Mais de 500 milhões dos dividendos da bolsa voam para a China e Angola
Cotadas da bolsa vão entregar 2,9 mil milhões em dividendos aos acionistas relativos aos lucros de 2024. Cheque mais chorudo é pago pela EDP, com a chinesa China Three Gorges a receber 179 milhões.
2024 ficou marcado pela quebra da rentabilidade das cotadas do PSI. Apesar da descida dos lucros, a maioria das empresas anunciou a intenção de aumentar a sua remuneração acionista, propondo entregar mais de dois terços dos resultados registados no exercício aos investidores. Do bolo total que vai ser distribuído, mais de 500 milhões voam para a China e para Angola. Já as maiores famílias da bolsa em Portugal vão receber cerca de 530 milhões.
Depois de no ano passado terem distribuído mais de 2,6 mil milhões em dividendos, 13 das 15 empresas cotadas do PSI [a Ibersol ainda não apresentou resultados e a Altri não indicou a intenção de propor a distribuição de dividendos relativos ao exercício de 2024] preparam-se para reembolsar aos seus acionistas 2,9 mil milhões de euros dos lucros arrecadados no último ano. Trata-se do valor mais elevado de sempre e é o quarto recorde consecutivo. Depois de um corte na remuneração paga aos investidores nos anos da pandemia, as cotadas retomaram em força a distribuição de dividendos, com a maioria das empresas empenhada em manter uma política de pagamento de dividendos crescente.
A EDP continua a ser a que distribui o maior bolo dos dividendos na bolsa de Lisboa. Apesar de ter baixado os lucros de 952 para 801 milhões de euros, a elétrica não só manteve como aumentou o valor do dividendo que vai distribuir pelos acionistas. A empresa liderada por Miguel Stilwell de Andrade vai pagar um dividendo bruto de 0,2 euros por ação, mais 3% que os 0,195 euros distribuídos no ano passado. A China Three Gorges é a maior beneficiária deste dividendo, arrecadando 179 milhões de euros pela sua posição de 21,4% no capital da empresa portuguesa.

Contabilizando os 95,6 milhões de euros que a Fosun vai receber pelas suas participações no BCP (90,8 milhões) e na REN, através da Fidelidade, na qual controla 85% do capital; os 26 milhões a que a State Grid of China tem direito pela sua posição de 25% na REN; e os 14,9 milhões que a parceira chinesa da Mota-Engil, a China Communications Construction Company, vai receber da construtora portuguesa, rumam à China perto de 316 milhões de euros em dividendos.
A China é há vários anos a geografia que recebe a maior fatia dos dividendos pagos no exterior pelas cotadas nacionais, devido às posições de relevo detidas por empresas controladas pelo Estado chinês em cotadas do setor da energia (EDP e REN).
Participações de empresas chinesas no capital da EDP, REN e Mota-Engil rendem mais de 300 milhões em dividendos referentes ao exercício de 2024.
Outra geografia que vai amealhar uma importante fatia dos dividendos que deverão começar a ser distribuídos pelas cotadas portuguesas a partir de abril e maio é Angola. A Sonangol é o segundo maior acionista do BCP, com uma participação de 19,49%, e será uma das beneficiadas pela política acionista do banco. A entidade, que fechou 2024 com um lucro recorde de 906,4 milhões de euros, quer entregar 75% do seu resultado líquido anual. Relativamente ao exercício de 2024, o banco vai entregar metade dos lucros através do pagamento de um dividendo e vai ainda avançar com um programa de recompra de ações no valor de 200 milhões.
A petrolífera angolana irá, assim, receber um cheque de 88,4 milhões do BCP. Há posição angolana no BCP, há ainda que acrescentar a participação na Galp, através da Esperanza Holding, que detém 45% da Amorim Energia, maior acionista da Galp com 36,69% do capital, assim como os 26,075% da ZOPT na Nos, uma posição imputada a sociedades detidas por Isabel dos Santos. Contas feitas, cabe a estas posições angolanas no capital destas três cotadas receber 219 milhões de euros.
Para a América do Norte vão cerca de 158 milhões dos dividendos do PSI. Com 6,85% do capital da EDP e 3% na EDP Renováveis, a BlackRock vai receber perto de 60 milhões, enquanto o fundo de pensões Canada Pension Plan Investment Board tem direito a 45,5 milhões da EDP. Há ainda outras posições de fundos de investimento no capital dos CTT e Galp que elevam o valor do cheque que irá rumar ao outro lado do Atlântico.
Em Espanha ficam cerca de 83 milhões, arrecadados por investimentos que vão desde a posição da família Masaveu, através do Oppidum, na EDP, à participação da dona da Mayoral, através da Global Portfolio Investments, nos CTT, e outras participações na Sonae e REN.
O maior fundo soberano do mundo, o Norges Bank, que no final de 2024 era acionista de 10 empresas portuguesas (BCP, Corticeira Amorim, CTT, EDP e EDP Renováveis, Galp Energia, Jerónimo Martins, Nos, REN e Sonae) vai receber uma fatia dos dividendos destas cotadas. No entanto, uma vez que apenas são conhecidas as participações acima de 5% no capital das empresas, desconhece-se quanto é que o fundo irá levar para casa. A única posição revelada – de 5,63% – é na EDP. Um investimento que vai render mais de 47 milhões em dividendos.
Maiores famílias recebem 530 milhões
As famílias portuguesas, que controlam algumas das maiores empresas da bolsa, como a Jerónimo Martins, a Galp ou a Nos e a Sonae, vão encaixar mais de 536 milhões de euros pelas suas participações nas sociedades que detêm.
A família Soares dos Santos, que controla 56,14% da Jerónimo Martins, vai receber um envelope no valor de 208,4 milhões de euros, menos 23 milhões que o valor recebido o ano passado, fruto da descida de dividendo anunciada pela empresa. A dona dos supermercados Pingo Doce revelou uma quebra dos lucros de 20% para 599 milhões e anunciou que iria baixar o dividendo de 65,5 cêntimos, para 59 cêntimos, distribuindo assim 370,8 milhões em dividendos.

Já a família Azevedo, que detém a Sonae e é a maior acionista da Nos, através de uma participação de 37,37% controlada pela Sonaecom na operadora, revelou um conjunto de resultados “memorável” na Sonae, enquanto a Nos apresentou resultados recorde, com ambas as empresas a anunciarem melhorias na sua remuneração acionista. Tudo somado, a família Azevedo vai receber perto de 140 milhões de euros pelas suas participações.
Os Amorim também vão ver o valor do seu património “engordar” com os dividendos. As posições na Galp — família Amorim controla 55% da Amorim Energia, que por sua vez tem 33,34% do capital da petrolífera — e na Corticeira Amorim vão render 124,7 milhões de euros em dividendos à família Amorim.
A família Queiroz Pereira (Semapa e Navigator) vai ganhar perto de 42 milhões, enquanto a família Mota tem direito a receber 18,4 milhões pela sua posição na construtora da família e o empresário Manuel Champalimaud, acionista dos CTT, leva para casa mais de 3,3 milhões da empresa de correios.
O Estado português também vai receber alguns dos dividendos pagos na bolsa. A posição da Parpública na Galp vai render 38,5 milhões aos cofres públicos.
“Demonstrar confiança” com aumento da remuneração
As cotadas portuguesas têm vindo a aumentar a sua remuneração acionista, seja através do pagamento de dividendos em dinheiro, seja através de alguns planos de recompra de ações.
A decisão de aumentar a remuneração acionista, mesmo com estagnação nos resultados, pode ser interpretada como sinal de confiança, com as empresas a pretenderem demonstrar confiança na sua estabilidade financeira e na capacidade de gerar lucros futuros, mantendo ou aumentando os dividendos para reforçar a confiança dos investidores.
João Queiroz, head o trading do Banco Carregosa, destaca que a decisão de aumentar a remuneração acionista, mesmo com estagnação nos resultados, pode ser interpretada “como sinal de confiança, com as empresas a pretenderem demonstrar confiança na sua estabilidade financeira e na capacidade de gerar lucros futuros, mantendo ou aumentando os dividendos para reforçar a confiança dos investidores”.
O mesmo responsável realça que melhores dividendos podem “tornar as ações mais atrativas, especialmente para investidores que buscam rendimentos estáveis, contribuindo para a valorização das ações. No entanto, é crucial acompanhar para observar que esta política seja sustentável e não comprometa a saúde financeira a longo prazo”, remata.
Henrique Tomé, analista da XTB Portugal, nota que “Portugal atravessa, atualmente, um bom momento económico e espera-se que a Europa também possa começar a dar sinais de recuperação no longo prazo. Desta forma, as expectativas futuras para as empresas continuam positivas“.
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