Cada vez mais portugueses procuram alternativas a depósitos. Investidores em ETF duplicaram, avança a Blackrock

Os portugueses estão a trocar a inércia dos depósitos pelos mercados de capitais. Jovens e mulheres lideram a mudança, mas a literacia financeira ainda é frágil, revela um estudo da Blackrock.

Em Portugal, guardar todas as poupanças no banco em depósitos a prazo está a cair em desuso, pelo menos para metade dos investidores nacionais, que “fugiram” dos depósitos à medida que o valor das poupanças diminuía à vista de todos (pelo efeito corrosivo da inflação).

Foi justamente esse marasmo que fez disparar o ímpeto por alternativas nos últimos três anos: desde 2022, o número de portugueses a investir em fundos cotados (usualmente conhecidos como ETF) duplicou para um milhão, revela a mais recente edição do estudo “People & Money” da Blackrock, que inquiriu mais de 40 mil adultos em 15 países europeus.

Os dados contam a história de uma democratização dos investimentos em Portugal, sobretudo entre os mais jovens. No entanto, a mesma fotografia revela fragilidades gritantes: continuam a faltar conhecimentos sólidos de literacia financeira, o que deixa muitos a navegar à vista e aumenta o risco nas decisões de investimento.

A terceira edição do inquérito da Blackrock, conduzida entre agosto e outubro deste ano pela Yougov, sublinha as motivações e lacunas dos investidores portugueses. Metade afirma que começou a investir porque percebeu que o dinheiro preso nos depósitos não crescia, enquanto quase quatro em cada dez apontam a vontade de assumir as rédeas do seu futuro financeiro e um terço descobriu, também, que não era preciso uma fortuna para dar o primeiro passo.

“Isto reflete um reconhecimento crescente de que investir pode ser uma via para construir segurança financeira a longo prazo”, afirma Timo Toenges, responsável para a riqueza digital na EMEA da Blackrock, em comunicado.​

Portugal tem atualmente cerca de um milhão de investidores em fundos cotados em bolsa (ETF), quase o dobro face a 2022, quando este número rondava os 500 mil, o que representa cerca de 3% do total europeu.

Estes dados contrastam com o que se observou no ano passado, quando Portugal registou uma queda de 12% no número de novos investidores nos dois anos anteriores, sendo o país com a maior retração entre os 14 analisados em 2024.

Nessa altura, a Blackrock atribuiu o fenómeno aos baixos níveis de literacia financeira e à elevada percentagem – 43% – de investidores portugueses que detinham criptoativos, quase o dobro da média europeia de 22%. “Quem tem mais literacia financeira vai investir menos em criptoativos”, referiu André Themudo, diretor da Blackrock em Portugal, na apresentação do estudo de 2024.

Um dos fenómenos mais marcantes revelados pelo estudo deste ano é a explosão dos Exchange-Traded Fund (ETF). Segundo o estudo, Portugal tem atualmente cerca de um milhão de investidores em ETF, quase o dobro face a 2022, quando este número rondava os 500 mil, o que representa cerca de 3% do total europeu. Atualmente, um em cada três investidores portugueses (33%) detém ETF, uma percentagem que coloca Portugal no quarto lugar entre os 15 mercados analisados, apenas atrás da Alemanha (55%), Áustria (37%) e Suíça (35%).

A nível europeu, os ETF tornaram-se o terceiro produto de investimento mais detido, ultrapassando os criptoativos, com 32,8 milhões de investidores na região – um crescimento de 69% face a 2022, destaca o estudo da Blackrock.

“A investigação mostra que os ETF estão a tornar-se rapidamente o produto de investimento de eleição para as gerações mais jovens”, refere Timo Toenges, notando que “a sua simplicidade, baixo custo e facilidade de acesso tornam-nos ideais para investidores iniciantes – especialmente aqueles motivados por ver outros a fazer crescer a sua riqueza e não quererem ficar de fora.”

Segundo o estudo, quase metade dos investidores portugueses em ETF (47%) aponta-os como uma excelente forma de começar a investir, enquanto mais de um terço (37%) refere a possibilidade de investir pequenas quantias regularmente. Cerca de 30% valorizam os ETF por proporcionarem exposição a tendências ou indústrias específicas.

Tornar o investimento um hábito regular, mesmo com pequenas quantias, é uma das formas mais eficazes de alcançar bem-estar financeiro a longo prazo.

André Themudo

Diretor da Blackrock em Portugal

Entre todos os grupos etários analisados no relatório “People & Money” deste ano, os millennials mais jovens (25-34 anos) destacam-se como os mais propensos a começar a investir depois de aprenderem mais sobre o tema e perceberem que não era tão complexo como pensavam. Os dados do estudo mostram ainda que o crescimento da adoção de ETF entre investidores foi mais rápido entre mulheres (60% desde 2022) e entre investidores com idades entre os 25 e os 34 anos (52%).

Mas são também muitos os desafios que se colocam como bloqueio ao investimento, a começar pelo grau de literacia financeira que permanece a ser um fator diferenciador nas escolhas de investimento dos portugueses. Enquanto o conhecimento sobre ETF permanece misto – um terço (33%) dos adultos portugueses nunca ouviu falar de ETF, mas mais de um terço (35%) reporta pelo menos um entendimento básico –, os dados europeus mostram que a compreensão varia substancialmente: na Alemanha, 48% dos adultos têm pelo menos um conhecimento básico dos ETF, contra apenas 17% no Reino Unido.

Fonte: Relatório “People & Money 2025”.

Quando questionados sobre os cinco principais comportamentos de um investidor confiante e capaz, os investidores portugueses colocam a diversificação no topo, com 50% a apontá-la como prioritária, seguida por reservar dinheiro regularmente (47%). Entre os não investidores, as prioridades diferem: 48% apontam reservar dinheiro regularmente como fundamental, seguido por compreender os riscos envolvidos (44%).

“Sabemos que construir riqueza é sobre consistência, não sobre acertar no momento certo do mercado”, refere André Themudo, diretor da BlackRock em Portugal, notando ainda que “tornar o investimento um hábito regular, mesmo com pequenas quantias, é uma das formas mais eficazes de alcançar bem-estar financeiro a longo prazo.”

As várias edições do “People & Money” têm também destacam um conjunto de desafios estruturais que têm bloqueado o aumento ainda mais prenunciado do nível de investidores em Portugal. Segundo o estudo de 2024, por exemplo, entre os portugueses que não investem, 69% apontam a falta de dinheiro como principal razão, um valor superior à média europeia. O conhecimento financeiro continua também a ser uma barreira relevante, com as gerações mais novas em Portugal, que são também as que mais apostam em criptoativos, a reportarem não ter conhecimentos financeiros suficientes para investir.

Além disso, a dicotomia entre o elevado interesse em criptoativos – que representam investimentos de alto risco e especulação – e a reconhecida aversão ao risco da maioria dos portugueses, com mais de 50% do património financeiro das famílias ainda alocado em depósitos bancários com pouca ou nenhuma remuneração, evidencia a necessidade de uma maior educação financeira.

Os dados do “People & Money 2025” confirmam que o investimento está a democratizar-se em Portugal e na Europa, mas também que o caminho para uma literacia financeira sólida e escolhas de investimento informadas ainda exige esforços significativos de educação e regulação.

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