PS segura Montenegro no cargo de primeiro-ministro, mas “estrago está feito”

O chefe do Executivo não se demite e vai continuar em funções, mais uma vez graças ao maior partido da oposição. Pedro Nuno Santos anunciou que vai chumbar a moção de censura do PCP.

Debaixo de fogo por causa da empresa da sua família e de um eventual conflito de interesses, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, vai conseguir sobreviver a uma nova tentativa de derrube do Governo, apresentada pelo PCP, já depois da moção de censura do Chega, que acabou chumbada. E, mais uma vez, será o PS o salvador. O líder socialista, Pedro Nuno Santos, anunciou este sábado à noite que iria chumbar a iniciativa dos comunistas, mas não poupou críticas à atuação de Montenegro: “O estrago está feito”.

O chefe do Executivo convocou um Conselho de Ministros extraordinário para este sábado para decidir que rumo tomar após a polémica em torno da Spinumviva, detida pela mulher e os filhos: poderia desfazer-se da empresa, apresentar uma moção de confiança ao Parlamento ou demitir-se. Mas Luís Montenegro acabou por desafiar os partidos da oposição a avançarem com uma nova moção de censura. Caso contrário, entregaria uma moção de confiança no Parlamento.

“Em termos políticos e governativos, insto daqui os partidos políticos, representados na Assembleia da República, a declarar sem tibiezas se consideram, depois de tudo o que já foi dito e conhecido, que o Governo dispõe de condições para continuar a executar o programa do Governo, como resultou há uma semana da votação da moção de censura”, afirmou, numa declaração lida na residência oficial do primeiro-ministro, acompanhado na sala por todos os ministros, numa mostra simbólica de união. Ou seja, atirou a bola para a oposição no sentido de apresentarem nova moção de censura.

Em causa está a polémica em torno da sua empresa familiar Spinumviva e sobre um potencial conflito de interesses com os clientes. Entre estes destaca-se o grupo Solverde, uma vez que, entre 2018 e 2022, ou seja, antes de ser presidente do PSD e primeiro-ministro, Montenegro liderou as negociações com o anterior Governo para estender o contrato de concessão dos casinos de Espinho e do Algarve ao mesmo grupo. Por outro lado, foi noticiado esta sexta-feira que a empresa da família de Montenegro recebe mensalmente uma avença mensal de 4500 euros, da Solverde, por prestação de serviços de consultadoria na área de proteção de dados.

O chefe do Executivo revelou ainda que vai deixar de ter qualquer interesse, ainda que indireto, na sua empresa Spinumviva, ao passar todo o capital para os seus filhos (atualmente está dividido entre estes e a sua esposa, com quem é casado em comunhão de bens). A sede da empresa, atualmente na casa da família Montenegro, também será alterada.

Em reação, o PCP indicou que iria avançar com uma moção de censura para derrubar o Executivo, o que mereceu logo a adesão do Chega, enquanto o BE referiu que iria avaliar e a IL colocou-se fora dessa iniciativa. Faltava a posição fundamental do PS para decidir o jogo. E o secretário-geral dos socialistas voltou a segurar o Executivo tal como já tinha feito aquando de semelhante iniciativa do Chega, através do voto contra. Sem uma maioria confortável no Parlamento, PSD e CDS, os partidos que suportam o Executivo, precisam do apoio do PS ou do Chega.

“Não viabilizaremos essa moção de censura”, sublinhou Pedro Nuno Santos, argumentando que o PS “não será fonte de instabilidade”. O líder do PS criticou ainda o facto de PCP ter mordido o “isco” lançado por Montenegro. E não poupou críticas a Luís Montenegro: “O primeiro-ministro não respondeu a perguntas, vitimizou-se, atacou toda a gente, foi prepotente e irresponsável, porque não respeita as instituições, não respeita os portugueses ao não dar esclarecimentos. Estas são as mais elementares regras democráticas”.

Pedro Nuno Santos continuou ao ataque, acusando Montenegro de preferir “jogos políticos e de querer provocar uma crise”. “Vender a quota que detinha numa sociedade de advogados para criar uma empresa que lhe permitia continuar a receber, exercendo funções de liderança no PSD e no país,” significa que “o primeiro-ministro não esteve em exclusividade de funções nos últimos 10 anos”, concluiu. E “a transição da quota aos filhos não resolve nenhum problema, o estrago está feito, quebrou-se uma relação de confiança com o povo português”, lamentou.

Caso o PCP não avançasse com uma moção de censura, o único partido de oposição que se mostrou disponível para tal, e sendo que o Chega está impedido de o fazer porque já apresentou essa iniciativa nesta sessão legislativa, o primeiro-ministro comprometeu-se a submeter ao escrutínio dos deputados uma moção de confiança do Governo.

“Sem essa resposta, a clarificação política exigirá confirmação dessas condições o que, por iniciativa do Governo só pode acontecer com uma moção e confiança. O primeiro-ministro e o Governo estamos aqui para assegurar a estabilidade e estamos focados na resolução dos vossos problemas. Mas só estaremos cá com a vossa confiança e legitimação, sinto que é essa a vossa vontade, sinto que é a vontade da maioria dos portugueses que o Governo continue a executar o seu programa”, defendeu Montenegro.

O repto do chefe do Governo foi vista por Pedro Nuno Santos como “falta de coragem de um líder político” que transfere “para os outros a responsabilidade que é só sua”. Por isso, “se o senhor primeiro-ministro e o seu Governo apresentarem uma moção de confiança no Parlamento, o PS chumbará essa moção de confiança”, avisou.

Governo descarta moção de confiança

PS, Chega e o Bloco de Esquerda anunciaram que também votariam contra uma eventual moção de confiança. No entanto, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, esclareceu que o Governo não irá avançar com essa opção se o Parlamento chumbar a moção de censura do PCP.

“O chumbo de duas moções de censura significa que o Parlamento poderá continuar a Governar e nesse sentido não há necessidade ou justificação para uma moção de confiança”, afirmou o governante em entrevista à RTP3, no mesmo dia em que o ministro dos Negócios Estrangeiros também foi à SIC Notícias defender o primeiro-ministro.

O líder do Chega, André Ventura, garantiu que “em caso algum aceitaria viabilizar uma moção de confiança apresentada por um Governo nestas condições”, acusando o Executivo de querer “provocar uma crise”. Ventura destacou que “ninguém quer eleições”, mas defendeu que não pode “confiar num primeiro-ministro sob suspeita”.

Por seu lado, a coordenadora do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, defendeu que “houve uma admissão de incompatibilidades, numa declaração à imprensa sem direito a perguntas”. “O Bloco de Esquerda não tem confiança nos negócios do primeiro-ministro, não tem confiança sobre as explicações dadas das suas empresas, do seu património e da sua governação. Votaremos contra uma moção de confiança se esta for apresentada à Assembleia da República”, disse.

De igual forma, o porta-voz do Livre, Rui Tavares, disse não ter confiança institucional e política no primeiro-ministro, apelando ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, para que avalie “o normal funcionamento das instituições”. “Não temos confiança neste primeiro-ministro, que se agravou ainda hoje”, disse o dirigente do Livre, considerando que a declaração de Luís Montenegro foi “dúbia”.

O líder da IL, Rui Rocha, afirmou que “é muito difícil alguma adesão” à moção de censura do PCP. “A IL poderá concordar com um ou outro diagnóstico, mas as solução do PCP não justificam uma adesão por parte da IL, sem que isso deixe de lado todas as responsabilidades do primeiro-ministro, que deve ser escrutinado”, sublinhou. Ainda assim, o deputado disse que o partido vai primeiro “analisar a moção de censura” e depois tomará uma decisão definitiva.

Da parte do CDS, o líder parlamentar Paulo Núncio considerou que se houver uma crise política “será da inteira responsabilidade da oposição”, desafiando os partidos a clarificarem se querem eleições antecipadas num momento mundial preocupante. O deputado defendeu que “o primeiro-ministro deu todas as explicações ao país” e que “não há nenhuma razão para uma crise política”, algo que os portugueses não querem que aconteça, citado pela Lusa.

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