Empresários entregam “programa de governo” ao novo ministro da Economia
Empresários esperam que António Costa Silva seja “o advogado das empresas” nas reuniões do Conselho de Ministros e mostram ao ECO o caderno de encargos para o sucessor de Siza Vieira na Horta Seca.
Os empresários e gestores portugueses não poupam elogios a Pedro Siza Vieira na hora da saída, mas estão confiantes para o início do mandato de António Costa Silva, ex-gestor da Partex, que aos 70 anos chega a ministro da Economia. Do financiamento da inovação à atração de recursos humanos, passando pela fiscalidade e pela desburocratização da máquina do Estado, confira as prioridades definidas pelos líderes empresariais ouvidos pelo ECO.
Conhecido por “senhor PRR” (Plano de Recuperação e Resiliência), dado ter sido ele a definir a visão estratégica deste documento, Costa Silva ganhou protagonismo no início da pandemia pela mão do primeiro-ministro, que viria a nomeá-lo presidente da comissão de acompanhamento desse programa. A partir desta tarde, já empossado por Marcelo, será de dentro do Executivo que poderá ajudar a executar a “bazuca” e outras políticas que defendeu na praça pública nos últimos anos.
“Não vai ter uma tarefa fácil a substituir Pedro Siza Vieira, que tinha uma ligação grande com as empresas, uma visão para a economia em geral e era um dos valores acrescentados do governo anterior”, reconhece Carlos Ribas, responsável da Bosch em Portugal, aconselhando o novo governante a “olhar fortemente para a área da investigação e desenvolvimento” (I&D), para que Portugal seja “um país de conhecimento, inovador e que traz soluções para o mundo”, sobretudo no setor industrial e das tecnologias.
Em declarações ao ECO, o engenheiro que lidera as operações portuguesas da multinacional alemã e que tem projetos de inovação no Minho ou com a academia do Porto na condução autónoma defende que o novo ministro continue a “fomentar as parcerias entre as universidades e as empresas”, intervindo ao nível do financiamento, mas também da auditoria e controlo, com o envolvimento da AICEP, da Agência de Inovação (ANI) e do próprio Ministério.
Outro ponto relevante apontado por Carlos Ribas é a celeridade na aprovação dos contratos e dos projetos. “Por norma, esses processos de validação são demorados. E têm de ser muito mais célere porque a inovação é o momento. Algo que hoje é um processo ou produto inovador, se demorar um ano na aprovação, [no final desse prazo] outros já o terão posto no mercado”, contextualiza o porta-voz da Bosch, que tem fábricas em Braga, Ovar e Aveiro.
Já para o CEO e cofundador da Critical Manufacturing, a escolha de António Costa Silva é “o corolário lógico de ter sido o pai do Plano de Recuperação e Resiliência”, embora assinale que “não deixa de ser curioso o facto de ter um reconhecido conhecimento sobre o setor energético, mas não contar com a pasta da Energia neste Ministério”.
O novo membro do Governo “terá de provar que foram infundadas as críticas” ao PRR por ser “demasiadamente orientado para o setor público” e também, insiste Francisco Almada Lobo, que “há outras ideias para a economia, além do investimento público, e que passem por dotar o país de condições para que as suas empresas sejam competitivas nos mercados globais, atuando nas áreas de simplificação burocrática, competitividade fiscal e laboral”.
Terá de provar que há outras ideias para a economia, além do investimento público, e que passem por (…) atuar nas áreas de simplificação burocrática, competitividade fiscal e laboral.
Por outro lado, o desejo dos industriais da metalurgia e metalomecânica, os mais exportadores da economia nacional, é que Costa Silva “venha a ser um advogado das empresas no seio do conselho de ministros, capaz de enfrentar com sucesso não só os habituais bloqueios do Ministério das Finanças, como também as reservas e desconfianças que uma parte da máquina do Estado persiste votar à atividade privada”.
Às prioridades no “curtíssimo prazo” do lay-off simplificado e dos apoios diretos às empresas para enfrentarem os aumentos de preço na energia e nas matérias-primas, Rafael Campos Pereira, vice-presidente executivo da AIMMAP, soma medidas para a legislatura como a “aposta estrutural nas tecnologias de produção e de informação como base estruturante da economia” ou a “assunção da liderança do processo de requalificação dos portugueses”.
O ministro tem de perceber o drama que é hoje para uma empresa portuguesa contratar e atrair pessoas, agilizando processos e a identificação de cidadãos estrangeiros que possam aqui fixar-se e colmatar essa falha.
Também Ricardo Costa, presidente da Associação Empresarial do Minho (AEMinho), pede ao novo ministro para intervir na política energética com “medidas concretas que impliquem uma redução efetiva dos custos e não com medidas compensatórias ou de mecanismos financeiros”. Mas igualmente ao nível da atração de talento, percebendo o “drama” das empresas nacionais na contratação e atuando em duas dimensões imediatas.
A primeira tem a ver com a escassez, “agilizando processos e identificação de cidadãos estrangeiros que possam aqui fixar-se e colmatar essa falha”, assim como enquadrar melhor a formação com a oferta do mercado de trabalho. “Ao mesmo tempo é fundamental perceber o custo do trabalho em termos de carga fiscal e entendê-lo como um fator de subdesenvolvimento, pela disparidade entre os custos de trabalho para as empresas e os valores que depois os trabalhadores efetivamente recebem”, completa o também CEO do Grupo Bernardo da Costa.
De Braga para Estarreja, Miguel Carvalho repete o foco na formação profissional e nas escolas técnicas, com o administrador da centenária Adico, a mais antiga empresa de mobiliário metálico do país, a sustentar que a solução pode passar pelo “conceito das empresas/escolas com a defesa e promoção do conhecimento das profissões de serralharia, torneiros, carpinteiros, pintores, entre muitas outras, sustentado nas práticas quotidianas das empresas”.
O líder da histórica empresa fundada por Adelino Dias Costa, que exporta 30% da produção para países como França, Espanha, Malta, Bélgica, Itália, Japão, Coreia do Sul e EUA, quer que os apoios do PRR cheguem “mais diretamente às empresas e não com a visão de associativismo” e sublinha que a carga fiscal “continua a inibir o empreendedorismo e o investimento”, apontando o dedo às taxas “altamente penalizadoras” no IVA, IRS e Segurança Social.
A partir de Baião, onde está sediada a Vialsil, Paulo Portela faz questão de começar por agradecer a Pedro Siza Vieira pela “dedicação que teve com as empresas”, pedindo ao sucessor que não se esqueça das PME. “Sejam do litoral ou do interior, todas são importantes, fundamentalmente as que pagam impostos, criam riqueza e postos de trabalho”, acrescenta. O administrador desta empresa especializada na área das vias de comunicação, que fornece estruturas metálicas, barreiras acústicas, painéis de sinalização ou rails de segurança, sugere que Costa Silva “trabalhe com as empresas para que consigam, bem lideradas, seguir em frente e ultrapassar as dificuldades”.
“A questão do IVA de caixa seria importante para a tesouraria das empresas e é algo de que já se fala há muitos anos. E a agilização dos processos de aprovação dos projetos ligados ao PRR, bem como o acesso a informação sobre os mesmos”, prioriza Pedro Araújo. O CEO da Brandit, uma agência digital de Barcelos que emprega 16 pessoas e fatura perto de um milhão de euros, salienta, por outro lado, o facto de o Ministério englobar também a pasta do mar, para onde foi recrutado o ex-autarca de Viana do Castelo, “devido à dimensão e sentido de expansão” da Zona Económica Exclusiva (ZEE) de Portugal.
Mais indústria, menos taxas e papel
O aumento exponencial dos preços da energia que “vão trazer-nos limitações a curto e médio prazo na produção” e a subida dos custos e a escassez de materiais para a embalagem dos vinhos, desde as garrafas ao papel, é uma preocupação do diretor-geral da alentejana Herdade do Rocim, alargada a todos os empresários. De resto, quanto ao nome de Costa Silva, Pedro Ribeiro apresenta-o como “um empresário com larga experiência, [que] por isso está consciente que a saúde económica do país passa pela saúde das empresas”.
Já o apelo da Associação Empresarial de Portugal (AEP) vai para a formação de uma espécie de “task force interministerial” para corrigir debilidades estruturais e eliminar custos de contexto. Sendo que na lista de afazeres do novo ministro deve estar “a valorização da indústria (…), pelo elevado potencial de inovação e de efeito de arrastamento em vários setores, a montante e a jusante”. “A prioridade deverá ser a reindustrialização. O caminho deverá passar pela criação de condições que tornem efetivamente as empresas portuguesas competitivas”, concorda Óscar Neto, presidente do Grupo MSTN.
Gualter Morgado, diretor executivo da Associação Portuguesa das Indústrias de Mobiliário e Afins (APIMA), reconheceu à Lusa que “quem entra para o Ministério da Economia numa fase destas vai ter uma tarefa hercúlea”. “Porque as empresas vão precisar, acima de tudo, de quem as ajude a agilizar e a retirar dificuldades burocráticas, a anular processos, a agilizar procedimentos e a eliminar os custos de contexto são gerados pela burocracia, para que as coisas possam fluir de uma forma muito mais rápida”, sustenta o dirigente associativo.
A reforma fiscal é fundamental para permitir às empresas investirem de forma adequada, não entregando ao Estado dinheiro ganho pelos contribuintes e que o Governo esbanja em investimentos sem interesse.
“Acreditamos que a nomeação de António Costa Silva, enquanto nome escolhido para assumir a pasta do Ministério da Economia, está alinhada com o pensamento de elevação e apoio da economia do país, sobretudo depois do contexto exigente que vivemos nos últimos anos. Que a sua experiência e competência, outrora relevada no papel fundamental que desempenhou no desenvolvimento do PRR, permita que todos cresçam de forma mais sustentada possível, sobretudo as empresas que são 100% portuguesas”, diz Celso Lascasas, fundador da empresa de mobiliário Laskasas, sediada em Paredes.
Menos confiante está Luís Aranha, CEO da Mike Davis, que na semana passada ouviu “com alguma tristeza, mas sem surpresa os nomes dos ministros da Economia e das Finanças”. O empresário do ramo do vestuário entende que a reforma fiscal é o elemento fundamental para “dar uma vida nova à economia, melhorando o rendimento da classe média e permitindo às empresas investirem de forma adequada, não entregando ao Estado dinheiro ganho pelos contribuintes e que o Governo esbanja em investimentos sem interesse”.
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