Autoridades europeias reforçam alerta sobre perigos dos criptoativos
Volatilidade elevada, baixa liquidez e fraudes em alta levam autoridades europeias a reforçar alertas sobre o universo dos criptoativos e a recomendarem prudência máxima aos investidores.
Portugal lidera a Europa no investimento em criptoativos, com 43% dos investidores nacionais a deter Bitcoin, Ethereum e outros ativos digitais — quase o dobro da média europeia de 22% –, segundo o relatório “Blackrock People & Money 2024”. A popularidade dos criptoativos entre os portugueses e também os europeus é crescente, e foi nesse sentido que esta segunda-feira as autoridades europeias de supervisão lançaram um conjunto de avisos e alertas aos investidores, notando que mesmo com o novo regulamento MiCA em vigor desde dezembro passado, investir em criptoativos continua a ser uma aposta arriscada, com proteção limitada.
“O valor da maioria dos criptoativos pode ser muito volátil, o que significa que o seu preço pode diminuir e aumentar rapidamente em curtos períodos de tempo“, podendo “gerar perdas, parciais ou totais, do dinheiro investido”, lê-se num comunicado conjunto assinado pela Autoridade Bancária Europeia (EBA), da Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma (EIOPA) e da Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA), publicado no site da CMVM.
O MiCA proporciona alguma proteção aos consumidores no que diz respeito a tipos específicos de criptoativos e serviços. No entanto, não são tão abrangentes como as aplicáveis aos produtos financeiros mais tradicionais (por exemplo, não beneficiará de regimes de compensação).
As autoridades europeias identificaram seis categorias de risco que ameaçam diretamente o dinheiro dos investidores, alertando que “os criptoativos envolvem riscos e o nível de proteção dos consumidores, se existir, pode ser limitado”.
- Volatilidade extrema: quando tudo pode desaparecer
O primeiro e mais devastador risco prende-se com as flutuações brutais das cotações. “O valor da maioria dos criptoativos, incluindo alguns que são regulados, pode ser muito volátil”, com oscilações que “podem gerar perdas, parciais ou totais, do dinheiro investido”. Esta volatilidade não distingue entre investidores experientes e novatos – todos podem perder tudo numa questão de horas. - Informações falsas: o perigo das redes sociais
O segundo grande risco identificado pelos reguladores passa pela proliferação de informações enganosas. “Alguns criptoativos e produtos conexos são promovidos de forma agressiva, utilizando informações confusas, incompletas, inexatas e, por vezes, deliberadamente enganosas”, refere o comunicado. O alerta é particularmente dirigido às “redes sociais, onde os influenciadores podem ser incentivados a publicitar determinados criptoativos”, muitas vezes sem revelar que estão a ser pagos para isso.
- Fraudes generalizadas: esquemas só para roubar dinheiro
As autoridades dedicam especial atenção ao que classificam como uma epidemia de fraudes. “Existem vários esquemas fraudulentos de criptoativos, pirataria informática e burlas, cujo único objetivo é ficar com o seu dinheiro, utilizando diferentes técnicas”. Os criminosos “podem utilizar mensagens de correio eletrónico de phishing, esquemas de engenharia social e ligações maliciosas, prometendo retornos irrealistas ou alegando estarem autorizados ou regulados quando não o estão”, destacam as autoridades europeias de supervisão. - Liquidez inexistente: quando não consegue vender
O quarto risco identificado são os problemas de liquidez. “Os mercados de criptoativos podem sofrer restrições de liquidez, o que pode limitar a capacidade de vender criptoativos ao preço ou no momento que pretender”. Isto significa que, mesmo querendo sair do investimento, pode não conseguir fazê-lo quando mais precisa. - Complexidade tóxica: produtos que ninguém compreende
As autoridades alertam que “as características e os riscos dos criptoativos, bem como de quaisquer produtos com um criptoativo subjacente, podem ser difíceis de compreender”, recomendando extrema cautela “especialmente se não tiver a certeza de como o seu valor é determinado e quais os riscos envolvidos”. - Segurança digital: uma chave perdida, tudo perdido
O sexto risco é tecnológico, mas com consequências financeiras devastadoras. As autoridades sublinham que “a perda de chaves criptográficas privadas resulta na perda permanente e irreversível de acesso e propriedade”. Ao contrário de uma conta bancária, se perder o acesso aos seus criptoativos, não há banco central ou autoridade que o possa ajudar a recuperá-los.
- Entidades não autorizadas: o perigo máximo
Particularmente preocupante é a proliferação de entidades que operam sem qualquer autorização. “Mesmo com o MiCA em vigor, poderá deparar-se com criptoativos e serviços de criptoativos prestados por entidades não autorizadas a operar na União Europeia”. Estas entidades “podem não estar sujeitas a quaisquer regras de proteção dos consumidores, não dispor de mecanismos de governação adequados, de capital ou de práticas e garantias operacionais transparentes”. O aviso das autoridades não podia ser mais direto: quem recorre a estas entidades “pode estar a expor-se a riscos significativos e ter um nível de proteção limitado ou nulo. Pode enfrentar perdas, ter pouca ou nenhuma possibilidade de recuperar quaisquer ativos e ficar sem qualquer recurso em caso de litígio”.
Proteção limitada num mercado arriscado
É neste contexto de riscos elevados que surge o Regulamento relativo aos mercados de criptoativos (MiCA), “plenamente aplicável desde 30 de dezembro de 2024”. As autoridades explicam que “um dos objetivos do MiCA é estabelecer regras harmonizadas para os criptoativos e os serviços de criptoativos em toda a União Europeia, tendo em vista proteger os consumidores”.
O regulamento representa a primeira tentativa séria da União Europeia de trazer alguma ordem a este mercado selvagem, abrangendo três tipos específicos de criptoativos: as criptofichas de moeda eletrónica (EMT), que procuram manter valor estável face a moedas oficiais como o euro; as criptofichas referenciadas a ativos (ART), que se baseiam noutros valores ou direitos; e outros criptoativos que não se enquadram nestas categorias.
Contudo, as próprias autoridades reconhecem as limitações do regulamento dos criptoativos. “O MiCA proporciona alguma proteção aos consumidores no que diz respeito a tipos específicos de criptoativos e serviços (por exemplo, o acesso a informação clara e detalhada, procedimentos de tratamento de reclamações). No entanto, não são tão abrangentes como as aplicáveis aos produtos financeiros mais tradicionais (por exemplo, não beneficiará de regimes de compensação)”.
O MiCA não abrange todos os ativos digitais. Ficam de fora do regulamento “criptoativos únicos e não fungíveis” que “não são facilmente permutáveis”, bem como tokens não transferíveis.
A situação complica-se ainda mais devido ao período transitório em vigor até julho de 2026. “Aplica-se um período transitório até julho de 2026, em alguns Estados-membros, pelo que algumas entidades podem atuar ao abrigo da legislação nacional até obterem a autorização do MiCA”, referem as autoridades europeias em comunicado. Durante este período, os consumidores “não beneficiarão de quaisquer proteções previstas no MiCA ao utilizar os serviços desses prestadores até ao final do período transitório”.
É também importante notar que o MiCA não abrange todos os ativos digitais. Ficam de fora do regulamento “criptoativos únicos e não fungíveis” que “não são facilmente permutáveis”, bem como tokens não transferíveis e criptoativos já cobertos por legislação financeira existente, alertam as autoridades europeias.
Para ajudar os consumidores a distinguir entre prestadores legítimos e potenciais esquemas fraudulentos, as autoridades disponibilizam ferramentas de verificação. “Pode verificar se um prestador de serviços está autorizado na União Europeia” consultando “o registo da Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA)” ou a lista I-SCAN, refere o comunicado.
As autoridades alertam ainda que “em certos casos, as entidades podem estar autorizadas apenas para uma parte das suas atividades”, recomendando que os investidores “verifiquem quais os serviços que a entidade está autorizada a prestar”. Além disso, as autoridades europeias recomendam que todos os potenciais investidores respondam honestamente a três questões fundamentais antes de avançar com qualquer aplicação em criptoativos.
- “Estou ciente dos riscos que estou a assumir ao investir ou utilizar criptoativos?” A recomendação é clara: “Antes de investir, dedique algum tempo a conhecer os produtos ou serviços em que está interessado” e “pondere se vale a pena assumir esses riscos, tendo em conta os seus próprios objetivos e circunstâncias financeiras”.
- “As entidades às quais estou a ponderar recorrer estão autorizadas a prestar serviços de criptoativos na União Europeia?” Esta verificação pode ser feita através dos registos oficiais disponibilizados pela ESMA.
- “Os dispositivos que utilizo para comprar, armazenar ou transferir criptoativos e para guardar as minhas chaves criptográficas privadas são seguros?” Esta questão ganha particular relevância quando se considera que “manter os seus dispositivos e o armazenamento de chaves seguros é um passo fundamental para proteger os seus criptoativos”.
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