Os 4 negócios suspeitos de Vieira e do “Rei dos frangos”
Amigos de longa data, Luís Filipe Vieira e José António dos Santos estão juntos em negócios que estão a levantar dúvidas às autoridades, incluindo a OPA à SAD do Benfica e a dívida da Imosteps.
Luís Filipe Vieira e José António dos Santos, acionista do Benfica também conhecido como “Rei dos frangos”, deverão ser ouvidos esta quinta ou sexta-feira, isto após terem passado a última noite na prisão. As autoridades investigam eventuais crimes de fraude ao Fundo de Resolução, de abuso de confiança no Benfica e de burla qualificada com os financiamentos do Novo Banco ao grupo económico Promovalor.
Amigos de longa data (há mais de 50 anos), ambos estão envolvidos em operações que levantaram muitas dúvidas. Algumas das quais estão agora na mira da justiça. O DCIAP fala em negócios e financiamentos de mais de 100 milhões que está a passar a pente fino.
O “jackpot” de 14 milhões para o Rei dos Frangos
Em 2019, José António dos Santos esteve prestes a ganhar um “jackpot” de 14 milhões de euros quando o Benfica (clube) lançou uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre 28% do capital da SAD encarnada no final daquele ano.
O “Rei dos frangos” é o maior acionista individual da SAD, com uma posição de mais de 12%. As ações foram adquiridas à Somague e ao Novo Banco em 2017, em operações que representaram um investimento global de cerca de 3 milhões de euros.
Na OPA, lançada com o argumento de se proteger em relação a investidores hostis, o clube liderado por Luís Filipe Vieira oferecia cinco euros por ação, quando o título negociava na bolsa nos 2,76 euros. Ou seja, oferecia aos acionistas do Benfica (incluindo José António dos Santos) um prémio de 81%. Para o Rei dos Frangos, a oferta permitiria uma mais-valia de 11 milhões face ao investimento feito dois anos antes.
Só que o polícia dos mercados levantou dúvidas em relação à OPA, com várias questões sobre como ia ser financiada (estava em causa um investimento de 32 milhões). A Comissão do Mercado de Valores Mobiliário viria a chumbar a operação em maio do ano passado.
Rei dos frangos compra dívida de Vieira e liberta avales pessoais
O episódio foi contado na primeira pessoa por Luís Filipe Vieira na comissão de inquérito ao Novo Banco. Em 2019, o banco vendeu uma dívida de 50 milhões de uma empresa chamada Imosteps, controlada por Vieira, por cerca de cinco milhões ao fundo americano Davidson Kempner, com perdas para o Fundo de Resolução.
Mais tarde, esta dívida foi comprada por José António dos Santos (através do fundo Iberis Semper) por oito milhões, permitindo que Luís Filipe Vieira ficasse liberto dos avales pessoais que tinha dado neste crédito.
“Acho que ele fez um bom negócio”, disse o presidente do Benfica aos deputados há cerca de dois meses. “Apareceu aquele fundo americano a falar com o José Gouveia [diretor financeiro da Promovalor], que me contou o que se estava a passar. Quando [o fundo] fez a oferta de oito milhões, eu disse ao Zé [António dos Santos] que estava aqui um bom negócio e disse-lhe que só queria as garantias para este lado. Queria libertar os avales”, contou Luís Filipe Vieira no Parlamento.
O timing da OPA (que daria uma mais-valia de 11 milhões a José António dos Santos) e deste negócio levantou dúvidas aos deputados. Ambos são amigos há mais de 50 anos.
Vieira também admitiu aos deputados que o tema da Imosteps lhe causa “calafrios”, tendo confessado que a sociedade lhe foi parar às mãos depois de um pedido de Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, para resolver alguns problemas com ativos que a empresa detinha no Brasil.
Amigo assume dívida avalizada por Vieira
Foi José António dos Santos a salvar a pele de Luís Filipe Vieira na Imosteps? A dúvida dos deputados pode encontrar algum enquadramento histórico.
Em 2017, no mesmo ano em que se tornou acionista da Benfica SAD, José António dos Santos assumiu parte das responsabilidades de uma empresa de pneus da Amadora perante uma dívida ao Novo Banco que estava em incumprimento e da qual Luís Filipe Vieira era avalista, segundo o Expresso.
A sociedade David Maria Vila, que entrou em insolvência em 2019, controlava uma outra, a Sociedade de Pneus do Oriente (SPO), da qual Luís Filipe Vieira foi sócio até 2012, com uma participação de 9,3%. Em 2017, a David Maria Vilar negociou uma reestruturação com o Novo Banco, a quem devia 330 mil euros. Mais de 20% deste financiamento já estava em incumprimento em abril desse ano.
Através de uma empresa criada em maio de 2017, a Página Relâmpago, o presidente da Valouro acabou por assumir as responsabilidades.
Banco de Portugal com muitas dúvidas sobre reestruturação
Em 2018, parte da dívida do grupo de Vieira (Promovalor) no Novo Banco foi reestruturada com a transferência de créditos e ativos para um fundo gerido pela C2 Capital Criativo, de Nuno Gaioso Ribeiro, ex-vice-presidente do Benfica, que também foi alvo de buscas esta quarta-feira.
No âmbito desta operação, foram transferidos créditos na ordem dos 134 milhões de euros do Novo Banco para o FIAE (em troca de 96% das unidades de participação do fundo), tendo sido ainda reestruturados pelo banco financiamentos existentes de 85,8 milhões de euros. Foram integrados no fundo mais de duas dezenas de ativos imobiliários localizados em Portugal, Espanha, Brasil e Moçambique, negócios que servirão para pagar as dívidas junto do Novo Banco.
Só que esta reestruturação levantou muitas dúvidas ao Banco de Portugal. O regulador considerou que o plano de recuperação das dívidas (através dos ativos imobiliários) era “ambicioso e pouco realista” e tinha “pouca aderência à realidade”.
Também deixou críticas às elevadas comissões que a C2 Capital Criativo vai receber por estar a gerir estes ativos (até 15 milhões de euros), sendo que a escolha desta sociedade também mereceu reparos devido aos conflitos de interesse e relações de proximidade entre as duas partes.
Havia “acionistas comuns” e “relações/interesses de índole comercial/profissional comuns” entre a Promovalor e a C2 Capital Partners, apontou o Banco de Portugal. Designadamente, lembrou o facto de Tiago Vieira, filho do presidente do Benfica, ter participações diretas em ambos os lados e ser também administrador da sociedade gestora, enquanto Nuno Gaioso Ribeiro, fundador da C2 Capital Partners, exercia também o cargo de vice-presidente do clube encarnado. Isso já não acontece atualmente.
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