Simplex do licenciamento de obras entra em vigor a 4 de março

  • Ana Petronilho
  • 8 Janeiro 2024

Diploma põe fim aos licenciamentos para obras que subam pisos dos edifícios sem alterações de fachada, por exemplo, e dita o fim obrigatório de bidés em casas de banho.

A grande maioria das 26 medidas que vêm alterar as regras no licenciamento de obras e na reclassificação dos solos vão entrar em vigor a 4 de março deste ano, mas algumas já têm efeitos desde 1 de janeiro, de acordo com o diploma publicado esta segunda-feira em Diário da República.

No que toca a licenciamentos, o novo decreto-lei elimina a “necessidade de obter licenças urbanísticas, criando-se, para o efeito, novos casos de comunicação prévia, de isenção e de dispensa de controlo prévio”. Desta forma, ficam isentas de licenciamento as obras “que aumentam o número de pisos”, desde que não alterem a fachada dos edifícios; ou as construções “em área com operação de loteamento, plano de pormenor ou unidade de execução com desenho urbano”.

De acordo com o diploma, o regime da comunicação prévia “era pouco utilizado por receios dos interessados”, por causa de “um conjunto de circunstâncias variadas que os incentivavam a utilizar o procedimento mais moroso e consumidor de recursos da licença, em grande medida contrariando o interesse público que se procurava satisfazer”, lê-se no diploma do Governo.

As obras de construções de habitação pública, das residências de estudantes, de monumentos, de infraestruturas de serviços públicos, nos portos, na ferrovia ou nos aeroportos ou de parques empresariais ou de logística, que sejam realizadas pelas empresas do Estado central ou das autarquias, lê-se ainda no documento, “são dispensadas licenças urbanísticas ou outros atos de controlo prévio, apenas havendo lugar à emissão de um parecer não vinculativo pelo município competente”.

Segundo o diploma, as câmaras vão passar a dispor de um prazo de entre 120 e 200 dias para decidirem sobre os pedidos de licenciamento que lhes sejam apresentados. O número de dias flutua de acordo com a área bruta de construção. Para dimensões até aos 300 m2, o prazo não poderá exceder os 120 dias úteis, número que aumenta para 150 dias para áreas entre 300 e 2.200 m2 ou que envolvam imóveis classificados. O prazo máximo de 200 dias fixa-se para imóveis com área bruta de construção superior a 2.200 m2. O prazo é contado a partir do momento em que o pedido seja apresentado ao município, pelo que se o mesmo não for cumprido, o projeto avança por deferimento, sem que o município se tenha pronunciado.

E o não cumprimento dos prazos legais “implica o deferimento tácito da decisão”, ou seja, caso as decisões “não tenham sido adotadas nos prazos devidos, o particular poderá realizar o projeto pretendido”, refere ainda o documento. Esta é, aliás, uma das regras que entrou em vigor a 1 de janeiro.

Com este decreto-lei passa, também, a existir um único momento de notificação ao requerente e o Pedido de Informação Prévia (PIP) passa a ter uma duração de dois anos (em vez de um) e desonera, regra geral, o requerente de controlo prévio.

É ainda eliminado o alvará de licença de construção, que é substituído pelo recibo do pagamento das taxas devidas.

Nova plataforma para uniformizar processos nas autarquias

Para “uniformizar” os procedimentos e para “evitar que existam práticas diferentes” seguidas pelos municípios, “são adotadas medidas para impedir tratamentos injustificados e assimétricos”.

Com este diploma, os municípios ficam impedidos de “exigir documentos instrutórios adicionais face aos previstos na lei e em portaria especificamente destinada à identificação desses documentos”. Entre a lista “não exaustiva” de documentos instrutórios que não podem ser exigidos estão: cópias de documentos na posse da câmara, a caderneta predial, o reenvio de certidão permanente ou do seu código por o seu prazo de validade ter expirado quando era válido no momento da apresentação do pedido, o livro de obras digitalizado, declarações de capacidade profissional dos técnicos responsáveis pelos projetos, emitida por qualquer entidade, incluindo ordens profissionais, entre outros.

Com este simplex é ainda criada uma Plataforma Eletrónica dos Procedimentos Urbanísticos, que, a partir de 5 de janeiro de 2026, será de “utilização obrigatória para os municípios”. Através desta plataforma será possível apresentar pedidos online, consultar o estado dos processos e prazos; receber notificações eletrónicas; obter certidões de isenção de procedimentos urbanísticos; ou submeter pedidos em formato Building Information Modelling (BIM), com automatização da verificação do cumprimento dos planos aplicáveis.

Reclassificação de terrenos para construção

O decreto-lei permite ainda às autarquias reclassificar os solos rústicos (terrenos) para urbanos, desde que tenham como finalidade a construção de habitação pública ou a custos controlados. Além dos terrenos, também os edifícios afetos a comércio e serviços podem ser reclassificados para habitação. A propriedade dos terrenos reclassificados será exclusivamente pública e um dos critérios é que fiquem situados na contiguidade de solo urbano.

Só em casos de ruído, para construção de construção de estacionamento ou de espaços verdes, as câmaras vão poder recusar a reclassificação de solos rústicos para urbanos.

O diploma simplifica ainda o processo de reclassificação de solo rústico em solo urbano, para a construção de fábricas, de edifícios de armazéns ou logística sendo esta “uma iniciativa fundamental para viabilizar projetos de natureza industrial de envergadura significativa” quando existe “uma carência de espaços que possam ser afetos a esta finalidade”, sublinha o decreto-lei. Fora destas regras estão os terrenos localizados em “áreas sensíveis ou em áreas da reserva ecológica nacional ou da reserva agrícola nacional”.

Fim dos bidés

O decreto-lei agora publicado dita ainda o fim aos bidés obrigatórios nas casas de banho, sendo esta uma regra em vigor há mais de 50 anos.

Além do fim dos bidés obrigatórios, são ainda revogadas ou substituídas algumas exigências do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) “que se consideram limitativas sem corresponder à proteção de um interesse público atual”. É o caso da permissão de um duche em casas de banho, em vez de banheiras; e passam a ser permitidas as cozinhas como kitchenettes ou walk through.

Com este decreto-lei, o Governo acredita que são criadas “condições para que exista mais habitação disponível a custos acessíveis” e é dada uma resposta a “alguns desafios” e às “barreiras excessivas” que as empresas de construção enfrentavam, acabando com uma elevada carga burocrática e de encargos que punham em risco “a competitividade do país” por dificultarem “a atratividade do investimento nacional e estrangeiro”.

O problema do licenciamento era, aliás, um dos principais entraves à construção apontado pelos promotores e pelos investidores, sendo ainda uma das críticas apontadas por várias instituições internacionais como a Comissão Europeia, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e o Banco Mundial.

Com este decreto – que faz várias alterações ao Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (RJUE), ao Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) e a mais oito diplomas – fica finalizada a entrada em vigor de todos os diplomas incluídos no pacote legislativo Mais Habitação, apresentado em fevereiro pelo Governo.

Antes deste diploma estavam em vigor cerca de dois mil diplomas legais, dos quais 1.600 estavam ativos e muitos deles contraditórios. Ao RGEU que remonta a 1951, acresciam ainda 308 diferentes regulamentos municipais.

O diploma do simplex do licenciamento tinha sido aprovado em Conselho de Ministros a 19 de outubro de 2023, depois de ter sido votado no Parlamento. Foi promulgado pelo Presidente da República a 4 de janeiro depois de ter recebido uma “nova versão” da lei de outubro que “reduz significativamente” as questões “mais controversas” do diploma.

O diploma foi alvo de várias críticas. A Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) entende que há o risco de criar “mais problemas do que soluções” e que está em causa “a autonomia constitucional dos municípios”. Mas também os urbanistas, arquitetos e engenheiros apontaram críticas, no que toca, sobretudo, aos deferimentos tácitos.

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