Apesar da cegueira causada pelo ‘shutdown’, Fed vai avançar com novo corte nos juros para gerir riscos

Instituição liderada por Jerome Powell vai fazer novo corte de 25 pontos nos juros para 3,75%-4,00%. E não deve ser o último este ano, com analistas e mercados a apontarem para mais um em dezembro.

 

A Reserva Federal (Fed) reabriu em setembro a porta dos cortes nas taxas de juro, mas mesmo a escuridão (de dados) imposta pela paralisação do governo federal em outubro não vai impedir o banco central de dar mais um passo com uma nova redução de 25 pontos base (pb) esta quarta-feira. Segundo analistas e investidores, a reunião de dois dias do comité de política monetária (FMOC, na sigla em inglês) deverá resultar num corte das Federal Funds Rates para o intervalo 3,75%-4,00%.

“É amplamente esperado que a Fed realize um segundo corte consecutivo nas taxas de juros”, referiram os analistas do britânico Lloyds Bank. “Comentários recentes de Powell e da maioria dos membros do FMOC sugerem que os riscos crescentes do desemprego agora superam as preocupações com a inflação permanecer acima da meta”, adiantaram, explicando que “como resultado, os mercados estão a incorporar uma probabilidade de quase 100% de um corte de 25 pb”.

Segundo o site CME FedWatch Tool, que monitoriza a negociação dos futuros das taxas de juro, esta terça-feira a probabilidade de a Fed cortar as Federal Funds Rates em 25 pb eram de 97,8%.

Segundo os analistas do Lloyds, a ” falta de dados económicos recentes devido à paralisação do governo federal acrescentou alguma incerteza, mas é improvável que isso impeça a Fed de agir, dadas as crescentes preocupações com a fraqueza económica”. A decisão deve ser praticamente unânime no FOMC, com apenas Stephen Miran, nomeado por Donald Trump para esse board em setembro (e apenas de forma temporária), a votar por um corte de 50 pb.

Entre os economistas a opinião é também quase consensual. Numa sondagem conduzida pela Reuters entre 15 e 21 de outubro, 115 de 117 economistas apontaram para um corte de 25 pb. Há um mês, a maioria na sondagem previa apenas um corte até ao final do ano, mas agora 71% prevê mais um corte em dezembro também, refletindo os sinais dados pelos decisores da Fed.

Michael Krautzberger, diretor de investimento (CIO) global de mercados públicos da Allianz Global Investors (GI), recordou que no seu último discurso, a 14 de outubro na conferência da National Association for Business Economics, “Powell observou que a perspetiva económica tinha mudado pouco desde setembro, ao mesmo tempo que destacou os crescentes riscos de queda no emprego”.

“Neste contexto, e no meio de dados escassos durante o período entre reuniões devido ao shutdown, esperamos que os decisores sigam o caminho de menor resistência e reduzam as taxas em mais 25 pb na próxima reunião”, vincou, antes de oferecer contexto histórico. “Os cortes de natureza preventiva raramente foram medidas isoladas. Assim sendo, uma acomodação adicional não só refletiria a sequência de três cortes consecutivos das taxas de juro do ano passado, que totalizaram 100 pontos base entre setembro e dezembro, como se alinharia com os chamados ‘ciclos de seguro’ anteriores, quando a Fed, três em cada quatro situações desde 1980, voltou a cortar no prazo de 90 dias após a medida inicial”.

Nota: Se está a aceder através das apps, carregue aqui para abrir o gráfico.

Philip Marey, senior US strategist no banco de investimento neerlandês Rabobank, sublinhou que a paralisação do governo reduziu a disponibilidade de dados económicos e que embora as operações de rotina da Fed não sejam afetadas pela paralisação, dados como os de produção industrial produzidos pelo banco central dependem de partes do governo federal que estão paralisadas.

Mas, mais importante ainda, o Bureau of Labor Statistics não está a publicar os dados sobre o emprego nos setores não-agrícola, a taxa de desemprego e o rendimento médio por hora, sublinhou. “Dado o aumento dos riscos de queda no emprego, os dados sobre o mercado de trabalho são ainda mais cruciais do que o habitual para a tomada de decisões do Fed”.

Marey explicou que a Fed também tem o Livro Bege como fonte adicional de informação, embora qualitativa em vez de quantitativa. “Na edição de 15 de outubro, que incluiu informações até 6 de outubro, foi relatado que a procura por mão-de-obra estava geralmente moderada em todos os distritos e setores, enquanto a oferta de trabalho em vários setores estava restrita em vários distritos devido a mudanças recentes nas políticas de imigração”, concluindo que “portanto, o Livro Bege não sugeriu uma grande rutura em relação ao que os dados anteriores ao encerramento vinham mostrando”.

Do outro lado do equilíbrio que a Fed tem de gerir – a inflação – pessoal-chave do BLS foi chamado de volta para o produzir os dados de IPC , pois a Administração da Previdência Social precisava dos dados deste indicador do terceiro trimestre para calcular e publicar os ajustes anuais do custo de vida antes de 1 novembro. Com a inflação geral em 3,0% em termos homólogos, abaixo dos 3,1% esperados pelo consenso da Reuters, a probabilidade de um corte nas taxas em outubro aumentou.

“A inflação dos bens essenciais – provavelmente refletindo em grande parte as tarifas – não parece estar fora de controlo, enquanto a inflação dos serviços está a diminuir e isso permite que o FOMC se concentre nos riscos de queda do emprego”, reforçou o analista do Rabobank.

Poucos sinais para 2026

Se a Fed está a navegar um bocado às escuras, na ausência de dados, também deverá ter pouca capacidade ou vontade de esclarecer o rumo da política monetária em 2026. Esta reunião do FOMC não terá atualizações das projeções, portanto também não haverá o dot plot, gráfico de pontos das expectativas individuais dos membros sobre as taxas futuras. “Tendo em conta os seus comentários recente, Powell irá provavelmente continuar a salientar os riscos no mercado de trabalho, potencialmente abrindo caminho para um terceiro corte consecutivo em dezembro“, afirmaram os analistas do Lloyds. Os mesmos alertaram que os receios sobre a inflação não desapareceram de todo, o que poderá sugerir que a Fed não se queira comprometer no guidance, uma posição que a ausência de dados devido ao shutdown também potencia.

Os analistas realçaram que no discurso de 14 de outubro Powell recordou que a Fed tem há muito um plano de deixar de reduzir o balanço quando as reservas estiveram apenas ligeiramente acima de um nível que considere ‘amplo’ e que poderemos estar a atingir esse patamar nos próximos meses. “Portanto, também é provável que o FOMC anuncie que a redução das suas participações em títulos do Tesouro, dívida de agências e MBS [ativos de títulos garantidos por hipotecas] de agências está a chegar ao fim”.

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