“Devíamos mandar um cheque” em vez de reduzir portagens, sugere Baleiras

O presidente da UTAO discorda da baixa das tarifas, porque cria "distorções na economia" e "não é justo", porque depois os contribuintes vão estar a pagar essa opção política "durante muito anos".

O presidente da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), Rui Baleiras, é extremamente crítico em relação a medidas que impliquem a fixação de preços, como tetos a aumentos das portagens ou reduções tarifárias, porque “cria distorções na economia e não promove a justiça social”. “Devíamos era mandar um cheque para casa das pessoas ou uma transferência bancária, numa linguagem mais do século XXI para que elas façam o que entenderem com o dinheiro”, sugeriu em entrevista ao ECO.

O programa eleitoral da Aliança Democrática (AD), coligação que junta PSD, CDS e PPM e que venceu as legislativas de 10 de março, não tem propostas sobre redução de portagens, como o plano do PS de Pedro Nuno Santos. Contudo, durante a campanha eleitoral, o presidente do PSD, Luís Montenegro, referiu que pretende discriminar positivamente as zonas de baixa densidade populacional, designadamente no interior.

Sobre esta medida, Rui Baleiras é bastante crítico. “Por que é que um rico, uma pessoa que tem 50 mil euros de rendimento anual em Castelo Branco deve ser favorecida relativamente a uma pessoa que ganhe 15 mil euros por ano e viva na Área Metropolitana de Lisboa? Estamos a tratar de forma iníqua duas situações iguais. Se nós queremos redistribuir o rendimento, então distribuamos rendimento, não é mexer nos preços”, defende.

A este respeito, é de salientar que o líder do PSD e primeiro-ministro já indigitado assumiu que também pensa muito “nas pessoas dos Olivais, de Loures, de Sintra, da Maia, de Vila do Conde, de Matosinhos, que também estão circundadas de portagens às portas da Grande Lisboa e do Grande Porto e que também merecem, do ponto de vista do poder público, um olhar diferente”. Resta saber então qual será o plano global do novo Governo para as portagens.

O secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, queria ir mais longe e acabar com as portagens do interior e do Algarve, o que teria um custo de 113 milhões, segundo estimativas da Infraestruturas de Portugal.

De resto a UTAO já tem alertado para os impactos nocivos da interferência do Estado nas tarifas. O travão às portagens, acordado entre Governo demissionário de António Costa e as concessionárias para 2023, será pago “pelos contribuintes e pelos automobilistas ao longo de um número ilimitado de anos”, alertou a UTAO, no último relatório de apreciação às parcerias público-privadas (PPP) do primeiro semestre do ano passado.

Face à onda inflacionista, os tarifários teriam de ser atualizados, no ano passado, em 7,7%, mas o Executivo socialista de António Costa decidiu não refletir a totalidade do aumento, estabelecendo um teto de 4,9%, que será depois compensado nos próximos anos. “A decisão política de não permitir a repercussão integral da inflação nas tarifas de 2023 será paga pelos contribuintes e pelos automobilistas ao longo de um número ilimitado de anos”, avisam os técnicos que dão apoio aos deputados no Parlamento. Recorde-se que o Governo, quando aprovou a medida, estimou um custo de 140 milhões de euros.

“A opção do Governo em não permitir a subida das portagens em 2023 até à taxa máxima prevista nos contratos de parceria”, de 7,7%, valor apurado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) com base no índice de preços no consumidor em 2022, que é a referência habitual nos contratos, “determinou um encargo para os contribuintes em 2023”. “Trata-se de um subsídio pago pelo Estado aos parceiros privados em 2023 cujo montante resulta da diferença entre as duas taxas, 7,7% e 4,9%”, salienta a UTAO.

Este ónus ficou estabelecido no decreto-Lei n.º 87-A/2022, de 29 de dezembro, recorda. “Para os anos seguintes, haverá uma partilha de custos do efeito de base entre contribuintes e automobilistas. A partir de 2024 (inclusive) e por um número indefinido de anos, o montante do apoio suportado pelo Estado será reduzido no montante de uma atualização suplementar das tarifas e taxas de portagem a suportar pelos utilizadores”, de acordo com o mesmo documento.

Questionado durante quantos anos vamos estar a pagar este “travão”, Rui Baleiras referiu que “o número não está definido, por isso é que escrevemos ilimitado”. “As tarifas das portagens são aprovadas por portaria do Governo e os contratos de concessão, de maneira geral, preveem que os concessionários podem pedir aumentos correspondentes à variação do índice de preços no consumidor, o que daria 7,7%% para 2023 e o Governo entendeu que não deveria ir além dos 4,9%”, indicou.

O Governo fez então “uma peça legislativa em que determina que a diferença, destes quase três pontos percentuais seriam, para já, e em 2023, pagos através do Orçamento do Estado, pago pelos contribuintes”, esclareceu. “Nos anos seguintes, haveria uma compensação. O Orçamento de Estado diminui gradualmente a sua comparticipação às concessionárias e os automobilistas vão suportar, para além do aumento da inflação, uma parcela que substitui o subsídio do Estado. E não está escrito até quando é que isto vai suceder, qual é o prazo”, alerta.

“O que está escrito é que daqui a algum tempo a Inspeção-Geral das Finanças está mandatada para fazer uma auditoria para ver se o equilíbrio económico das concessões foi ou não reposto e, portanto, presumo que, na sequência dessa auditoria, será tomada a decisão política de rever este sistema”, remata Rui Baleiras.

Pode ver a entrevista na íntegra aqui.

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