Europa precisa de recuperar tradição industrial e apostar na tecnologia, defendem especialistas
Processo de reindustrialização europeu é crítico para o bloco, que enfrenta vários desafios e uma nova ordem mundial com a imposição de tarifas, defendem vários especialistas.
A transferência de produção industrial para regiões com custos mais baixos, como a Ásia, permitiu à Europa desenvolver-se e reinvestir no bem-estar da sua sociedade, mas o modelo europeu revelou-se “insustentável”, explica Pedro Siza Vieira. Para o antigo ministro da Economia, a região apresenta hoje um conjunto de dependências estratégicas que apenas podem ser superadas com a reindustrialização da Europa. Uma opinião partilhada pelos especialistas que participaram na conferência que assinalou o 4.º aniversário da AEMinho.
“Nas últimas décadas a Europa passou por uma perda de indústria“, um resulta “da reorganização da economia global, em função de escolhas que fizeram após Guerra Fria” e que levou tanto a Europa, como os EUA a transferir produção de bens “para regiões onde coisas eram mais baratas”, explica Pedro Siza Vieira, na conferência da AEMinho, que decorreu esta sexta-feira em Ponte de Lima.
O antigo governante realça que esta aposta estratégica alterou a composição do emprego no mundo e “acumulou tensões e gerou muitos riscos no sistema global“. Primeiro foram os EUA que “começaram a sentir-se ameaçados na sua hegemonia”, aumentando o mau estar no mundo ocidental.

Conforme explicou Siza Vieira, a Europa, fortemente exportadora – produz mais do que consome –, deixou de investir na tecnologia do futuro, ficou dependente dos mercados externos e vulnerável a problemas nas cadeias de fornecimento, e dependente dos EUA em muitas outras matérias. Por isso mesmo, o antigo ministro considera que “a reindustrialização é exigência para Europa reduzir as suas dependências estratégicas“. Mas não será uma reindustrialização qualquer.
“A indústria que possa voltar para a Europa não vai ser a de há 30 anos”, atira, explicando que a “indústria viável é altamente automatizada, as fábricas novas não têm gente”. E é nesta “indústria de muitíssimo valor acrescentado que não tem gente” que está o futuro. Há que “encontrar uma forma de desenvolver tecnologia – quem compra aos outros está a dar o valor todo – mas para isso acontecer precisamos gastar mais”.
Além do investimento – e já há sinal de vontade para avançar com estímulos orçamentais, nomeadamente na defesa – é preciso juntar “uma enorme qualidade institucional das instituições europeias e nacionais“, apoiando as empresas e não atrasando bons negócios nacionais, defende.
Ana Lehmann, antiga secretária de Estado para a Competitividade, concorda com a visão de Siza Vieira, alertando para “um momento crítico em que estão a pôr em xeque alianças globais”.
“Esta situação [das tarifas] é absolutamente inviável”, lamenta. Para a responsável, “a Europa não se pode demitir da sua tradição industrial“. “Trump vem-nos dar um abanão e se não aproveitamos, a Europa vai transformar-nos num museu”.
Sofia Tenreiro, a nova CEO da Siemens, realça que “é muito difícil juntarmos a Europa como um todo, mas é isso que precisamos. Há uma área em que temos que apostar mais é na tecnologia, a tecnologia está em tudo”.
A nova líder da multinacional alemã em Portugal acrescenta que a região ainda tem hipótese de recuperar do atraso face a outras regiões, apontando em vários nichos, tirando potencial do talento que existe no continente e fora. “Dou como exemplo a Siemens Portugal, que é um dos seis hubs mundiais. É contra tudo que poderíamos imaginar, somos quase 5.000 pessoas a pensar e desenvolver tecnologias emergentes e de ponta. Tem potencial muito grande, porque vai endereçar temas muito importantes, como competitividade”, explica.
Do lado do financiamento, Gonçalo Regalado, presidente do Banco Português do Fomento, diz que há capital para as empresas investirem, assim haja bons projetos.
“Há excesso de dinheiro em Portugal, falta é projetos de inovação. Um empresário hoje que deva um milhão de euros e o amortize está a poupar 50 mil euros. Um banqueiro que tenha um milhão de euros, deposita-o no BCE e ganha 20 mil euros. Também é um bom negócio. Temos tudo torto. Temos que incentivar os empresários a investir”, defende.
Do lado do BPF, o responsável adianta que a entidade enviou “125 mil garantias pré-aprovadas a 125 empresas, com soluções fixas. E vamos lançar mais 50 mil em julho”.
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