma linha ténue com o dever de sigilo
Ainda assim, existe uma linha ténue que separa este dever de denúncia do dever de sigilo profissional a que os advogados estão sujeitos. O managing partner da Abreu Advogados espera que a aplicação destas medidas não “destrua o segredo profissional”, pois considera ser um “princípio essencial no qual assenta a relação de confiança que tem de existir entre cliente e advogado”.
“De acordo com o regulamento, o regime do segredo profissional funciona apenas como delimitador, pelo que o dever de manutenção do sigilo profissional cessa quando se verificarem algumas das situações nele taxativamente previstas. Contudo, o advogado mantém-se obrigado ao dever de sigilo relativamente a diversas atividades, nomeadamente no âmbito do patrocínio forense”, refere Duarte de Athayde.
Mas para Nuno Castelhanito, o regulamento vem reforçar o dever de sigilo profissional na relação dos advogados com os seus clientes. “Prevendo e limitando expressamente o âmbito de atuação que fica excluído do cumprimento de certos deveres em matéria de prevenção e combate ao branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo”, acrescenta o general counsel & head of compliance da PLMJ.
"O regime do segredo profissional funciona apenas como delimitador, pelo que o dever de manutenção do sigilo profissional cessa quando se verificarem algumas das situações nele taxativamente previstas.”
Face à complexidade e densidade das matérias em causa, as sociedades de advogados preveem que venham ainda a existir novos mecanismos de forma a permitir reforçar as medidas de prevenção. “A dinâmica dos negócios, da sua forma de concretização e a evolução acelerada da tecnologia têm ditado, e continuarão a ditar, a necessidade de evolução das normas no sentido de se adaptarem às novas realidades”, refere fonte oficial da VdA.
“Infelizmente, a criminalidade organizada apresenta-se cada vez mais sofisticada e inventiva pelo que as formas e técnicas utilizadas para o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo são, também elas, cada vez mais sofisticadas e de difícil deteção”, nota o advogado da PLMJ.
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