Estrelas, o 760 e a Impresa entre os riscos da dívida da SIC
A SIC está de volta ao mercado, procurando financiar-se em 30 milhões de euros em títulos de dívida. Oferecem uma taxa avultada, mas têm riscos. E são vários, desde as estrelas até à Impresa.
Sem Cristina Ferreira, a SIC usa as caras conhecidas do entretenimento para lançar uma nova operação de financiamento junto dos pequenos investidores. João Baião, Júlia Pinheiro ou César Mourão são algumas das estrelas a que a estação de Paço de Arcos quer que os aforradores se juntem através do investimento em títulos de dívida que não têm capital garantido. São o isco para atrair investidores, mas também são elas próprias identificadas como riscos para quem deposita poupanças nestas obrigações. E há mais.
Em 2019, na estreia da SIC nos mercados de capitais, a estação da Impresa apostou forte nas estrelas para chamar à atenção dos investidores para os títulos que colocou à venda. E Cristina Ferreira, que à data se tinha mudado da TVI para Laveiras, foi uma grande ajuda para captar os 30 milhões de euros de financiamento. Foi uma das quatro caras que a SIC usou com este fim. Agora, e com a apresentadora de volta a Queluz de Baixo, a SIC aumentou o rol de personalidades com que vai promover os títulos.
"À semelhança do que já se verificou anteriormente (inclusivamente, no passado recente), em que colaboradores-chave e personalidades do entretenimento e da área informação não foram retidos pelo emitente, não existe garantia de que a SIC consiga, a todo o tempo, atrair e reter todos esses colaboradores-chave e personalidades.”
Além de Baião, Mourão e Júlia Pinheiro, conta ainda com José Figueiras, Carolina Loureiro e Cláudia Vieira nos cartazes em que promove os títulos que oferecem uma taxa bruta anual de 3,95% ao ano, durante quatro anos. E nestes quatro anos estarão estas caras todas na SIC? Cristina “vendeu” as primeiras obrigações, mas já saiu. E a saída de uma destas caras deve ser tida em conta por quem investe nestes títulos destinados a pequenos investidores, mas que não têm capital garantido. Não são depósitos.
Esse mesmo alerta é feito pela própria estação no prospeto enviado à CMVM. Nos “riscos inerentes à retenção de talentos”, a SIC é explícita no impacto que podem ter saídas da estação, como aconteceu com Cristina Ferreira. E até recorda esse episódio. “À semelhança do que já se verificou anteriormente (inclusivamente, no passado recente), em que colaboradores-chave e personalidades do entretenimento e da área informação não foram retidos pelo emitente, não existe garantia de que a SIC consiga, a todo o tempo, atrair e reter todos esses colaboradores-chave e personalidades”, diz, alertando para “um impacto negativo nos negócios do emitente ou nos resultados das suas atividades”.
E as chamadas de valor acrescentado
A SIC recorre a atores e atrizes, mas também a apresentadores e apresentadoras que todos os dias entram na casa dos portugueses. Muitos deles são garante de receitas para a estação pelas audiências que geram, que trazem consigo a publicidade, mas também outras. Há muito que todas as televisões recorrem a concursos em que sorteiam milhares de euros (em cartão) ou carros, bastando para se habilitar uma chamada para um número de valor acrescentado.
"O recurso à gama de numeração 760, no âmbito de concursos e passatempos televisivos, tem um impacto significativo nos resultados do emitente, já que correspondem à terceira maior fonte de receitas.”
A televisão da Impresa alerta os investidores para o risco dessa fonte de receitas poder vir a ficar comprometida. Além das receitas de publicidade poderem ser afetadas por “um enfraquecimento substancial das condições económicas”, alerta que a crise atual pode fazer aumentar o desemprego e, neste sentido, ditar uma “redução da procura de assinaturas de canais de televisão e de serviços conexos, bem como uma quebra nas participações nos concursos televisivos e iniciativas com participação telefónica geradoras de receitas”.
Mas não é só a economia que é uma ameaça aos 760. A regulação também. A SIC diz que “o recurso à gama de numeração 760, no âmbito de concursos e passatempos televisivos, tem um impacto significativo nos resultados do emitente, já que correspondem à terceira maior fonte de receitas”. Cresceram 43,7% para 16,2 milhões de euros em 2020.
“Um enfraquecimento substancial das condições económicas que tenha qualquer das consequências acima descritas, ou uma combinação das mesmas, bem como qualquer alteração das regras atualmente aplicáveis, poderá ter um impacto adverso nos negócios do emitente e oferente ou nos resultados das suas atividades“, alerta a SIC.
Passivo maior que o ativo
A quebra das receitas, mas também o facto de operar num mercado muito concorrencial são fatores que merecem atenção na hora de investir, sendo destacado entre os riscos destes títulos de dívida. E a concorrência é tanto com outros canais como com os serviços de video on demand, nomeadamente a Netflix, pese embora a Impresa tenha lançado recentemente a Opto.
Há muitos outros riscos identificados no prospeto da emissão de obrigações, que arranca dia 24 (até 7 de junho), num total de mais de 30 páginas, sendo os que ameaçam as receitas os principais. Mas há outro que não é diretamente da SIC, mas sim do seu acionista único, a Impresa, que deve ser tido em conta já que é uma ameaça de relevo à capacidade de reembolso do investimento que será feito por muitos pequenos investidores. O passivo é maior que o ativo.
“Por referência a 31 de dezembro de 2020, o ativo corrente consolidado do emitente e oferente correspondia a 62.957.724 euros, enquanto o passivo corrente consolidado ascendia a 73.706.850 euros. Em 31 de dezembro de 2020, o passivo corrente consolidado do emitente e oferente é superior ao ativo corrente consolidado em 10.749.126 euros“, diz o prospeto, sendo este cenário explicado com “a particularidade do ciclo financeiro de exploração das empresas do setor de media, em virtude de o prazo médio dos recebimentos ser substancialmente inferior ao prazo médio dos pagamentos”.
Ainda assim: “a existência de um passivo corrente consolidado superior ao ativo corrente consolidado tem consequências adversas no que respeita à liquidez financeira do acionista único, na medida em que poderá não dispor da liquidez necessária para fazer face aos seus compromissos de curto prazo”, salienta a SIC.
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