Governo anuncia ‘super equipa’ de juízes para agilizar justiça fiscal e administrativa
A ministra da Justiça deixou o alerta: o Mecanismo Nacional Anticorrupção previne, a PJ e o MP investigam e os tribunais aplicam as normas, mas cabe ao Estado "reforçar a recuperação de ativos".
A ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, referiu na abertura do ano judicial que a prevenção e combate à corrupção têm sido uma das “prioridades do Governo”, sendo o Mecanismo Nacional Contra a Corrupção (MNCC) exemplo disso. “A prevenção e a eliminação da corrupção é um desígnio que a todos nos move”, disse.
“Assumimos, em maio de 2022, o compromisso de tudo fazer no sentido de garantir a entrada em funcionamento, não apenas em termos normativos, mas também em termos objetivos, deste Mecanismo (MNCC). Cumprimos. Em pouco mais de 6 meses, estava regulada a sua instalação, indicado o Presidente, estavam constituídos os seus órgãos. Estava também criado o mapa de pessoal dirigente e o mapa de pessoal de apoio técnico e administrativo, que conta com quase três dezenas de elementos; e foram concluídas as obras de adaptação das instalações que acolhem esta entidade. Cumprimos”, salientou.
Este mecanismo tem como principal objetivo desenvolver atividades no domínio da prevenção da corrupção e infrações conexas e conta com cerca de 2,1 milhões de euros de dotação orçamental.
Catarina Sarmento e Castro recordou a Convenção contra a Corrupção, em que Portugal está vinculado com três pilares: a prevenção, a investigação/repressão e a recuperação de ativos.
Sobre a investigação à corrupção, a ministra disse que têm aumentado os meios de combate e sublinhou que a importância da Portaria que aprovou o programa de recrutamento da Polícia Judiciária para o quinquénio de 2022 a 2026. Ao todo, serão 1.100 novos profissionais: 750 efetivos na carreira de inspeção e investigação criminal, 250 na carreira de especialista de polícia científica, e mais de 100 na carreira especial de segurança.
“E se, a esta conquista, somarmos a modernização tecnológica e o desenvolvimento dos sistemas de informação e comunicação da PJ a que se vem procedendo, fica bem evidente o empenho que temos posto no reforço da resposta pericial”, considerou.
Ainda assim, deixou o alerta: o “Mecanismo Nacional Anticorrupção previne, a Polícia Judiciária e o Ministério Público investigam e os tribunais aplicam as normas –, mas o cumprimento cabal das obrigações do Estado português, nesta matéria, implica ir mais além e reforçar a recuperação de ativos”.
Dos Tribunais Administrativos à transparência
A ministra da Justiça relembrou também que um dos compromissos é otimizar a eficiência dos tribunais administrativos e fiscais, dando resposta aos legítimos anseios de cidadãos e empresas e reforçando a confiança nesta jurisdição, é um dos seus compromissos.
Desta forma, explicou o Plano Estratégico para os Tribunais Administrativos e Fiscais, que se estrutura em torno de cinco objetivos essenciais: melhoria da gestão judiciária – dotando de meios esta jurisdição em termos de capacidade de autogestão e organização -; a otimização do desempenho nos tribunais superiores – onde se verificam atualmente as maiores pendências -, e a implementação da assessoria técnica para os juízes dos tribunais administrativos e fiscais; simplificação e agilização processual; a transformação digital; e o reforço dos recursos humanos.
“Neste início do ano de 2023, estamos a trabalhar para a aprovação do “primeiro pacote” legislativo da Reforma da Justiça Administrativa”, anunciou. Entre os diplomas está um que dotará o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais dos meios necessários a uma “gestão mais eficiente, mais célere e mais transparente” da jurisdição administrativa e fiscal.
Outro dos diplomas irá introduzir algumas alterações ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Aqui prevê-se a especialização na segunda instância e o regime da criação de equipas de juízes pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, especializadas e pontuais, ou de recuperação de pendências.
Por fim, existe um diploma ainda que vai criar um mecanismo de incentivo à extinção da instância por negócio processual e um outro que cria uma “forma de processo simplificada, que será aplicada, a título experimental, num tribunal piloto, para ações de valor inferior a 5.000 euros e de baixa complexidade, tendo como objetivos fundamentais, designadamente, que as respetivas decisões de mérito sejam proferidas em menos de 9 meses e que sejam de fácil compreensão pelos cidadãos”.
“A transparência na arbitragem administrativa é também um dos desígnios essenciais ao correto funcionamento da justiça sendo, além de um imperativo constitucional, uma das formas de eliminar suspeitas de permeabilidade destes meios à secundarização do interesse público”, acrescentou.
A ministra da Justiça anunciou também que será constituído um grupo de trabalho que terá como missão reforçar as obrigações de publicidade, com especial enfoque na arbitragem ad hoc, o que passará pelo reforço das prerrogativas do Ministério Público quanto ao acompanhamento destes processos.
“A coberto do tema da transparência, permitam que aproveite para serenar algum ruído que se tem gerado em torno da questão da distribuição eletrónica dos processos. A avaliação da oportunidade, pelo Governo, de revisitar algumas soluções vertidas na lei, em nada prejudica, antes acentua, a necessária transparência que se pretendeu instituir e na qual o atual Governo efetivamente se revê, razão pela qual estamos absolutamente empenhados na implementação de mecanismos de controlo reforçados, essenciais para a promoção da transparência e da credibilidade do sistema de justiça”, sublinhou.
Mudanças futuras
Catarina Sarmento e Castro relembrou que contam com o orçamento inicial do Ministério da Justiça mais elevado de sempre e no qual não deixa de ver um reconhecimento da importância da Justiça por parte do Governo.
“E sabemos que contamos com uma dotação de cerca de 267 milhões de euros no Plano de Recuperação e Resiliência, no qual não deixaremos de reconhecer uma oportunidade histórica, que estamos determinados a aproveitar, de alavancar financeiramente a transformação da Justiça, a que associamos uma agenda ambiciosa de reformas e projetos inovadores a desenvolver ao longo da Legislatura”, sublinhou.
Sobre o funcionamento dos tribunais, a ministra referiu que todo o trabalho efetuado, “alicerçado na modernização”, tem reduzido o número de pendências. A duração média dos processos findos tem também vindo a diminuir em todas as áreas.
No que toca as alterações legislativas, Catarina Sarmento e Castro explicou que estão a ponderar ajustamentos ao mapa judiciário. “Pensaremos a Justiça também no quadro das exigências com que nos interpela a coesão territorial, e, por isso, trabalhamos, já, no sentido da criação de uma nova centralidade judiciária no interior do país, incluindo a criação de um novo Tribunal Central Administrativo do Centro”, avançou.
Alterações ao Código Penal foram também anunciadas, com a novidade que o combate ao discurso do ódio será materializado com uma alteração legislativa que cumpre recomendações internacionais sobre a matéria.
“A resposta judicial para as demandas da criminalidade resultará, naturalmente, mais assertiva e em linha com as orientações internacionais em matéria de privação da liberdade, que apontam para um duplo comando: privar menos pessoas de liberdade, e por menos tempo – princípio de ultima ratio em plena consonância, de resto, com a orientação constitucional”, disse.
Catarina Sarmento e Castro recordou todas as mudanças que foram feitas em 2022 na área do edificado. Referiu ainda que estão a concluir o projeto de Plano Plurianual de Investimentos, para o período 2023-2027, para construção, requalificação e modernização das infraestruturas da justiça, designadamente, instalações de tribunais.
“Com este plano, será possível concretizar intervenções em múltiplas instalações dispersas por todo o território nacional e resolver situações prementes, há muitos anos sinalizadas”, disse.
Em curso está a empreitada de construção do novo Tribunal de Beja, no valor de 6,9 milhões de euros, bem como a instalação dos Juízos do Trabalho e Local Cível em Torres Vedras, no montante de 1,3 milhões. Também estão a ser feitas melhorias das condições do Juízo de Família e Menores de Aveiro e na Cadeia de Apoio da Horta, nos Açores.
“O ano de 2022 ficará também marcado como o ano em que foi aprovada, em Conselho de Ministros, a Estratégia para o encerramento gradual do Estabelecimento Prisional de Lisboa. Este não é apenas mais um plano de intenções: o Ministério da Justiça foi autorizado a realizar um investimento de 24 Milhões de euros no parque penitenciário, com vista ao encerramento gradual daquele estabelecimento prisional”, notou.
A ministra recordou o Plano de Recuperação e Resiliência que deu oportunidade para fazer melhorias na Justiça. “Dos 158 milhões de euros nele inscritos para a modernização dos sistemas dos tribunais, 24 milhões foram já contratualizados em investimentos que incluem o robustecimento da infraestrutura”, recordou.
“Ainda no contexto do PRR, e para o reforço de equipas tecnológicas e para o desenvolvimento de novos sistemas, avançámos já com a contratualização de investimentos no valor de 10 milhões de euros“, acrescentou.
Em fase piloto está o MPCODEX. Segundo explicou a ministra, este sistema permitirá a comunicação entre o sistema de informação utilizado pelos magistrados do Ministério Público na fase de inquérito dos processos e o sistema de informação dos tribunais judiciais e facilitará a consulta de processos pelos próprios magistrados com funcionalidades melhoradas.
Também o MAGISTRATUS vai ser dotado, já no primeiro trimestre do ano, de funcionalidades que vão simplificar a consulta do histórico processual pelos magistrados judiciais e o acesso aos conteúdos multimédia.
Já na jurisdição Administrativa e Fiscal está prevista a implementação de várias medidas de simplificação e agilização, como a interoperabilidade entre os sistemas de informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais e da Autoridade Tributária, para efeitos de citação eletrónica da Autoridade Tributária.
“Para muito breve está também a disponibilização, pela primeira vez, do acesso ao CITIUS pelo Tribunal Constitucional, há muitos anos desejado“, anunciou. Ainda assim, recorda que a modernização não resolverá todos os problemas da Justiça mas considera que é indispensável aumentar a “eficiência e a transparência do sistema”.
Sobre os recursos humanos, Catarina Sarmento e Castro salienta que o Ministério da Justiça está consciente da sua importância e da urgência com que, em alguns casos, a falta de recursos humanos se faz sentir.
“Temos estado a trabalhar, muito empenhadamente, em soluções que possam assegurar, no imediato, carências mais prementes, mas, muito especialmente, em soluções que possam responder, de forma sustentada e planificada, de acordo com princípios de previsibilidade, não só às demandas do presente, mas também às do futuro”, garantiu.
A ministra recordou que num Estado de Direito democrático “não há Justiça se esta não for verdadeiramente acessível a todos, pelo que a nossa ação sempre terá de ser orientada pela garantia de que todos os cidadãos tenham acesso ao direito e aos tribunais, sem esquecer aqueles que não têm possibilidades económicas, para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos”.
A abertura do ano judicial realizou-se no Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa, e contou com as intervenções do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, da ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, do presidente do STJ, Henrique Araújo, da procuradora-geral da República, Lucília Gago, e da bastonária da Ordem dos Advogados, Fernanda de Almeida Pinheiro.
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