“Para cisões artificiais criadas por fins políticos e demagógicos não contem comigo”, diz bastonário dos advogados

O Bastonário da Ordem dos Advogados, João Massano, encerrou a 8ª edição da Advocatus Summit. Na sua intervenção referiu que o seu Conselho Geral enfrenta muitos desafios relativamente à advocacia.

“A primeira garantia que deixo aqui – e que também foi outro dos ataques de que fui alvo – é que comigo não há separação entre advocacias. Não há separação entre a prática societária e o apoio judiciário, nem entre a prática individual e a prática societária, ou qualquer outra distinção que queiram fazer”. O bastonário da Ordem dos Advogados, João Massano, encerrou a 8ª edição da Advocatus Summit. Na sua intervenção referiu que o seu Conselho Geral enfrenta muitos desafios relativamente à advocacia, e que é necessário tomar muitas decisões que impactarão a classe.

“Para cisões artificiais criadas por fins políticos e demagógicos não contem comigo. Não as farei. Sempre defendi, e continuarei a defender, que todos somos Advogados, independentemente da área de prática e das diferenças que, não nego, existem. Por isso, serei o Bastonário (como já disse várias vezes) de todos e não apenas de uma parte da classe, muito menos contra outra parte da mesma classe”, disse o bastonário.

Referindo- se à Inteligência Artificial, disse ainda que a mesma “levanta-nos diversos problemas. Ainda esta semana, no âmbito da procuradoria ilícita, interrogava-me sobre a possibilidade de haver procuradoria ilícita praticada, por exemplo, pelo ChatGPT – o que é, de facto, uma questão. Não vamos estar a ‘processar’ o ChatGPT, mas não deixa de ser curioso o risco que daí advém, ainda para mais sabendo nós da evolução vertiginosa que está a acontecer com estas plataformas. Muito especificamente, falo de uma ferramenta da Google que me foi apresentada esta semana e que me deixou francamente – por um lado – maravilhado com o tempo que me permite poupar, pois é capaz de redigir articulados com um grau muito satisfatório. Naturalmente exige programação, e aí está a grande vantagem desta plataforma. Uma das coisas que nos têm sido vendidas – a nós, Advogados – é que um bom escritório de Advocacia que queira sobreviver no futuro precisa de ter a Inteligência Artificial ao seu lado, a funcionar da forma mais correta e eficaz possível, e… um engenheiro informático”.

Veja aqui o vídeo na íntegra:

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O bastonário da Ordem dos Advogados disse ainda que “a advocacia e o seu Bastonário estiveram, nos últimos cinco ou seis anos, numa posição quase de líder da oposição. E isso prejudicou-nos imenso. Basta ver o que está à nossa volta. A nossa classe foi claramente prejudicada por termos estado de costas voltadas para o Ministério da Justiça. Pelo menos, já há fotografias do Bastonário com a Ministra da Justiça — o que já é uma vantagem. Já andamos nas redes sociais. Mas espero que, para além do folclore das redes sociais, consigamos alcançar mudanças concretas na prática da profissão. É por isso que vou lutar”.

 

“A descredibilização da Justiça não serve à sociedade. Só serve a quem quer explorar brechas, desinformação e fake news para fazer passar uma mensagem e minar as instituições. Por mais que se goste ou não da Procuradora-Geral da República, do Bastonário da Ordem dos Advogados ou da Ministra da Justiça, precisamos de uma Justiça forte e credível. Só essa serve toda a gente”, disse ainda o advogado João Massano. “Só essa permite a convivência social de que tanto precisamos”.

E sugeriu que é necessário “partir a reforma da Justiça em pedaços mais pequenos, para que pelo menos alguma coisa se faça.
E não passemos o tempo apenas a falar em reformas”.

A Advocatus Summit realizou-se nos dias 29 e 30 de maio. Naquela que já é a sua 8ª edição, este ano o evento realizou-se no Auditório da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

Durante duas manhãs, reunimos alguns dos principais nomes da advocacia de negócios em Portugal para debater os grandes temas que moldam a prática jurídica: Fiscalidade, governance e compliance, investimento em Portugal, Cibersegurança e IA, Concorrência e direitos do consumidor, Agribusiness, smart cities e o papel do advogado em projetos cross-border.

O principal evento que liga a advocacia aos agentes empresariais e da economia é uma iniciativa ECO e ADVOCATUS que conta com o apoio de: Abreu Advogados, CMS Portugal, CS’Associados, Deloitte Legal, EY Law, Morais Leitão, Pérez-Llorca, PLMJ, PRA – Raposo, Sá Miranda & Associados, Proença de Carvalho, PwC Portugal, Sérvulo & Associados, SRS Legal, TELLES e Vieira de Almeida.

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Hoje nas notícias: Eleições presidenciais, imigração e Lone Star

  • ECO
  • 20 Junho 2025

Dos jornais aos sites, passando pelas rádios e televisões, leia as notícias que vão marcar o dia.

Luís Marques Mendes encurta a distância para Henrique Gouveia e Melo nas intenções de voto do barómetro da Intercampus para as eleições presidenciais. O Governo quer pôr fim à exceção legislativa que permite que cidadãos brasileiros e timorenses que entram como turistas no país possam pedir autorizações de residência. Conheça estas e outras notícias em destaque na imprensa nacional esta sexta-feira.

Sondagem: Gouveia e Melo afunda com subida de Marques Mendes

O barómetro da Intercampus de junho para o Correio da Manhã, a CMTV e o Jornal de Negócios mostra que as intenções de voto em Henrique Gouveia e Melo nas eleições presidenciais caíram depois de o militar na reserva ter confirmado e apresentado a candidatura. Embora se mantenha como o preferido para suceder a Marcelo Rebelo de Sousa, o ex-chefe da Armada tem 27,3% das intenções de voto, menos 8,3 pontos percentuais face ao barómetro de março. Luís Marques Mendes, por sua vez, ganhou terreno, ao crescer de 13,9% para 18,5% entre as duas sondagens. Mesmo num cenário de segunda volta entre Gouveia e Melo e Marques Mendes, a distância reduziu: o militar surge com 41,1% das intenções de voto, menos 10,5 pontos percentuais em relação a março, enquanto o antigo líder do PSD subiu 6,9 pontos, para 35,4%.

Leia a notícia completa no Correio da Manhã (acesso pago)

Governo quer fim da exceção para brasileiros e timorenses

O Governo vai alterar o regime que permite a cidadãos brasileiros e timorenses que entrem em Portugal como turistas, e por isso sem necessidade de visto, poderem pedir uma autorização de residência no país, de modo a que só possam aceder à autorização de residência se entrarem em Portugal com visto para obtenção de autorização de residência ou visto de trabalho. O Executivo de Luís Montenegro teme que esta facilidade prevista em acordos bilaterais possa vir a tornar-se uma espécie de “manifestação de interesse light”. Ainda ninguém teve acesso a este regime, porque a regulamentação da lei não está concluída, mas a entrada de vários milhares de processos na Justiça para obrigar a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) a analisar os pedidos fez soar alarmes.

Leia a notícia completa no Expresso (acesso pago)

Lone Star ganhou 1,7 milhões de euros por dia com o Novobanco

Entre a entrada no capital, em outubro de 2017, com uma injeção de 1.000 milhões de euros, e o anúncio do acordo para a venda ao BPCE, em 13 de junho, em que recebeu cerca de 1.000 milhões de dividendos e vendeu a participação de 75%, a Lone Star teve um ganho diário de 1,7 milhões de euros com o Novobanco. Como o acordo prevê que a tomada de controlo pelo grupo francês só ocorra em 2026, o fundo norte-americano pode vir ainda engordar o seu encaixe total com a aposta que fez no antigo BES.

Leia a notícia completa no Expresso (acesso pago)

“Procuramos sinergias de receitas, alavancado a experiência do BPCE”, diz CEO

O CEO do Banque Populaire – Caisse d’Épargne (BPCE) assinala que a aquisição do Novobanco irá “reforçar” a presença do grupo francês na Europa e “está perfeitamente alinhada” com a sua ambição de crescer. “O nosso plano estratégico, divulgado há um ano, previa o nosso crescimento em três círculos: França, Europa e o resto do mundo. A dimensão e a solidez do Novobanco, que é o quarto maior banco comercial português, com uma quota de mercado de 9% em clientes particulares e de 14% em clientes empresariais, estão em linha com esta ambição”, aponta Nicolas Namias, em declarações ao Jornal Económico. Não tendo uma rede bancária de retalho em Portugal, não poderá contar com sinergias pelo lado dos custos. “Em vez disso, procuramos obter sinergias de receitas, alavancando a vasta experiência do BPCE”, refere.

Leia a notícia completa no Jornal Económico (acesso pago)

Baixas de curta duração estão a custar seis dias de salário aos doentes

Entrar de baixa logo após uma autodeclaração de doença (ADD) está a gerar uma perda de seis dias de salário para o doente. Este período equivale aos três dias de faltas justificadas ao trabalho com a ADD, que não são pagas, a par com os primeiros três dias do certificado de incapacidade temporária (CIT), que também não são pagos pela Segurança Social. Embora o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social garanta que há uma exceção legal para que o trabalhador seja abrangido apenas por um período de espera de três dias até à atribuição do subsídio de doença, a realidade é outra, o que pode ter que ver com dificuldades no cruzamento da informação.

Leia a notícia completa no Jornal de Notícias (acesso pago)

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+M

“São muitos os humoristas que investem o seu tempo a justificar que é só uma piada” por “medo de serem cancelados”

As fronteiras do humor são tema de discussão em Portugal e no Brasil. A advogada Ana Rita Duarte de Campos e o produtor Hugo Nóbrega são unanimes: os limites são os da liberdade de expressão.

“Também tenho uma opinião sobre a interpretação do hino e deste processo judicial, mas, como fiz alguns investimentos recentemente, neste momento receio não ter liquidez suficiente para dá-la. Fica para outra vez”. A frase com que Ricardo Araújo Pereira termina a crónica “Os Anjos acham que nós somos anjinhos”, no Expresso, resume o caso que fez as delícias das redes sociais na última semana. Apesar de na génese estar uma piada, e de os episódios em tribunal terem provocado certamente muitas gargalhadas durante os últimos dias, a humorista Joana Marques está a responder no âmbito de um processo em os Anjos lhe exigem uma indemnização superior a um milhão de euros, na sequência de um vídeo que mostrava partes da atuação da dupla constituída por Nelson e Sérgio Rosado, antes de uma prova do MotoGP em Portimão, a cantar o hino, intervalada com reações do júri do programa “Ídolos”. O caso remonta a 2022. Numa primeira fase, que aconteceu em 2024, terá sido tentado um acordo em audiência preliminar, que não foi alcançado.

Um humorista pode ser condenado a uma pena de prisão por uma piada? Um sketch pode causar mais de um milhão de euros de danos aos visados?

Os limites do humor estão em discussão também no Brasil, país onde o humorista Leo Lins foi este mês de junho condenado a oito anos e três meses de prisão e ao pagamento de uma multa de 1,4 milhões de reais (cerca de 220 mil euros), por piadas ditas no YouTube, também em 2022. Neste caso, a sentença terá identificado 13 discursos preconceituosos e discriminatórios contra nordestinos, idosos, homossexuais, portadores de VIH, negros, obesos, judeus, evangélicos, indígenas e portadores de deficiência.

O produtor Hugo Nóbrega, que a título de exemplo traz por estes dias a Portugal o “Céu da Língua”, espetáculo de Gregório Duvivier, distingue os temas. “No caso da Joana Marques, estamos a discutir, quanto a mim, o direito das pessoas mencionadas numa peça humorística de pedirem indemnização por danos à reputação, e não os limites do humor”, aponta.

Hugo Nóbrega, fundador da H2N

“Problemas técnicos são infelizmente comuns em eventos que não foram pensados para atuações, como é o caso da MotoGP. Penso que a maioria dos ouvintes entendeu que o acontecimento não se deveu a má preparação dos Anjos. E quem está na área musical, como agente ou contratante, consegue discernir sobre isso e não colocar a responsabilidade na falta de talento ou profissionalismo dos Anjos. Portanto, custa-me aceitar a ideia de que após este momento, existiram cancelamentos na área profissional devido a este episódio”, descreve. “Conseguimos entender que os Anjos considerem que o conteúdo foi altamente manipulado, de forma a que a narrativa tivesse mais graça. Mas creio que a responsabilidade pelos danos causados à reputação da banda deve ser analisada em relação ao evento e à organização do mesmo e não às peças humorísticas sobre o mesmo”, defende o fundador da H2N.

Hugo Nóbrega diz não acreditar numa condenação e defende que Joana Marques, ao não apagar o vídeo, apenas quis mostrar que o conteúdo humorístico não deve ser retirado porque alguém se sente ofendido. “É um tema bastante sensível, para mais entre colegas do setor artístico, onde é normal que entendam que tem de existir uma empatia e uma não ofensa entre pares. E a Joana Marques, enquanto humorista não se vê nessa necessidade de posição empática, por achar quanto a mim, que o riso deve ser transgressor e que cabe também a quem assiste conseguir relevar. O risco muitas vezes é este”, resume.

“As consequências são totalmente diferentes como vemos no caso do Leo Lins. À luz da Justiça brasileira, pode estar em causa a propaganda de conteúdos racistas e xenófobos, considerados crime, mesmo num contexto de palco e de espetáculo. A decisão pode vir a ser revertida no recurso, acredito que sim, mas há que tem em conta que no Brasil temas de ordem racial são claramente red flags, como um não assunto de comédia, dada a história tão recente de opressor e oprimido”, enquadra.

No caso da Joana Marques, por seu turno, falamos de direito cível e de danos reputacionais, na opinião de Hugo Nóbrega “muito difíceis de relacionar”, até porque “há ali no momento uma falha técnica que torna todo o momento estranho no mínimo para quem assiste”. Ora, “e é aí que normalmente o humorista entra, com o seu olhar cómico, acutilante, mas dentro dum conteúdo relativo ao acontecimento em si, que todos admitimos que é bastante editado e manipulado, mas que quanto a mim não tem uma base de ofensa gratuita aos visados, mas sim ao contexto daquele momento”, distingue o produtor.

No Brasil, quem defendeu o humorista no que concerne à sua liberdade de expressão, foi altamente cancelado e “obrigado” a retratar-se. Em Portugal, a nova série “Ruído”, criada pelo Bruno Nogueira, leva-nos para um mundo onde o riso foi proibido. São muitos os humoristas que investem o seu tempo a justificar, primeiro, que é só uma piada, e segundo a explicarem a própria piada, com medo de serem cancelados, pela má interpretação da mesma.

Hugo Nóbrega

Fundador da H2N

Ana Rita Duarte de Campos, sócia contratada da Abreu Advogados e especialista em Direito Penal, esclarece que uma sentença idêntica à de Leo Lins não podia acontecer em Portugal. “Esta sentença tem que ver, sobretudo, com a aplicação de normas penais recentes cujo alcance, sobretudo fora do Brasil, penso que ninguém anteciparia”, defende a especialista.

“Muito já foi dito no espaço público e eu concordo que o humor, enquanto arte, goste-se mais ou menos do humorista ou da piada concretos, encerra uma dimensão hiperbólica, de redução ao absurdo e de crítica e, muitas vezes, de condenação de atitudes através da sua aparente emulação. Digo aparente porque quem não perceber isto não percebe o que é o humor, enquanto expressão artística”, comenta a advogada. “Isto não foi tido em linha de conta pela decisão proferida, que assentou na qualificação dos crimes pela circunstância de terem ocorrido no contexto artístico e não apenas pelo facto de terem sido difundidos em plataformas de streaming (tendo o Tribunal, em momento anterior do processo, determinado que o vídeo em questão fosse retirado)”, prossegue. Mais, “desconsiderar as características do discurso humorístico é fazer equivaler pensamento a ação penal, e esse caminho também é muito perigoso. Basta ler o “1984”, de Orwell que, também por esta razão, está cada vez mais atual”, aponta.

Ana Rita Duarte de Campos acrescenta outro ponto. “É ainda de notar que a apropriação estadual de determinados bens jurídicos individuais, sob o manto das tarefas do Estado, pode levar a resultados perniciosos e o exemplo está à vista, na escalada que vai de crimes de injúria, para crimes de racismo que, de repente, permitem que o Ministério Público Federal se transforme em polícia de costumes e que a multiplicação das “injúrias”, por via da teoria do concurso de crimes dê amparo à pena única e à multa absurdas em que Leo Lins foi condenado”.

Ana Rita Duarte de Campos, sócia contratada da Abreu Advogados e especialista em Direito Penal

O ​ contexto do Brasil, em que estamos a assistir a um processo crime vindo do Estado, é ainda diferente de Portugal, onde alguns casos que levaram a acusações ficaram na esfera do processo cível, reforça Hugo Nóbrega.

Contudo, é um tema que preocupa bastante os humoristas, sejam ou não a favor desta condenação. “No Brasil, quem defendeu o humorista no que concerne à sua liberdade de expressão, foi altamente cancelado e “obrigado” a retratar-se. Em Portugal, a nova série “Ruído”, criada pelo Bruno Nogueira, leva-nos para um mundo onde o riso foi proibido. São muitos os humoristas que investem o seu tempo a justificar, primeiro, que é só uma piada, e segundo a explicarem a própria piada, com medo de serem cancelados, pela má interpretação da mesma”, constata o produtor.

Recentemente em Lisboa, assistimos a um humorista claramente transgressor como Ricky Gervais, a fazer um disclosure no final do show, alertando de que isto é um show, não a sua opinião real. Para muitos, este prólogo foi altamente estranho, para outros altamente importante — ambos riram dessas piadas durante o espetáculo”, acrescenta como exemplo.

Hugo Nóbrega diz não ser propriamente fã do género dark , embora reconheça que humoristas com carreiras nesta área de comédia, como Jimmy Carr (UK) ou o fenómeno recente Anthony Jeselnyk (USA) têm uma legião de fãs, “que riem de piadas moralmente inaceitáveis, completamente transgressoras de qualquer limite, mas que são surpreendidos na atuação pelo que é dito, pela forma como é entregue o texto, num contexto de espetáculo, que pagaram para assistir”.

Também polémico, acrescenta, é o recente foco em crowd work — onde o fenómeno aclamado no TikTok Matt Rife (19M seguidores) tem o seu mais recente especial na Netflix, só a interagir e a fazer troça do público, que pagou um bilhete sabendo que pode calhar a qualquer um ser gozado de forma hostil.

No seu caso, enquanto programador e produtor de festivais de comédia com artistas nacionais e internacionais, Hugo Nóbrega opta por trazer o que define como um humor afiado, inteligente e atual, fugindo a um género mais brejeiro. Sendo a programação algo de pessoal e subjetivo, o produtor diz-se “feliz por ter optado por declinar certos artistas, por entender que a proposta base vinha dum mau princípio, de ofensa pura, e não de rir, sem conteúdo bem preparado — apesar de ser polémico e ter público” e, por outro lado, “por ter trabalhado com grandes nomes do humor nacional e internacional, que tendo um humor transgressor, conseguem ter um olhar que nos surpreende pela forma como a piada é entregue”.

A Porta dos Fundos, com quem trabalha há cerca de 10 anos, tem um histórico de frequentemente bater no opressor e não no oprimido. “Em algumas polémicas eles retrataram-se, em outras não, por entenderem que de forma alguma o teriam de fazer. Mas ao terem sido alvo dum atentado em 2019 na sua sede por parte de grupos que se consideraram ofendidos, nomeadamente em assuntos de religião e de homossexualidade, ficou bem patente o risco e o medo que existe à volta do humor e que num mundo extremado como o de hoje, tende a piorar”, conclui.

O humor, enquanto arte, goste-se mais ou menos do humorista ou da piada concretos, encerra uma dimensão hiperbólica, de redução ao absurdo e de crítica e, muitas vezes, de condenação de atitudes através da sua aparente emulação. Digo aparente porque quem não perceber isto não percebe o que é o humor, enquanto expressão artística.

Ana Rita Duarte de Campos

sócia contratada da Abreu Advogados e especialista em Direito Penal

Tal como o produtor, Ana Rita Duarte de Campos vê os limites do humor como os da liberdade de expressão. “Mesmo considerando as especificidades do discurso humorístico, é possível que alguém se sinta ofendido por uma determinada piada. Isso pode dar origem a um processo-crime ou a uma ação de indemnização que, na esmagadora maioria dos casos, não levam, em Portugal, a decisões condenatórias”, aponta.

Tal acontece porque, ao contrário do Brasil, “não só não abdicamos de considerar o discurso artístico especial, bem como, para além da questão da liberdade de expressão, protegemos a liberdade de criação artística”.

“É preocupante ver um país como o Brasil, onde a expressão artística (humor, literatura, música) tiveram um papel fundamental no combate à ditadura, num país que é e sempre foi um portento artístico, o legislador penal ser mais severo relativamente aos factos que possam (tendo relevância criminal) ocorrer na esfera artística. E isto é um lamentável retrocesso jurídico, histórico e cultural”, conclui a especialista em Direito Penal.

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Fitch avalia subir rating do Novobanco após venda ao BPCE

Depois da Moody's agora é a Fitch que anunciam que se a aquisição do Novobanco pelo Groupe BPCE for concluída com sucesso é possível que o rating venha a subir.

A Fitch vai avaliar uma possível subida do rating do Novobanco agora que foi adquirido pelos franceses do BPCE, porque vai beneficiar da integração de um grupo internacional.

Num comunicado ao mercado, a instituição liderada por Mark Bourke anunciou que a Fitch colocou as notações de risco de incumprimento longo e curto prazo em Rating Watch Positive. Atualmente são de BBB e F2, respetivamente

“Esta ação de notação financeira reflete “a perspetiva da Fitch de que o Novobanco, caso seja adquirido pelo Groupe BPCE”, que tem uma notação A com perspetiva Estável, “beneficiará muito provavelmente do apoio do acionista, com notação financeira superior”, lê-se no comunicado publicado esta sexta-feira a CMVM.

“Após a conclusão da aquisição, a Fitch baseará provavelmente” as notações de risco de incumprimento do Novobanco “no apoio do acionista e atribuirá um Shareholder Support Rating (SSR)”. A Fitch prevê reanalisar o Rating Watch Positive aquando da conclusão da transação, acrescenta a mesma nota.

Já a Moody’s optou, a 17 deste mês, por reafirmou as notações financeiras do Novobanco, incluindo a notação da dívida sénior unsecured em Baa1 com outlook positivo. Mas a integração no segundo maior grupo bancário francês, que agrega instituições como o Banque Populaire, Caisse d’Epargne, Natixis, entre outros, poderá no futuro ditar uma subida do rating.

A Moody’s refere também que “uma subida da notação financeira dos depósitos a longo prazo e da dívida sénior unsecured poderá ser motivada por uma melhoria do seu BCA ajustado. O BCA ajustado do banco poderá ser revisto em alta: (1) se a aquisição do banco pelo Groupe BPCE for concluída com sucesso; ou (2) se as melhorias recentes no seu perfil de crédito e no ambiente operacional dos bancos portugueses se mantiverem nos próximos 12 a 18 meses”.

A Moody’s atribui ao BPCE uma notação financeira da dívida de longo prazo de A1, com outlook estável.

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5 coisas que vão marcar o dia

  • ECO
  • 20 Junho 2025

Os ministros das Finanças da UE reúnem-se para debater uma série de temas. O INE mostra a evolução dos preços na produção industrial e o Banco de Portugal divulga dados sobre emissões de títulos.

Em dia de reunião do Ecofin, a União Europeia divulga o indicador flash de confiança do consumidor relativo a junho, enquanto o Banco de Portugal divulga dados sobre emissões de títulos. É também esta sexta-feira que termina o prazo para manifestação de interesse nas gigafábricas de inteligência artificial, no mesmo dia em que o Instituto Nacional de Estatística mostra como evoluíram os preços na produção industrial.

Ecofin volta a reunir-se

Os ministros das Finanças dos 27 Estados-membros da União Europeia voltam a reunir-se esta sexta-feira. Em cima da mesa estão temas como a reforma da união aduaneira, a adoção do Euro pela Bulgária ou os preços da energia. O Conselho de Ministros das Finanças da União Europeia (Ecofin) procurará também adotar recomendações relativas aos planos orçamentais-estruturais nacionais de médio prazo e poderá adotar decisões e recomendações no âmbito do procedimento relativo aos défices excessivos, bem como adotar decisões de execução para aprovar os planos de recuperação e resiliência alterados que foram apresentados por oito Estados-Membros.

Como evolui confiança do consumidor europeu?

A União Europeia divulga esta manhã o indicador flash de confiança do consumidor relativo a junho. Em maio, a estimativa provisória para o indicador de confiança do consumidor aumentou 1,4 pontos percentuais tanto na UE quanto na zona do euro, revertendo parcialmente as perdas significativas do mês anterior.

Banco de Portugal divulga dados sobre emissões de títulos

O Banco de Portugal (BdP) divulga dados relativos às emissões de títulos do mês de maio. As estatísticas de emissões de títulos (mercado primário) compreendem informação relativa aos títulos emitidos (ações cotadas e títulos de dívida) por entidades residentes, no mercado interno e externo, nas suas várias componentes (emissões líquidas e stock). Serão ainda conhecidos dados relativos ao financiamento das administrações públicas.

INE revela dados de produção industrial

Também o Instituto Nacional de Estatística (INE) vai divulgar esta sexta-feira o Índice de Preços na Produção Industrial, referente ao mês de maio. Segundo o Eurostat, os preços na produção industrial aumentaram, em abril, 0,7% na zona euro e 0,6% na União Europeia (UE), com Portugal a registar a segunda maior quebra (-2,4%), na comparação homóloga.

Termina o prazo para manifestação de interesse nas gigafábricas de IA

Termina esta sexta-feira o prazo para responder à manifestação de interesse nas gigafábricas de inteligência artificial (IA), para responder à ambição da Comissão Europeia de instalar sete centros de IA no território europeu. A PortugalDC e o Banco de Fomento realizaram uma candidatura nacional.

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O dia em direto nos mercados e na economia – 20 de junho

  • ECO
  • 20 Junho 2025

Ao longo desta sexta-feira, 20 de junho, o ECO traz-lhe as principais notícias com impacto nos mercados e nas economias. Acompanhe aqui em direto.

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Custo, tempo e falta de incentivos travam aprendizagem contínua

Novo estudo indica que quase nove em cada dez portugueses consideram a aprendizagem ao longo da vida importante para o desenvolvimento profissional, mas há obstáculos, como o custo e o tempo exigido.

Quase nove em cada dez portugueses reconhecem a importância da aprendizagem ao longo da vida, de acordo com um novo estudo. Mas apontam obstáculos a essa aposta, como os custos, a falta de incentivos e o tempo necessário para levar a cabo estas ações de formação.

O estudo “Tomorrow’s Skills” tem por base as respostas de 15 mil pessoas de 15 países, das quais mil em Portugal. Ora, nessa centena de inquiridos portugueses, 86% consideram a aprendizagem ao longo da vida “bastante ou muito importante” para o seu desenvolvimento pessoal, sendo essa das maiores fatias entre os vários países analisados.

Os portugueses identificam como áreas chave a tecnologia e digitalização, as línguas, a saúde e bem-estar, as soft skills e as ferramentas de trabalho.

“Este relatório revela que o paradigma tradicional de estudar apenas uma vez na vida já não é suficiente num mundo em constante mudança económica, tecnológica e social”, é explicado, numa nota enviada às redações.

No entanto, uma parte relevante dos portugueses aponta também entraves à aposta na formação. De acordo com este estudo, 47% dos inquiridos em Portugal apontam o custo como barreira à aprendizagem ao longo da vida, seguindo-se o tempo (26% dos inquiridos), a falta de incentivos ou reconhecimento (24%), a falta de compromisso ou apoio das empresas (24%) e a falta de interesse das empresas (21%).

Principais barreiras:

47% Custo;
26% Tempo;
24% Falta de incentivos ou reconhecimento;
24% Falta de compromisso ou apoio da empresa;
21% Falta de interesse da empresa.

Estas duas últimas barreiras são particularmente relevantes, tendo em conta que quase metade dos inquiridos portugueses (48%) consideram que deve caber às empresas garantir a formação ao longo da vida. Em contraste, só 23% indicam que essa aprendizagem é da responsabilidade dos próprios e 28% indicam o setor público como o responsável.

Empregabilidade e eficiência motivam aposta

Por outro lado, quanto às principais razões para apostar na aprendizagem contínua, 37% indicam a necessidade de se adaptarem a mudanças no mercado de trabalho e às novas tecnologias, enquanto 35% identificam o aumento da eficiência e produtividade no local de trabalho.

três em cada dez (30%) dos portugueses ouvidos acreditam que devem abraçar a formação, como forma de impulsionar a empregabilidade e a sua competitividade profissional, enquanto 27% sublinham que aprender adiciona-lhes valor dentro das organizações. Por outro lado, 26% indicam como motivo o desenvolvimento de uma mentalidade de aprendizagem contínua.

Principais motivos:

37% Adaptar-se a mudanças no mercado e a novas tecnologias;
35% Aumentar eficiência e produtividade;
30% Impulsionar empregabilidade;
27% Somar valor dentro da organização;
26% Desenvolvimento uma mentalidade de aprendizagem contínua.

Quanto ao futuro do trabalho, entre os portugueses ouvidos, a maioria (81%) considera que a aprendizagem ao longo da vida será vital e, embora reconheça que surgirão empregos novos, está confiante na sua capacidade de continuar competitivo no mercado de trabalho (74%). Ainda assim, 64% admitem que “subir” a escada corporativa — isto é, progredir na carreira — deverá tornar-se mais difícil.

E no que diz respeito às disciplinas que serão mais procuradas na aprendizagem contínua nos próximos cinco ano, a Inteligência Artificial e a ciência dos dados aparecem em destaque, a par da tecnologia e digitalização, da saúde e bem-estar, da sustentabilidade e da gestão.

Metade dos portugueses acredita que a experiência prática e a formação não formal (autodidatismo, cursos, workshops) serão mais importantes que os diplomas formais.

Tomorrow's Skills

“O relatório indica ainda que metade dos portugueses acredita que a experiência prática e a formação não formal (autodidatismo, cursos, workshops) serão mais importantes que os diplomas formais, evidenciando a necessidade de adaptação a um mercado em constante transformação”, é realçado em comunicado.

A propósito, nos 15 países analisados no “Tomorrow’s skills”, Portugal destaca-se (juntamente com Itália e Espanha) como um dos países com opinião mais favorável em relação às plataformas digitais de aprendizagem e desenvolvimento profissional: mais de metade (57%) dos inquiridos consideram o impacto destas plataformas como muito positivo e 65% mostram abertura para utilizar este tipo de plataformas.

Este relatório foi apresentado este mês pela presidente do Banco Santander, Ana Botín, num evento em que participou também a presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola.

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Quem são os novos contabilistas e auditores? As mulheres dominam e a tecnologia ajuda

As profissões de contabilista e de auditor atraem hoje milhares de candidatos, ajudando a renovar o perfil dos profissionais nestas áreas dominadas no passado por homens.

Mulheres, com mais literacia digital e formações diversas. Este é o perfil dos novos contabilistas e auditores que estão a entrar no mercado, muito diferente da imagem de antigamente que refletia uma carreira sobretudo de homens e dominada por tarefas repetitivas e pouco apelativas. O digital veio para ficar e ajudar a dar um novo impulso a estas profissões que estão a tornar-se novamente atrativas e a ganhar espaço entre os mais jovens.

“A Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC) como entidade reguladora tem perfeita noção de que a atração da profissão principalmente junto dos mais jovens não era a melhor, todavia foi feito nos últimos anos um trabalho muito sistemático para inverter a tendência, principalmente junto das escolas, tanto secundárias como do ensino superior”, refere Hélio Silva, consultor da OCC, ao EContas.

“Atualmente esse trabalho já começou a dar frutos, pois o nível de empregabilidade na profissão é extremamente elevado e com melhores remunerações. Começam também a existir novas categorias profissionais dentro da área de contabilidade e fiscalidade que anteriormente não existiam, principalmente ligadas ao IT e ao marketing”, acrescenta.

O fator tecnológico tem ajudado precisamente a dar este salto. “A profissão continua a ser atrativa, mas de forma diferente do que era no passado. A profissão evoluiu — e muito. Tornou-se altamente tecnológica. A IA, as plataformas digitais de reporte e as ferramentas de automação vão acelerar esse verdadeiro processo de transformação, que esperemos resulte numa maior atratividade da nossa profissão”, nota Virgílio Macedo, bastonário da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (OROC).

A profissão continua a ser atrativa, mas de forma diferente do que era no passado. A profissão evoluiu — e muito. Tornou-se altamente tecnológica.

Virgílio Macedo

Bastonário da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas

A par da profissão, o “perfil dos candidatos também está a evoluir”. De acordo com o bastonário, “temos jovens com formações mais diversificadas, com maior literacia digital e uma apetência natural para trabalhar com tecnologia. Muitos trazem também um olhar mais crítico, mais sensível a temas como a ética, a sustentabilidade e o impacto social”.

Por outro lado, “temos também assistido a um aumento da presença feminina na profissão. Há cada vez mais mulheres a entrar e a destacar-se, eu diria que é uma evolução natural. É um desafio transversal à sociedade e ao setor, e na OROC temos sido ativos na promoção de políticas inclusivas e de valorização do mérito”.

Novas regras de acesso atraem mais candidatos

O mesmo acontece entre os contabilistas. “A diversidade de formação académica é notória, com muitos novos contabilistas provenientes de áreas como gestão, economia e tecnologias da informação, além da tradicional contabilidade”, nota Hélio Silva. Já do ponto de vista do género, “em 2024 possuíam inscrição ativa na OCC 38.342 mulheres contra 30.996 homens, pelo que é fácil constatar que as mulheres têm desempenhado um papel cada vez mais proeminente, tanto na prática profissional quanto em cargos de liderança dentro da OCC”.

Paula Franco, bastonária da OCC, revelou, em entrevista ao EContas, que “tivemos 5.000 candidatos no ano passado, quando antes eram 800”, sendo que a “grande maioria são jovens e mulheres”. Um salto que se deveu muito à mudança das regras de acesso.

Em 2024, possuíam inscrição ativa na OCC 38.342 mulheres contra 30.996 homens, pelo que é fácil constatar que as mulheres têm desempenhado um papel cada vez mais proeminente, tanto na prática profissional quanto em cargos de liderança dentro da OCC.

Hélio Silva

Consultor da Ordem dos Contabilistas Certificados

“O trabalho [de atrair mais pessoas] já foi feito e começou com a alteração da lei-quadro das ordens profissionais e consequente alteração do estatuto da ordem dos contabilistas certificados através do DL68/2023 de 7 de dezembro, o novo estatuto veio reformular e simplificar as regras de acesso à profissão”, explica Hélio Silva, consultor da OCC.

Ajustar a formação à nova realidade

Por outro lado, “temos de mudar a forma como falamos sobre a profissão. Mostrar que um Revisor Oficial de Contas hoje não é apenas alguém que valida números, mas sim um analista, um conselheiro estratégico, alguém com um papel relevante na solidez do sistema económico, que acrescenta valor acrescentado aos seus clientes”, frisa Virgílio Macedo, bastonário da OROC. É também preciso adaptar a formação a esta nova realidade.

“A formação tem de acompanhar a evolução da realidade. Hoje já não é possível preparar um Revisor apenas com essa estrutura clássica. É essencial introduzir matérias como ciência de dados, análise preditiva, cibersegurança, IA, comunicação e gestão de risco”, aponta. Um trabalho que tem sido feito na Ordem, reforçando o “diálogo com instituições de ensino superior para alinhar currículos com as competências realmente exigidas pelo mercado”.

Também a OCC “trabalha em estreita colaboração com a academia, tanto do ponto de vista conceptual, através da unidade curricular do projeto de simulação empresarial que dá acesso à profissão de forma mais simplificada, como também na colaboração em diversos, congressos, conferências, seminários e workshops sobre as temáticas que envolvem a profissão”, diz Hélio Silva.

Isto além de disponibilizar “de forma gratuita o Toconline Ensino a todas as instituições protocoladas, de forma a assegurar que para além do conhecimento conceptual os candidatos a profissionais disponham de uma réplica em contexto formativo daquilo que os espera do ponto de vista prático no mercado de trabalho, como forma de promover uma maior rapidez e adaptabilidade do conhecimento teórico às práticas existentes nas empresas”.

É também preciso ajustar a remuneração para tornar a profissão mais atrativa. Como o EContas escreveu, um inquérito realizado pela OCC mostra que “91% [dos inquiridos] considera que não recebe uma remuneração justa face à importância dos serviços prestados e às competências e habilitações necessárias ao exercício da profissão”.

As baixas avenças, aliás, fazem parte da lista de principais barreiras ao crescimento da atividade apontadas pelos profissionais. Isto além da deslealdade entre pares, a inteligência artificial, burocracia, formação e excesso de legislação.

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Rival europeia da Starlink com operação na Madeira procura financiamento para se manter à tona

A Eutelsat precisa de levantar capital para manter a constelação de satélites que adquiriu em 2023. A empresa opera o teleporto do Caniçal e diz-se um dos maiores exportadores de serviços do país.

A Eutelsat, rival europeia da Starlink, que opera um teleporto na Madeira e “faz parte da lista dos maiores exportadores de serviços de Portugal”, está à procura de um financiamento “significativo” para se manter à tona, perante a concorrência feroz da empresa norte-americana fundada por Elon Musk.

Em 2023, a empresa com sede nos arredores de Paris adquiriu a constelação de satélites de baixa órbita OneWeb, num negócio de cerca de três mil milhões de euros. A empresa anunciou então, num comunicado, que a fusão posicionava o grupo para “ser um líder global nas comunicações espaciais”, contando atualmente com 36 satélites geoestacionários e cerca de 600 satélites de baixa órbita — designados por Low Earth Orbit, ou LEO na sigla original em inglês. Estes últimos são vistos como a tendência mais recente no setor, em detrimento dos geoestacionários (também conhecidos por GEO).

Porém, a concorrência da Starlink, que tem mais de 7.000 satélites LEO e está a crescer a grande velocidade, alcançando já seis milhões de clientes em 140 países, tem levantado fortes desafios à Eutelsat, noticiou recentemente a Bloomberg. Não menos importante é o facto de a Starlink ser detida pela empresa de foguetões de Musk, a SpaceX, beneficiando de importantes sinergias, especialmente no lançamento.

Especificamente na Península Ibérica, o crescimento da Starlink terá acelerado depois do ‘apagão’ de 28 de abril, incluindo em Portugal, principalmente graças ao desconto de quase 50% feito pela empresa de Elon Musk no preço do equipamento necessário para se aceder à rede. Em alguns estabelecimentos de retalho nacionais, as antenas da Starlink Mini com router integrado voaram das prateleiras, como constatou o ECO no Auchan do Fórum Almada em meados do mês de maio.

À luz deste cenário, a Eutelsat tem vindo a trabalhar num plano de financiamento: Claramente, teremos agora de ir para um financiamento significativo”, admitiu em maio o CFO da Eutelsat, Christophe Caudrelier, durante uma chamada com analistas. “Temos discussões em andamento, diria, com potenciais fornecedores de capital, e estamos a avaliar várias soluções”, acrescentou, reconhecendo, novamente, que as necessidades de capital do grupo representam um “montante significativo”, sem adiantar um valor.

Questionada pelo ECO sobre as atuais necessidades de financiamento, a empresa não quis comentar. No entanto, fonte oficial recusou a ideia de que o grupo enfrenta concorrência da empresa de Elon Musk, sublinhando que “a Eutelsat não é um player B2C como a Starlink”, focando-se “apenas nos segmentos B2B e B2G” — dito de outra forma, que os clientes do grupo são “apenas” empresariais e governamentais, e não consumidores.

Todavia, em abril, Joanna Arlington, chefe do departamento de Comunicação e Relações de Investimento da Eutelsat, reconheceu numa entrevista à Renascença que existe um “interesse efetivo em saber se a Eutelsat poderia ser um substituto da Starlink”.

A Eutelsat opera o teleporto do Caniçal, na MadeiraD.R.

Segundo a Bloomberg, os problemas da Eutelsat poderão contagiar vários governos europeus, visto que a empresa é tida como estratégica perante o domínio tecnológico dos EUA. Aliás, aos analistas, o CFO admitiu que a empresa tem tido “muitas discussões com diferentes governos”, incluindo países europeus e “não só”, que procuram serviços de conectividade por satélite de origem “alternativa” aos EUA e à China. E em abril, num claro exemplo do valor estratégico desta empresa europeia, a Reuters noticiou que a Alemanha estava a pagar pelo serviço da Eutelsat para fornecer internet por satélite à Ucrânia.

O Governo francês, que se diz particularmente atento à situação, poderá ser chamado a fazer parte da solução para a Eutelsat, na medida em que França detém 13,59% da empresa. O processo até já estará em curso, com a Bloomberg a avançar que o Governo de França tem vindo a negociar com duas empresas francesas e com o governo britânico uma injeção de 1,5 mil milhões de euros na Eutelsat. Instada a confirmar esta informação, a empresa não comentou. O Reino Unido detém 10,89% da Eutelsat, enquanto o grupo indiano Bharti Global — maior acionista da British Telecom –, é dono da maior fatia do capital, 24,09%.

De resto, a Eutelsat também tem enfrentado alguma instabilidade interna. Recentemente, a anterior CEO, Eva Berneke, terá sido afastada, em simultâneo com a saída de quatro outros executivos, dando lugar a Jean-François Fallacher, anterior CEO da Orange, que assumiu a liderança da empresa de satélites este mês. De saída do grupo esteve também Dominique D’Hinnin, então chairman.

Já esta semana, o novo CEO encarou as informações de que a empresa esteja numa parca situação financeira. “Deixe-me corrigir um mal-entendido: a Eutelsat não está com dificuldades financeiras. Não. A Eutelsat tem uma necessidade de financiamento. Há uma diferença. Precisamos de financiamento para desenvolver a constelação [OneWeb] e continuar o nosso crescimento, que já começou e tem sido significativo, e para preservar esta capacidade estratégica única”, terá afirmado o gestor no Paris Air Show, citado pelo site Advanced Television.

Da Madeira para o espaço

Em Portugal, a Eutelsat detém a subsidiária WorldVu Unipessoal Lda. — de momento sem atividade — e apresenta-se como Eutelsat Madeira, empresa registada na Zona Franca da Madeira, com apenas um acionista, a Eutelsat SA. Em junho de 2022, a operadora espanhola de internet por satélite Eurona adquiriu à Eutelsat um portefólio de cerca de 1.000 clientes de internet por satélite, incluindo em Portugal, o que permitiu à Eurona anunciar a entrada no mercado português três meses depois. “A Eutelsat terminou todas as suas operações de distribuição de retalho em 2022”, confirmou ao ECO fonte oficial da empresa.

Nesse mesmo ano, num parecer enviado à Anacom ao abrigo de uma consulta pública sobre alocação de espetro para o 5G, a Eutelsat informou que “opera atualmente um teleporto localizado no Caniçal, Madeira, com mais de dez estações terrestres, ligadas à monitorização e controlo da frota do grupo e ao projeto Konnect, também do grupo, e com desenvolvimentos em curso no seu roteiro”.

A empresa afirmou-se ainda como “um dos maiores exportadores regionais”, fazendo “parte da lista dos maiores exportadores de serviços em Portugal, contribuindo ativamente para o PIB regional e nacional”, sublinhou.

Portugal foi um dos 17 membros fundadores da Eutelsat em 1977, enquanto entidade intergovernamental designada por Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite, com o objetivo de fornecer “o segmento espacial necessário para a prestação de serviços de telecomunicações internacionais da Europa, incluindo serviços de radiodifusão”, recorda a Anacom. Décadas mais tarde, em 2001, os ativos da Eutelsat acabariam por ser transferidos para uma empresa privada, por ocasião da liberalização do setor das telecomunicações na Europa.

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Juventude de Braga junta-se à indústria para transformar lençóis e toalhas em novas peças de roupa

Coleção que transforma têxteis em fim de vida surge da parceria entre o Centro de Juventude de Braga, a re.store e a Escola Profissional do Minho.

As toalhas e os lençóis em fim de vida do Centro de Juventude de Braga (CJB) deram origem a uma coleção de moda sustentável com cerca de 35 peças, que foi apresentada esta quarta-feira no auditório do CJB.

“No ano passado percebemos que tínhamos lençóis e toalhas danificados, que estavam inclusive guardados, mas não queríamos que fossem parar ao lixo e sempre tentamos perceber de que forma podíamos dar-lhe uma segunda vida”, explica ao ECO a diretora no Centro de Juventude de Braga, Ana Rita Ribeiro.

Com esta ideia em mente, Ana Rita Ribeiro reuniu-se com a fundadora da re.store, Sílvia Correia, e decidiram juntar outro parceiro, a Escola Profissional do Minho (EsproMinho). Os alunos do curso de design de moda foram desafiados a criar um projeto com o intuito de dar uma segunda vida aos lençóis e às toalhas.

Durante seis meses foi feita a estruturação do projeto em conjunto com os parceiros. Os alunos receberam formação de empresas externas nas áreas de marketing, comercial, logística, compras, design de produto, recursos humanos, no sentido de lançar as bases para um projeto.

“A ideia sempre foi transformar peças que possam vir a ser vendidas e usadas, e não só um processo criativo”, refere a diretora no Centro de Juventude de Braga, destacando ainda os planos para criar uma loja online para vender estes produtos e continuar o processo. “Isto é, no fundo, um pontapé de saída”, diz Ana Rita Ribeiro.

“Todos este processo é feito pelos alunos, apesar de a re.store estar envolvida e coordenar”, destaca a diretora do centro, realçando que a loja online e o modelo de negócios ficarão a cargo destes jovens. “O objetivo é estimular o empreendedorismo e capacitar os jovens“, resume a diretora do Centro de Juventude de Braga.

“Estamos muito orgulhosos do empenho e da maturidade demonstrada pelos nossos alunos. Este é o tipo de aprendizagem transformadora que queremos continuar a promover”, diz António Teixeira, diretor pedagógico da Esprominho, citado em comunicado.

A gestora revela que, para futuro, o desafio passa por dar oportunidade aos alunos de criar produtos a partir da reciclagem dos tecidos do Centro de Juventude de Braga para serem usados pelos hóspedes, como por exemplo chinelos e toucas.

Além do desfile e de uma breve contextualização sobre o processo criativo, o evento contou também com a iniciativa Swappers, uma troca de roupa e de livros aberta à comunidade.

Desde que foi criada há cinco anos, a empresa bracarense, que só utiliza desperdícios da indústria têxtil, já reutilizou 9,1 toneladas de materiais têxteis e acessórios e remunerou os parceiros sociais em mais de 67 mil euros.

Em 2023, a fundadora da re.store, que conta com mais de duas décadas de experiência no cluster, explicou ao ECO que de “pegam no lixo do têxtil e transformam em produtos funcionais“. “Para além de reduzir a pegada ecológica da têxtil, aliamos a questão social — todos os nossos produtos sem exceção são confecionados por IPSS, associações que ajudam a integrar refugiados, entre muito outros”, disse Sílvia Correia.

Localizado no centro de Braga, o Centro de Juventude é uma unidade de negócio criada no seio da InvestBraga e conta com 26 quartos.

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Governo vai transpôr diretivas europeias em atraso “com urgência” para evitar processo em tribunal

  • Lusa
  • 19 Junho 2025

O Governo disse que vai transpor, com a "máxima urgência", as diretivas da União Europeia (UE) que têm de ser adotadas na lei nacional, após a Comissão Europeia ter anunciado um processo em tribunal.

O Governo assumiu que vai transpor, com a “máxima urgência”, as diretivas da União Europeia (UE) que têm de ser adotadas na lei nacional, após a Comissão Europeia ter anunciado um processo em tribunal devido a tal falha.

A Comissão Europeia anunciou na quarta-feira que vai processar Portugal no Tribunal de Justiça da União Europeia por não ter transposto para o direito nacional regras para impostos especiais sobre o consumo e harmonização dos relativos a álcool e bebidas alcoólicas. Portugal é o único Estado-membro que não transpôs integralmente as disposições destas diretivas para o direito nacional.

Questionado esta quinta-feira, à margem da reunião do Eurogrupo no Luxemburgo, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, garantiu: “Vamos retomar este dossier com a máxima urgência”.

“Quando nós chegámos [ao executivo], há um ano – e posso apenas falar pelo Ministério das Finanças -, nós tínhamos cerca de uma dúzia de diretivas e regulamentos por transpor. Alguns já tinham passado o prazo, outros os prazos estavam prestes a terminar e nós tínhamos a diretiva praticamente pronta quando o parlamento chumbou a moção de confiança”, altura em que “o Governo passou a estar em gestão” e “não poderia” fazer a transposição, justificou. “Nós transpusemos grande parte delas [diretivas pendentes], mas há outras que foram ao parlamento e o parlamento acabou por não as conseguir aprovar, dado a dissolução do parlamento”, adiantou o governante.

Em causa, segundo um comunicado do executivo comunitário, está a falta de notificação, por Lisboa, da transposição de duas leis europeias sobre impostos especiais sobre o consumo – Diretiva (UE) 2020/262 e a Diretiva (UE) 2020/1151, que deveriam estar plenamente adotadas até 31 de dezembro de 2021.

Todos os Estados-membros da UE estavam obrigados a colocar em vigor a legislação necessária para transpor e a comunicar imediatamente o texto dessas medidas à Comissão Europeia.

De acordo com a informação divulgada, em 28 de janeiro de 2022, foram enviadas duas cartas de notificação para cumprir, seguidas de pareceres fundamentados — a segunda etapa do processo de infração, em 15 de julho de 2022.

Segundo o executivo comunitário, apesar de Portugal ter comunicado várias medidas nacionais, ainda estão em falta algumas disposições para transpor estas diretivas na íntegra.

A Comissão Europeia considera que os esforços envidados pelas autoridades competentes até à data são insuficientes, pelo que decidiu instaurar uma ação contra Portugal no Tribunal de Justiça da União Europeia solicitando a aplicação de sanções financeiras.

Estão em causa diretivas referentes ao regime geral dos impostos especiais de consumo com regras comuns em matéria de produção, armazenamento e circulação dos produtos sujeitos abrangidos e à certificação à escala do bloco para os pequenos produtores de álcool, que lhes permite beneficiar mais facilmente de taxas reduzidas do imposto especial de consumo em toda a UE.

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Portugal convergiu com a UE à custa do abrandamento dos outros países

Novas prioridades da Comissão Europeia arriscam fragmentar e dispersar as verbas da Política de Coesão, alerta o Tribunal de Contas Europeu. Foco deve ser reduzir as desigualdades entre as regiões.

A convergência de Portugal com a União Europeia foi feita à custa do abrandamento das regiões com melhor desempenho, diz o relatório do Tribunal de Contas europeu divulgado esta quinta-feira.

“Em Portugal, a convergência regional resultou do crescimento mais lento nas regiões com desempenho anteriormente elevado. Já em França, o aumento das disparidades entre regiões esteve associado a um crescimento mais lento naquelas com PIB mais baixo”, lê-se no relatório da instituição liderada por Tony Murphy, publicado num momento em que está em preparação o próximo quadro comunitário de apoio, o pós-2027.

Considerando que “os padrões de convergência económica refletem dinâmicas nacionais diversas”, o Tribunal de Contas Europeus dá ainda o exemplo, do “crescimento mais forte nas regiões capitais dos Estados-membros do Leste europeu que, frequentemente, aumenta as disparidades nestes países”. Não esquecendo a armadilha do desenvolvimento, o tribunal recorda que nem os países mais desenvolvidos estão a salvo do risco de entrar em longos períodos de estagnação económica.

A Política de Coesão da UE disponibilizou cerca de um bilião de euros entre 1989 e 2023 e as previsões são de mais 400 mil milhões até 2027, o que “a torna a maior política de desenvolvimento regional do seu género no mundo”. Todos os anos, um terço do orçamento comunitário vai para a Política de Coesão.

A Comissão espera que a Política de Coesão continue a ter um efeito económico positivo duradouro em geral. Os cálculos de Bruxelas apontam para que o PIB da UE possa ser “potencialmente 0,9% superior até 2030 e mais 0,6% superior até 2043, devido aos investimentos em coesão realizados entre 2014-2020 e 2021-2027”. “Prevê-se que este impacto positivo no PIB seja particularmente benéfico para os países que recebem montantes mais elevados de financiamento da coesão, mas também para os países mais desenvolvidos, através do aumento da atividade económica devido ao aumento das exportações”, lê-se no relatório.

Dada a sua importância, o TCE considera que é necessário retirar lições do passado para construir uma melhor política de coesão, já que “não é executada da melhor maneira”. Alejandro Blanco Fernández, o membro do TCE responsável pelo documento, elenca as várias condições que influenciam o impacto da política de coesão como a qualidade das instituições nacionais e regionais, o capital humano disponível em cada região e outros recursos territoriais. “Estes fatores podem influenciar a eficácia do financiamento da coesão e podem ajudar a explicar a variação dos resultados desta política entre as diferentes regiões e Estados-membros”, diz.

O TCE sublinha que, ao longo do tempo, a Política de Coesão teve de abranger um conjunto cada vez maior de prioridades e objetivos da UE. E “porque tem à sua disposição bastantes recursos, muitas vezes também tem sido usada para responder a situações imprevistas”, a pandemia, o fluxo de refugiados da Ucrânia em 2022, são apenas dois exemplos.

Embora reconheça que é importante haver flexibilidade na utilização do dinheiro, o TCE alerta que isto dispersa as verbas da Política de Coesão e poder desviá-las do seu fim principal: reduzir as desigualdades entre as regiões. “É fundamental que os objetivos da futura política continuem ligados às necessidades de desenvolvimento de cada região e centrados no aumento da convergência económica e social”, defende a instituição.

É fundamental que os objetivos da futura política continuem ligados às necessidades de desenvolvimento de cada região e centrados no aumento da convergência económica e social.

Tribunal de Contas Europeu

Recordando que o documento publicado esta quinta-feira não é um tradicional relatório de auditoria, mas antes uma avaliação com base em trabalhos anteriores, o tribunal quer contribuir para a discussão que se iniciará dentro de semanas do pós-2027.

“O quadro da política de coesão foi concebido para proporcionar aos Estados-membros e às suas regiões uma orientação estratégica a longo prazo e previsibilidade. Ao mesmo tempo, as regras da Política de Coesão limitam a flexibilidade dos Estados-membros para reatribuírem fundos durante o período do programa, a fim de responderem às suas necessidades em evolução”, sublinha o tribunal. “A reprogramação dos fundos da política de coesão é o principal mecanismo disponível para as autoridades de gestão”, acrescenta, revelando que verificaram que “os objetivos dos programas nem sempre refletem necessidades específicas”

Portugal está precisamente a levar a cabo a reprogramação do Portugal 2030, sendo esta uma semana importante de reuniões e negociações, tal como o ECO noticiou.

O Tribunal de Contas Europeus considera que as propostas da Comissão no âmbito da revisão intercalar de 2025, correm “o risco de aumentar a fragmentação e a complexidade de implementação dos programas da política de coesão e de divergir da missão central da política de coesão de reduzir as disparidades regionais”.

Estas propostas incluem incentivos para dar prioridade à competitividade, habitação a preços acessíveis, resiliência hídrica, capacidade de produção de defesa e mobilidade militar.

Outra questão levantada pelos auditores da UE é que o dinheiro da coesão seja utilizado atempadamente, por isso sublinham a importância de as regras aplicáveis serem adotadas cedo, para a programação ser mais rápida e haver um bom nível de financiamento antecipado para a execução poder começar a tempo. Coordenar esforços com outros instrumentos de Bruxelas é fundamental. De sete em anos, os novos quadros comunitários de apoio cada vez entram em vigor mais tarde.

Em especial, deve-se garantir que os dinheiros futuros da coesão sejam geridos com suficiente transparência e de forma a poder-se pedir contas aos seus gestores e que haja formas eficazes de recuperar as verbas usadas indevidamente.

Tribunal de Contas Europeu

E quando se discute a possibilidade de aplicar ao pós-2027 a mesma lógica de atribuição de fundos semelhante à do Plano de Recuperação e Resiliência, na qual Bruxelas tem um maior controlo, o TCE alerta que, primeiro “é preciso fazer um balanço das falhas detetadas” no PRR. “Em especial, deve-se garantir que os dinheiros futuros da coesão sejam geridos com suficiente transparência e de forma a poder-se pedir contas aos seus gestores e que haja formas eficazes de recuperar as verbas usadas indevidamente”, lê-se.

O TCE defende uma maior simplificação nos fundos europeus, apelando mesmo à maior utilização da metodologia dos custos simplificados, mas alerta que esta “simplificação não pode ser feita à custa da responsabilização e do desempenho”.

O tribunal concluiu que “as condicionalidades proporcionam fracos incentivos para que as despesas de coesão sejam eficazes”. “Em determinadas áreas, a política de coesão pode já fornecer apoio financeiro para a implementação de reformas, tendo a Comissão proposto recentemente alargar ainda mais este apoio. Embora o Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR)” – que se traduz os PRR nacionais – “tenha sido concebido para apoiar as reformas nos Estados-membros, os resultados em termos de resposta aos desafios estruturais e de contributo para os objetivos da UE têm sido, até à data, limitados”, critica a instituição.

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