Numa legislatura que “vai dar muito trabalho”, presidente da AR acredita que “parlamento vai funcionar”
"Não podemos considerar que o regime democrático, ou que a democracia só é boa, quando está inclinada para o lado que eu acho", diz José Pedro Aguiar Branco, em entrevista à Lusa.
O presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar Branco, que vai ser recandidato ao lugar que assumiu após as legislativas de há um ano, considera que esta missão “talvez seja, neste momento, das mais exigentes no que diz respeito ao próprio regime democrático”. Isto, defende em entrevista à Lusa, porque “é no parlamento que se têm de fazer consensos e criar maiorias, que se tomam medidas que depois impactam na vida dos cidadãos e se faz o escrutínio da ação do Governo – isto é nuclear no que diz respeito à qualidade do regime democrático”.
Já de olhos na campanha que antecederá a eleição para o próximo Chefe de Estado — figura que, pela Lei, substitui na ausência deste –, Aguiar Branco diz que “gostaria que o debate das presidenciais não se transformasse num debate antipartidos, porque os partidos políticos são fundamentais e estruturantes numa democracia, são fundamentais numa democracia liberal representativa”.
Os comentários poderão ter como destinatário o candidato presidencial Henrique Gouveia e Melo, que desde quinta-feira está oficialmente na corrida a Belém. O almirante considera necessário um “Presidente estável, confiável e atento, acima de disputas partidárias”, e deixou, no discurso de candidatura, um manifesto de intenções que alguns consideram mais próximas de um candidato a primeiro-ministro.
Gostaria que o debate das presidenciais não se transformasse num debate antipartidos, porque os partidos políticos são fundamentais e estruturantes numa democracia, são fundamentais numa democracia liberal representativa
Nesta mesma entrevista à Lusa, Aguiar Branco diz que “o Presidente da República tem um especial dever e cuidado – e assim acredito que será – de ter esse respeito por outro órgão de soberania, e no caso concreto o parlamento. É do parlamento que emana a dimensão de Governo a que estamos habituados e que acho que é saudável para a nossa democracia”.
Aguiar Branco considera ainda que a democracia exercida através de redes sociais e de outros modos “sem filtro” traz “perigos”.
Entre os temas na ordem do dia em termos de política nacional está uma eventual revisão constitucional, que Luís Montenegro não afasta, mas diz não ser prioridade imediata. Sobre a mudança na geometria parlamentar para alcançar os dois terços de deputados necessários a alterações à Constituição, com a direita sozinha a permitir o somatório de deputados necessário (e sem a capacidade de PSD e PS, somados, perfazerem esse número), o presidente da Assembleia da República diz que “não podemos também considerar que a democracia portuguesa tinha estabelecido desde a origem uma situação que funcionaria sempre num determinado quadro. Não podemos considerar que o regime democrático, ou que a democracia, só é boa, quando está inclinada para o lado que eu acho”.
Adianta ainda que “rever a Constituição faz parte da normalidade” e que para a revisão ocorrer “é preciso que haja uma determinada maioria, que só existirá se aqueles que a compõem – e nenhum por si tem esse poder – se entenderem. Portanto, pode ser muito radical ou pode ser muito conservadora, que não acontece sem consenso alargado”.
O Tribunal Constitucional está lá, funciona. Se é preciso mudar, muda-se com o consenso que existir. Se não houver esse consenso, continuará a trabalhar com quem está.
A atual configuração do Parlamento, como ficará formalizada na tomada de posse dos deputados na terça-feira, permite que a direita seja autossuficiente também na eleição de altos cargos, como o dos juízes do Tribunal Constitucional, Provedor de Justiça ou presidente do Conselho Económico e Social, mas Aguiar Branco desdramatiza a nova relação de forças. Esta “obriga a um exercício maior de esforço de consensualização”, diz, à Lusa.
No limite, considera, “o Tribunal Constitucional está lá, funciona. Se é preciso mudar, muda-se com o consenso que existir. Se não houver esse consenso, continuará a trabalhar com quem está”.
Aguiar Branco acredita que “a democracia vai funcionar, o parlamento vai funcionar, vamos ter necessidade de fazer consensos e vai haver necessidade de maiorias com geometria variável”. Em especial, “políticos e partidos” devem “ter a maturidade para saber interpretar corretamente a vontade dos portugueses e atuar em conformidade”.
Numa mensagem de confiança, o ex-ministro social-democrata, que assume a sua candidatura a novo mandato à frente dos destinos do Parlamento, antevê uma legislatura “trabalhosa. Vai dar muito trabalho, mas estamos a praticar a democracia e acho que o parlamento vai funcionar”.
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