Euronext Lisboa corteja investidores com um país de muitos encantos

O Portugal Capital Markets Day da Euronext Lisboa junta capital e ceticismo, com o país a tentar provar que a economia pode crescer acima dos 3% para captar investimento estrangeiro.

Lisboa recebe esta quarta-feira mais uma edição do Portugal Capital Markets Day, uma conferência que contará com a presença de mais de cinco dezenas de investidores estrangeiros de vários países que terão a oportunidade de conhecer e interagir com responsáveis de empresas nacionais, para posicionar o país como destino de investimento.

Este ano, o evento surge ancorado num estudo da Católica Lisbon Business & Economics que aponta para um crescimento do PIB potencial acima de 3% nos próximos anos, sustentado em infraestruturas e inovação. Mas será este otimismo compatível com a realidade dos números?

O relatório académico, apresentado pelo dean da Católica, Filipe Santos, há poucos dias aos jornalistas, perspetiva um “potencial de crescimento muito grande da economia acima das expectativas atuais”, defendendo que Portugal pode superar as projeções tradicionais que apontam para crescimentos em torno dos 2%.

Se tivermos um relançar do investimento e aumento do investimento em Portugal, conseguimos também aumentar a intensidade de investimento, o que pode levar a economia a crescer de forma consistente e consolidada acima de 3% nos próximos anos.

Filipe Santos

Dean da Católica Lisbon Business & Economics

“Há um potencial, dada a infraestrutura, as condições infraestruturais que se têm desenvolvido em Portugal, dado o aumento de capital humano e dado o ecossistema de inovação que existe hoje em dia em Portugal muito dinâmico”, afirmou Filipe Santos na apresentação aos jornalistas.

Segundo a análise da Católica, o potencial de crescimento do PIB português situa-se entre 2% e 3% ao ano desde 2022, sem contabilizar investimentos significativos futuros. O estudo destaca a capacidade de Portugal atrair talento internacional, as infraestruturas energéticas renováveis e a localização estratégica como fatores competitivos diferenciadores.

“Se tivermos um relançar do investimento e aumento do investimento em Portugal, conseguimos também aumentar a intensidade de investimento, o que pode levar a economia a crescer de forma consistente e consolidada acima de 3% nos próximos anos”, defende Filipe Santos.

Contudo, a aposta no ecossistema de inovação como motor de crescimento contrasta com a posição nacional nos indicadores europeus. Portugal investiu apenas 1,75% do PIB em investigação e desenvolvimento em 2024, muito aquém da média da União Europeia e longe da meta de 3% fixada para 2030. Este valor coloca o país no quinto pior lugar da União Europeia em despesa per capita em I&D, com apenas 78,7 euros por pessoa, face aos 284,7 euros da média europeia.

Mais revelador ainda é o facto de, no European Innovation Scoreboard de 2025, Portugal ocupar a 16.ª posição entre os 27 Estados-membros, classificado como “Inovador Moderado” com 90,7% da média da União Europeia. Apesar de ter subido três posições face ao ano anterior, o país continua abaixo da média europeia em investimento privado em I&D e apresenta dificuldades estruturais na transferência de conhecimento científico para o tecido empresarial.

Entre o otimismo e a prudência

O Portugal Capital Markets Day é organizado pela Euronext Lisboa e pela AEM – Associação de Empresas Emitentes de Valores Cotados em Mercado, com investidores provenientes de 12 praças financeiras internacionais, incluindo Nova Iorque, Londres, Paris, Singapura e Zurique. “Isto também revela o interesse que existe neste momento por Portugal e aquilo que conseguimos, enquanto organização, mobilizar investidores para olharem para as empresas portuguesas e para Portugal”, afirmou Isabel Ucha, presidente da Euronext Lisboa aos jornalistas

A responsável sublinhou o caráter único do evento, destacando a parceria com a Universidade Católica para conferir “rigor académico” à apresentação do país. “Este relatório foi feito especificamente para esta conferência, portanto vai ser divulgado em primeira mão no evento”, acrescentou Isabel Ucha, referindo ainda que o ministro das Infraestruturas e Habitação participará num jantar no dia 12 de novembro para aprofundar os temas do relatório.

Miguel Ataíde Marques, presidente da AEM, destacou a “atratividade de Lisboa” como fator decisivo para trazer investidores internacionais. “A atratividade de Lisboa faz com que, naturalmente, haja uma predisposição para nos visitarem e verem as nossas empresas”, afirmou, sublinhando que o evento vai “para além de uma estreita visão de mercados públicos”, abrangendo também mercados privados, venture capital e private equity.

“Houve uma grande transformação da economia portuguesa” a partir de 2012, defende Filipe Santos, salientando, por exemplo, o facto de a dívida pública ter caído de 131,5% do PIB em 2016 para 93,6% em 2024, e o país registado excedentes orçamentais nos últimos anos.

O estudo da Católica aponta vantagens estruturais inegáveis: Portugal tem 35% do mix energético total proveniente de renováveis e 70% da eletricidade gerada por fontes limpas, liderança na cobertura de fibra ótica e 5G, e uma taxa de desemprego histórica de 5,8%. A balança corrente transformou-se de negativa numa década para positiva, a dívida pública caiu de 131,5% do PIB em 2016 para 93,6% em 2024, e o país registou excedentes orçamentais nos últimos anos.

“Houve uma grande transformação da economia portuguesa” a partir de 2012, defende Filipe Santos, referindo a adaptação ao choque da globalização e da troika. O responsável pela Católica Lisbon Business & Economics destacou ainda que “cada milhão de euros investido em I&D em Portugal gera em média oito empregos qualificados”, evidenciando o potencial multiplicador do investimento em ciência e tecnologia.

Porém, a distância entre as potencialidades estruturais e a concretização de investimento efetivo em inovação permanece como interrogação central. Numa altura em que a Europa debate a sua competitividade face aos EUA e à China, Portugal posiciona-se como destino atrativo para centros de competência de multinacionais e investimentos em data centers, mas continua a investir significativamente menos que os seus pares europeus nas atividades que poderão garantir crescimento sustentável a longo prazo.

O Portugal Capital Markets Day pode ajudar a captar investimento estrangeiro, mas a transformação estrutural da economia dependerá da capacidade de reverter o défice crónico em I&D que os números teimam em evidenciar.

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