Trabalhadores dispensados no período experimental estão a aumentar. O que vai mudar com nova lei do trabalho?
Ministério do Trabalho revela que denúncias de contrato de trabalho durante o período experimental estão a aumentar. Anteprojeto prevê mudanças, nomeadamente para os jovens.
Mais de 82 mil contratos de trabalho foram denunciados por parte das empresas durante o período experimental nos últimos dois anos, de acordo com a informação enviada pelo Ministério do Trabalho ao Parlamento. Esta é uma das normas que o Governo quer mudar agora no Código do Trabalho, retirando os jovens à procura do primeiro emprego e os desempregados de longa duração da lista dos empregados que podem ficar 180 dias à experiência.
“Desde 2023, e de acordo com o sistema de estatística da Segurança Social, foram denunciados por parte do empregador 82.440 contratos de trabalho no decorrer do período experimental. No mesmo período, verificam-se, apenas, 3.442 denúncias por iniciativa do trabalhador”, indica a tutela, em resposta a questões colocadas pela bancada socialista.
O Ministério do Trabalhado avança também que se assistiu a um “aumento do número de denúncias por iniciativa do empregador no decorrer do período experimental no ano de 2024“, face ao ano anterior.
E revela que “a mesma tendência” está a ser verificada este ano, “uma vez que até ao presente, o número de denúncias ultrapassa o número verificado no período homólogo“.
“O número de denúncias em sede de período experimental é particularmente elevado em comparação com as demais formas de cessação do contrato de trabalho“, assinala ainda a tutela.
No entanto, quanto ao número de queixas relativamente ao período experimental, o Ministério admite que o sistema de informação da Autoridade para as Condições do Trabalho “não tem um nível de desagregação de dados que permita identificar pedidos de intervenção inspetiva ou queixas à ACT” relativas a esta matéria.
O período experimental foi um dos pontos quentes da revisão da lei do trabalho que aconteceu em 2019. Desde essa altura que os jovens à procura do primeiro emprego e os desempregados de longa duração estão na lista de trabalhadores que podem ser sujeitos a 180 dias de experiência.
Ora, com o anteprojeto de reforma da legislação da lei do trabalho, o Governo quer agora reverter isso, fazendo, contudo, regressar a hipótese desses trabalhadores, só por não terem ainda tido um contrato sem termo ou por estarem no desemprego há mais de 12 meses, serem contratados a prazo.
Em entrevista ao Jornal de Notícias e à TSF, a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, explicou que, com a mudança feita em 2019, os empregadores começaram a contratar esses trabalhadores sem termo, mas com seis meses de experiência, sendo que, ao fim de cinco meses e 29 dias, o contrato pode ser denunciado sem motivo e sem compensação, ao contrário do que acontece num contrato a termo.
“Portanto, uma alteração aparentemente benéfica passou a ser de total precariedade para estes trabalhadores”, justificou a governante a mudança agora proposta.
Perante estas declarações, o grupo parlamentar socialista pediu, então, à tutela os dados já referidos, afirmando que é preciso dados que fundamentem as “alegadas práticas de aproveitamento no âmbito do período experimental“.
“A existirem, estas situações podemos estar perante situações de abuso, que não devem ser tomadas como representativas da realidade, sendo por isso essencial perceber qual a real incidência deste tipo de alegadas práticas num momento em que a sua existência está a ser utilizada para, com esse pretexto, retroceder nos direitos e implementar a ideia de que jovens podem afinal ser contratados a prazo apenas por não terem tido acesso anterior a um contrato sem termo“, frisam os socialistas.
Mas, afinal, o que é o período experimental? E o que vai mudar?

O período experimental corresponde aos primeiros meses de um contrato de trabalho, variando a duração mediante as funções em causa e o tipo de contrato de trabalho. De acordo com o Código do Trabalho, durante este período, o trabalhador e o empregador “devem agir de modo a que possam apreciar o interesse na manutenção do contrato de trabalho”.
A lei prevê que o empregador deve indicar por escrito ao trabalhador a duração e as condições do período experimental até sete dias após o início do contrato. Se não o fizer, considera-se que as partes acordaram na exclusão do período experimental.
O Código do Trabalho prevê também que, no caso dos contratos de trabalho sem termo, o período experimental dura 90 dias para a generalidade dos trabalhadores; 180 dias para trabalhadores que exerçam cargos de complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade ou que pressuponha uma especial qualificação; 180 dias para trabalhadores que desempenhem funções de confiança; 180 dias para trabalhadores que estejam à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração; E 240 dias para trabalhadores que exerçam cargos de direção ou quadro superiores.
Salvo acordo escrito em contrário, durante esse período, qualquer das partes (empregador ou trabalhador) pode denunciar o contrato sem invocação de justa causa, nem direito a indemnização”.
Ora, no âmbito da reforma da legislação laboral, o Governo propôs aos parceiros sociais alterar a duração do período experimental aplicável aos mais jovens e desempregados de longa duração, isto é, quer revogar a norma que dita que estes trabalhadores têm de cumprir 180 dias de experiência, revertendo a alteração feita pelo ex-ministro José António Vieira da Silva.
Na altura, Maria do Rosário Palma Ramalho (então, professora e hoje ministra do Trabalho) chegou a atirar, em entrevista ao Jornal de Negócios, que essa alteração trocava “a precariedade semicontrolada” (a contratação a termo como período de experiência) por “precariedade total”.
Não é de estranhar, por isso, que, com Palma Ramalho agora a liderar a pasta do Trabalho, esteja a ser discutida não só a reversão deste período experimental para jovens e desempregados, como uma flexibilização da contratação a prazo: como já referido, o Governo quer que volte a ser fundamento para a celebração de contratos a termo certo a contratação de trabalhador que nunca tenha prestado atividade ao abrigo de contrato por tempo indeterminado.
Os contornos exatos da reforma da lei laboral ainda estão por afinar. O Governo está a negociar na Concertação Social estas alterações e, depois, a proposta seguirá para o Parlamento, onde terá também de encontrar apoio na oposição para que seja viabilizada.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Trabalhadores dispensados no período experimental estão a aumentar. O que vai mudar com nova lei do trabalho?
{{ noCommentsLabel }}