Governo invoca “falta de quórum” para justificar legalidade na nomeação de Baleiras para o regulador dos seguros
Um Executivo em gestão está limitado nos poderes, mas Miranda Sarmento argumenta que se não fossem designados os cargos em falta a "Autoridade de Seguros ficaria sem quórum".
O ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, garante, em entrevista ao ECO, que o Governo, mesmo em gestão, atuou dentro da legalidade quando nomeou Rui Nuno Baleiras, coordenador da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), e Paula Vaz Freire para os cargos de vice-presidente e administrador da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), respetivamente. Caso contrário, “a Autoridade de Seguros ficaria sem quórum”, argumenta.
As dúvidas foram suscitadas pelo grupo parlamentar do PS, num requerimento enviado à tutela, que considera não estar reunido o único motivo que permite a um Executivo demissionário indicar nomes para as administrações dos reguladores: “vacatura do cargo e urgência”.
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A lei-quadro das entidades administrativas independentes com funções de regulação da atividade económica dos setores privado, público e cooperativo determina que: “Não pode ocorrer a designação ou proposta de designação entre a convocação de eleições para a Assembleia da República ou a demissão do Governo e a investidura parlamentar do Governo recém-designado, salvo se se verificar a vacatura dos cargos em causa e a urgência da designação, caso em que as referidas designação ou proposta de designação de que não tenha ainda resultado designação dependem de confirmação pelo Governo recém-designado”.
Mas o ministro das Finanças invocou efetivamente esse requisito, uma vez que a ASF corria o risco de ficar sem quórum. “A Autoridade dos Seguros tem um total de cinco membros no conselho de administração. Antes desta nomeação, estavam três e um deles terminou o mandato em dezembro”, começou por referir.
Ou seja, havia “o sério risco da Autoridade dos Seguros ficar sem quórum, porque se a pessoa que terminou o mandato em dezembro decidir ir embora, e tem essa legitimidade, a Autoridade de Seguros ficaria sem quórum”, frisou. Em causa está o ainda administrador Manuel Caldeira Cabral, antigo ministro da Economia do primeiro Governo de António Costa, que está de saída do regulador.
O ponto aqui é se não fizéssemos a nomeação, corríamos o sério risco da Autoridade de Seguros ficar, durante algum tempo, sem quórum.
No entanto, esse cargo será ocupado por Paula Vaz Freire e não por Rui Nuno Baleiras, que vai exercer as funções de vice-presidente, um lugar que está por preencher há mais de dois anos. Por isso, o PS considera que a qualificação jurídica de vacatura de lugar “para efeito de designação de um vice-presidente da ASF, no atual contexto desta entidade, não é líquida”.
O ministro das Finanças acabou por esclarecer então que “o professor Rui Baleiras só será vice-presidente se a ASF tiver os cinco membros”.
“O ponto aqui é se não fizéssemos a nomeação, corríamos o sério risco da Autoridade de Seguros ficar, durante algum tempo, sem quórum. Não estou a ver como é que o regulador, ainda por ser uma área tão sensível, pode funcionar sem quórum”, justificou.
Independentemente desta decisão, e uma vez que o atual Executivo se encontra em gestão, o futuro Governo, que sair das eleições legislativas antecipadas, de 18 de maio, terá de confirmar a nomeação de Rui Nuno Baleiras e Paula Vaz Freire.
Antes da designação, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, reconheceu que o Governo teria de avaliar se estaria dentro da legalidade para indicar os nomes. “Estamos apenas a fazer as verificações para assegurar que há um cabimento inequívoco, dentro dos poderes do Governo de gestão, o que poderá ser o caso”, afirmou a 27 de março. O Governo acabou por concluir que poderia avançar e aprovou uma resolução de Conselho de Ministros, a 10 de abril, com a indigitação de Baleiras e Vaz Freire.
Um dia depois da entrevista do ministro das Finanças ao ECO, o diploma foi publicado em Diário da República, a 17 de abril. E o risco de falta de quórum é o argumento invocado para a nomeação, tal como Joaquim Miranda Sarmento tinha explicado ao ECO.
“Cessou, em dezembro de 2024, o mandato de Manuel de Herédia Caldeira Cabral. […] Por conseguinte, torna-se indispensável e urgente proceder à designação de, pelo menos, um vice-presidente e um vogal, sob pena de aquele órgão poder vir a ficar, em breve, sem quórum para assegurar a gestão da entidade”, de acordo com a resolução do Governo.
Assim, “a despeito da dissolução da Assembleia da República e, bem assim, da fixação do dia 18 de maio de 2025 para a eleição dos deputados àquela Assembleia […] dada a vacatura dos cargos em causa e a urgência da designação, torna-se imperioso proceder desde já à designação de novos membros para aqueles cargos, naturalmente sujeita à confirmação pelo Governo que vier a ser empossado na sequência e em resultado daquele ato eleitoral”, lê-se no mesmo diploma.
Rui Nuno Baleiras e Paula Vaz Freire começam a exercer funções como vice-presidente e vogal, respetivamente, do conselho de administração da ASF a 21 de abril.
Neste momento, Rui Nuno Baleiras é coordenador da UTAO, entidade que presta assessoria económica e orçamental à Assembleia da República, desde julho de 2018. É professor da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho e foi secretário de Estado do Desenvolvimento Regional do Governo de José Sócrates entre 2005 e 2009.
Paula Vaz Freire foi diretora da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, entre 2020 e 2023, e conta com diversos livros e artigos científicos em Portugal e no estrangeiro, designadamente, nas áreas da concorrência e regulação económica.
(Notícia atualizada a 17 de abril com a publicação em Diário da República da resolução do Conselho de Ministros que nomeia Rui Nuno Baleiras e Paula Vaz Freire para vice-presidente e vogal do conselho de administração da ASF)
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