Exclusivo TAP anula garantias de empréstimo da Azul. Companhia brasileira recorre à CMVM
A companhia aérea portuguesa afirma num documento disponibilizado a investidores que considera sem efeito as garantias prestadas. Azul vai fazer exposição à CMVM.
A TAP informou os investidores da recente emissão de dívida de 400 milhões de euros que considera “nulas” as garantias prestadas à Azul pelo empréstimo obrigacionista de 90 milhões de euros, realizado em 2016, segundo um documento da operação. Um entendimento que veio escalar a tensão com a companhia brasileira e que contraria um parecer legal emitido na altura pela sociedade de advogados Vieira de Almeida. A Azul vai avançar com exposição à CMVM, apurou o ECO junto de fonte ligada ao processo.
“O nosso conselho de administração entende que os direitos de garantia previstos no Contrato de Garantia Azul são nulos e sem efeito, com base num parecer jurídico que classifica as Obrigações Azul como equivalentes a um empréstimo acionista subordinado à TAP SGPS, com a consequência de que todas as garantias concedidas em relação às Obrigações Azul são nulas e sem efeito”, lê-se num documento legal da emissão de dívida realizada pela transportadora portuguesa na semana passada, obtido pelo ECO. Sendo considerado subordinado, deixa de ter precedência em relação aos restantes créditos.
É este o parágrafo que veio agravar a disputa legal entre a TAP e a Azul, levando esta última a considerar que a empresa portuguesa entrou formalmente em incumprimento das garantias prestadas, solicitando a intervenção do agente fiduciário da operação, como avançou o Diário de Notícias. O ECO contactou a TAP, que não quis fazer comentários.
Os advogados que estão a assessorar a Azul vão, além disso, avançar com uma exposição à CMVM do alegado incumprimento da TAP e das diligências já tomadas, antes ainda da liquidação da emissão de 400 milhões de euros, prevista para dia 7, segundo apurou o ECO.
A TAP refere no documento disponibilizado aos investidores que a Azul poderá contestar o seu entendimento em relação às garantias e “tentar executar os direitos de garantia previstos no Contrato de Garantia Azul, até ao montante máximo garantido (90 milhões de euros)“.
A companhia aérea liderada por Luís Rodrigues está a ser assessorada neste processo pela Morais Leitão. Em março de 2016, uma outra sociedade de advogados, a Vieira de Almeida, emitiu um parecer bem diferente. Pedido pela TAP e enviado à Azul e à chinesa Hainan Airlines, que chegou a ser acionista indireta da transportadora portuguesa, o parecer assegura a legalidade de todo o processo, incluindo as garantias prestadas.
Todas as ações societárias necessárias ao abrigo das leis de Portugal foram devidamente tomadas, por ou em nome da TAP SGPS, para a celebração dos Acordos pela TAP SGPS e para o cumprimento pela TAP SGPS de cada uma das obrigações expressamente assumidas por esta nos termos dos Acordos.
“Todas as ações societárias necessárias ao abrigo das leis de Portugal foram devidamente tomadas, por ou em nome da TAP SGPS, para a celebração dos Acordos pela TAP SGPS e para o cumprimento pela TAP SGPS de cada uma das obrigações expressamente assumidas por esta nos termos dos Acordos“, afirma a opinião legal a que o ECO teve acesso, emitida dois dias depois da subscrição das obrigações pela Azul e a Parpública, que entrou com 30 milhões de euros.
O caso remonta a 2015, quando David Neeleman, fundador e maior acionista da Azul, venceu com Humberto Pedrosa a privatização da TAP, ficando com 61% das ações. Além de capitalizar a companhia aérea com os polémicos fundos oriundos da Airbus, por troca de um contrato vinculativo para a compra de aeronaves, o empresário brasileiro levou em 2016 a TAP SGPS a subscrever um empréstimo obrigacionista, convertível em ações, de 90 milhões de euros. Os títulos têm um juro elevado, de 7,5%, que, além disso, é composto. A fatura para a TAP SGPS já vai em 165,7 milhões.
A atravessar graves dificuldades financeiras, agora aparentemente mais sanadas, a Azul tentou encontrar liquidez adicional no empréstimo feito oito anos antes. Em setembro enviou uma carta a solicitar um “aperfeiçoamento” das garantias prestadas ou um pagamento antecipado da dívida, com negociação dos juros devidos. A TAP contestou as garantias e propôs o pagamento de 50 milhões de euros, sem no entanto avançar com uma proposta formal, como avançou o ECO.
O que levou o CEO da companhia brasileira a ameaçar romper o acordo comercial entre a Azul e a TAP no Brasil, tendo informado os interessados na privatização da companhia portuguesa dessa possibilidade. O diferendo esteve também na agenda da recente visita do ministro dos Portos e Aeroportos brasileiros a Portugal, que incluiu um encontro com o Governo e a administração da TAP.
Azul recorre a árbitro e quer reembolso antecipado
No documento da recente emissão disponibilizado aos investidores, a TAP elenca os direitos de garantia das obrigações subscritas pela Azul, que diz serem considerados nulos. São eles:
- Um penhor sobre direitos de propriedade intelectual;
- A cessão de créditos e penhor de contas bancárias;
- A cessão da posição contratual em determinados contratos de software;
- a constituição de uma nova empresa para deter e operar o programa Miles&Go (“NewCo”); e um penhor sobre as ações dessa NewCo.
A Azul decidiu recorrer ao agente fiduciário do contrato de subscrição das obrigações, a Bondholders, uma sociedade com sede em Valência, Espanha, de forma a dirimir o conflito.
Na carta, datada de 1 de novembro e enviada também à Parpública e à TAP, a Azul escreve que “identificou vários eventos e circunstâncias provocadas pelo emitente, seja diretamente ou em resultado de ações tomadas pelo acionista de controlo, (….) que consideramos Eventos de Incumprimento ao abrigo dos termos e condições das obrigações“. Dá como exemplo “a intenção de repudiar um documento financeiro”, “a violação dos compromissos de informação” ou a “violação de compromissos relativos a alienações”.
A companhia brasileira notifica o agente fiduciário para “convocar uma assembleia de obrigacionistas extraordinária” para discutir “certos Eventos de Incumprimento” e a “possibilidade de desencadear o reembolso antecipado das obrigações“.
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