Parecer da APA desaconselhou venda das barragens da EDP em julho de 2020
O documento da APA datado de julho de 2020 pedia "um parecer jurídico que avalie se fica garantido o interesse público com a transmissão de cada uma destas concessões".
Um parecer interno da Agência Portuguesa do Ambiente, referido esta terça-feira pela deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua no Parlamento e datado de 30 julho de 2020, concluiu que “não estavam reunidas as condições para autorizar as transmissões dos aproveitamentos hídricos de Foz Tua e Baixo Sabor face ao estado de implementação das medidas ambientais, sendo que os três do Douro Internacional estão associados a processos judiciais [a nível nacional e comunitário] em curso face ao valor definido para o equilíbrio económico e financeiro [78,1 milhões atribuídos em 2007, face aos 1,7 mil milhões definidos mais recentemente] na sequência da prorrogação dos prazos”.
E rematava: “Propõe-se que seja solicitado um parecer jurídico que avalie se fica garantido o interesse público com a transmissão de cada uma destas concessões”.
Uma conclusão que, na opinião da líder bloquista, prova que o Governo devia ter travado a venda das seis barragens do Douro à francesa Engie, que acabou por se concretizar em dezembro de 2020 com luz verde da APA e da REN.
Em resposta, o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes, voltou a dizer que o Governo não impediu o negócio porque não quis e que “teria caído o carmo e a trindade” se o Estado exercesse o seu direito de preferência e desembolsasse à cabeça 2,2 mil milhões de euros para comprar as barragens.
Sobre o parecer, garantiu que se trata apenas de um “documento intermédio” e que a Agência Portuguesa do Ambiente “fez o que diz a lei num processo complexo [de venda de seis barragens da EDP à Engie] que demorou 11 meses a ser concluído e que originou muita discussão interna”.
“O que encontra nessa discussão interna, que cita, também encontra nas cartas escritas pela APA à EDP, enviadas ao Parlamento”, disse o governante, defendendo que este mesmo parecer foi fundamental para que os entraves encontrados fossem ultrapassados e se conseguisse chegar a uma aprovação final dada pela Agência Portuguesa do Ambiente que permitiu que o negócio avançasse e as barragens passassem para as mãos da elétrica francesa.
Matos Fernandes garantiu que ao longo do processo a APA impôs na sua análise um reforço das garantias ambientais, técnicas e da capacidade financeira do comprador das barragens.
O parecer da APA, a que o ECO teve acesso, considera que “o potencial adquirente do título possui as habilitações, capacidade técnica e financeira, que seriam exigidas num procedimento concursal de atribuição de uma concessão desta natureza”, mas “desconhece o modo operandos em Portugal e a legislação nacional”.
“Estranha-se que face ao interesse agora manifestado que [a Engie] não tenha concorrido em 2008 aos concursos internacionais, estando ciente que passando o período inicial em que vai manter alguns contratos com a EDP, que vai recorrer às várias empresas associadas à Engie, todas sediadas em França, reduzindo assim as valência locais”, escreve a APA no mesmo parecer.
E frisou ainda: “Os aproveitamentos hidroelétricos representam muito mais do que um simples negócio de energia, nomeadamente quando estão em causa as grandes hídricas”.
Matos Fernandes voltou ainda a sublinhar que “não cabe ao ministério do Ambiente a cobrança de impostos” e que “a existência do pagamento de imposto de selo caberá, a seu tempo, a quem o sabe decidir: à Autoridade Tributária”.
Quanto aos recentes ataques do líder do PSD, Rui Rio, à sua atuação no processo de venda das barragens da EDP, o ministro acusou mais uma vez a oposição de “mentir aos transmontanos” e de lhes prometer impostos indevidos, tendo depois feito uma “judicialização da política” com uma denúncia à PGR quando isso não se verificou.
Sobre o memorando do Movimento Terras de Miranda, que recebeu a avisar que o negócio da venda das barragens poderia constituir-se como uma estratégia de planeamento fiscal agressivo, Matos Fernandes, acusou os autores desse mesmo memorando de exigir uma “mudança da lei à medida do negócio, que recusei”. Classificando este movimento como um “grupo de interesses”, disse ainda que o mesmo apenas zela pelos interesses próprios, “propondo alterações legislativas a seu próprio favor”.
O ministro anunciou que nas próximas semanas vão ser apresentados pelo Governo novos projetos de investimento para a região onde estão inseridas as barragens do Douro. Concluiu anunciando que o grupo de trabalho criado pelo Governo para as barragens do Douro deverá apresentar as suas conclusões até ao final de abril, com cerca de 200 projetos que serão tornados públicos e implementados pelas autarquias, nos quais a EDP e a Engie serão parceiros.
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