Sarah Carlson, analista da Moody's, deixa nas entrelinhas que haver apenas mais uma injeção no Novo Banco trará poupanças para as contas públicas e por isso é positivo para o rating de Portugal.
O dinheiro do Fundo de Resolução para o Novo Banco pode vir a ser antecipado e injetado de uma só vez no banco este ano. É uma possibilidade que está em cima da mesa e que o primeiro-ministro, António Costa, já considerou como vantajosa porque eliminará “incerteza” em relação ao futuro. Para a Moody’s, tudo o que significar poupanças do Estado com a instituição financeira — que já recebeu 2.000 milhões de euros através do mecanismo de capital contingente e poderá receber mais 1.400 milhões — é bem-vindo e terá “implicações diretas” no rating do país.
Em entrevista ao ECO, Sarah Carlson, analista da agência rating que atribuiu a pior notação a Portugal entre as principais agências, abordou ainda o Orçamento do Estado para 2020 (OE2020). Considera que a “aprovação atempada” do documento é um sinal positivo para a estabilidade política de um Governo minoritário na legislatura.
Sobre o caso do Luanda Leaks, a responsável fez tabu do tema. Ainda assim, se teve impacto no setor financeiro, a avaliação que a Moody’s faz das instituições portuguesas é tão ampla que leva Carlson a considerar que a polémica foi apenas um “incidente”.
A Moody’s estima um excedente orçamental para este ano. Mas há sinais de que, em 2019, Portugal já tenha registado um saldo positivo. É uma surpresa positiva?
O que diria no caso de Portugal é o que digo para qualquer país: excedentes orçamentais permitem reduzir a dívida pública, por isso, são positivos para o perfil de crédito. Obviamente que quanto maior a redução da dívida pública, tendo em conta o peso da dívida em Portugal, excedentes orçamentais são positivos para o perfil de crédito.
Mário Centeno deverá deixar o cargo de ministro das Finanças para ir para o Banco de Portugal. A acontecer, esta saída poderá ter impacto naquilo que perceção de uma agência de rating em relação a Portugal?
O mais importante na nossa avaliação não é individualizar as questões, nem torná-las pessoais. Num país com instituições tão fortes como Portugal tem, mudanças de pessoas nos cargos não será algo importante em termos de qualidade creditícia do país.
Centeno é visto como o “Ronaldo” das Finanças. Poderá ter impacto na avaliação dos investidores?
Não é relevante para a nossa discussão. Olhamos para os fundamentais de crédito de médio e de longo prazo e não para mudanças de pessoal.
Qual a sua opinião sobre o OE2020 que foi recentemente aprovado pelo Parlamento?
Estimamos um pequeno excedente orçamental para 2020. Tendo em conta que estamos perante um Governo minoritário, o facto de se ter conseguido aprovar o OE2020 atempadamente é um sinal positivo para o funcionamento do Governo ao longo da legislatura. Há um desafio adicional para um Governo minoritário. Isto não é anormal acontecer, mas ver como o Governo é capaz de gerir uma situação política mais complexa é algo que pode contribuir para a previsibilidade.
É negativo para Portugal ter um Governo minoritário, uma vez que cria incerteza quanto ao futuro?
Não. O que estou a dizer é que governos minoritários criam complexidade adicional na aprovação das políticas. Mas temos visto vários países em todo o mundo, incluindo na Europa, funcionando perfeitamente bem com governos minoritários. O Orçamento do Estado foi um teste importante e o facto de ter sido aprovado atempadamente foi um sinal positivo para o funcionamento deste Governo minoritário.
Disse na conferência que a Moody’s não olha apenas para os grandes números, também analisa os detalhes: onde o Governo está a gastar o seu dinheiro…
Olhamos para a composição do Orçamento: de onde vêm as receitas e a forma como o Governo as gasta, para ver coisas como quão rígidas estão as contas públicas.
E estão a ficar mais rígidas, foi o que disse na conferência.
Sim, e é um risco. Despesas sociais, salários no setor público são mais rígidas do que outras formas de despesa.
Poderá ser um problema para Portugal?
Num cenário de stress, sim. Torna mais difícil encontrar fundos para outras áreas no caso de o governo precisar de o fazer.
Também dificulta a redução da dívida pública?
Num cenário de crescimento negativo, a redução da dívida torna-se mais desafiante. É por isso que fazemos testes de stress. No nosso pior cenário, vimos que Portugal continua a ser capaz de reduzir a dívida pública, mas de uma forma mais lenta do que poderia fazê-lo num cenário base.
A Moody’s acompanhou as negociações no Parlamento em torno do OE2020?
Acompanhamos mas de forma mais geral. O importante para nós é o resultado político e depois ver como as decisões políticas vão sendo tomadas e o que isso significa para os números no final do ano.
Acompanhou as negociações entre os partidos para a redução do IVA da luz?
Estivemos a par disso, faz parte da nossa monitorização regular. Mas não é relevante para a avaliação do rating porque, mais uma vez, o importante é o resultado final.
Tendo em conta que estamos perante um governo minoritário, o facto de se ter conseguido aprovar o Orçamento do Estado para 2020 atempadamente é um sinal positivo para o funcionamento do Governo ao longo da legislatura.
Portugal financiou-se esta quarta-feira com juros negativos. Na Grécia, o juro a dez anos está abaixo de 1%. Estamos perante uma bolha nas obrigações soberanas?
O que vemos é o resultado de um ambiente nas taxas de juros de low-for-long, estamos a assistir a uma redução dos custos de financiamento dos governos. São claramente boas notícias para as contas públicas. Mas não estou em posição de dizer se há ou não uma bolha. Contudo, uma das coisas que sabemos é que as agências de gestão da dívida pública estão a optar por bloquear as taxas de juros mais baratas de hoje nos prazos mais longos. O facto de os governos estarem a financiar-se com estes juros e a longo prazo, isto significa a redução da fatura com juros que os governos beneficiam atualmente será capaz de suportar futuras subidas das taxas.
Algumas instituições pediram mais ambição na redução da dívida tendo em conta o atual cenário dos juros baixos. A redução que Portugal teve foi suficiente, tendo em conta as circunstâncias?
Não tenho uma definição do que é “suficiente”. Um dos fatores que explicam a melhoria do outlook do rating de Portugal tem a ver com as expectativas para a descida da dívida pública e o ambiente de juros baixos foi algo tido em conta.
"De uma perspetiva orçamental, obviamente que quanto menos dinheiro o Governo tiver de gastar com o Novo Banco, as implicações no crédito soberano são muito diretas.”
Luanda Leaks é um tema importante para uma agência de rating?
Não tenho comentários a fazer sobre isso.
Mas não é algo que as agências de rating tem de monitorizar?
Estamos a par do que se está a passar, de uma forma geral, nos países. Mas o tipo de problemas que o caso Luanda Leaks levanta são institucionais. As instituições são muito importantes para os ratings soberanos. A nossa definição de “força das instituições” é muito ampla. É muito, muito mais ampla do que este único incidente. Mas não tenho nada a dizer em específico sobre o Luanda Leaks.
O Luanda Leaks afetou a credibilidade dos bancos?
Não tenho mais nada a dizer sobre o Luanda Leaks.
Fala-se na possibilidade de haver apenas mais uma única injeção do Novo Banco, no valor de 1.400 milhões. É uma boa solução para Portugal?
De uma perspetiva orçamental, obviamente que quanto menos dinheiro o Governo tiver de gastar, as implicações no crédito soberano são muito diretas.
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Quanto menos dinheiro for injetado no Novo Banco melhor será para o rating, diz Moody’s
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