Após perder a presidência do Parlamento Europeu, o líder dos socialistas europeus está focado na eleições de 2019: quer ter uma nova aliança progressiva, mas geringonça portuguesa não é "exportável".
O líder dos socialistas na Europa recusa a possibilidade de haver um perdão da dívida a países como Portugal, mas reconhece a necessidade de existir uma mutualização da dívida através da emissão de eurobonds (obrigações europeias). Gianni Pittela admite, em entrevista ao ECO, que o modelo da geringonça portuguesa “não é exportável”. Contudo, o presidente do grupo dos socialistas e democratas europeus revela que quer construir uma nova aliança progressista dentro da União Europeia para as eleições de 2019, ainda que esse modelo tenha falhado na sua tentativa para ser eleito para presidente do Parlamento Europeu, uma derrota que deixou as três instituições principais da União Europeia nas mãos do Partido Popular Europeu.
Falou com o primeiro-ministro português sobre a renegociação da dívida soberana?
Não discutimos sobre questões específicas de Portugal. O nosso encontro incidiu sobre problemas europeus. Partilhámos apenas a necessidade de existir uma mutualização da dívida através de eurobonds.
Primeiro temos de ultrapassar este período eleitoral em toda a Europa.
Existem condições para o diálogo acontecer neste momento ou é necessário esperar pelas eleições alemãs?
O Parlamento Europeu votou esta semana um requerimento para que exista a mutualização das dívidas. Ainda assim, claro que percebemos que para atingir este objetivo será necessário o suporte dos Governos nacionais. Para sermos realistas, primeiro temos de ultrapassar este período eleitoral em toda a Europa. Contudo, as questões-chave que vão estar na mesa não são apenas a mutualização das dívidas, mas também de um plano de investimento mais forte e uma abordagem diferente do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Pode haver um perdão da dívida?
A questão aqui não é essa [perdão da dívida]. A questão é como é que a dívida vai ser paga. É na revisão das fórmulas e estratégias que deve estar o nosso foco. Estamos a discutir a possibilidade de mutualizar a dívida nacional. O perdão não está em cima da mesa.
O objetivo da sua visita é também ver como funciona o acordo à esquerda no Governo português. No Parlamento Europeu tentaram fazer isso, mas falharam. Essa possibilidade vai tornar-se realidade nas eleições europeias de 2019?
A experiência que se realizou em Portugal tem dado frutos muito importantes para a população portuguesa. Isso é muito relevante. O desemprego está a descer, o défice está bem e é claro que o Governo de António Costa tornou-se muito estável. Contudo, esta experiência não pode ser exportada para fora. Não é um modelo exportável para fora simplesmente porque cada país tem as suas especificidades e peculiaridades. Não podemos reproduzir este modelo em diferentes contextos políticos.
Não podemos ter um sistema onde países em risco de não cumprir o défice imposto pela meta [da Comissão Europeia] podem ser sancionados e países com paraísos fiscais não o sejam.
Na realidade, estou aqui em Portugal para olhar para as eleições de 2019 e, tendo em vista esse objetivo, quero formar uma nova aliança progressiva. Uma plataforma europeia possa ser partilhada com todos os outros líderes europeus e com as forças europeias. Não estamos apenas a falar dos partidos e organizações políticas, mas também com os cidadãos, os sindicatos. Queremos partilhar essa plataforma com todos os atores sociais.
Essa plataforma pode ser o antídoto para os movimentos populistas que avançam hoje em dia na Europa?
A questão aqui é apresentar resultados. A única forma de parar a força e alargamento dos movimentos populistas na Europa é apresentar resultados. Isso significa apresentar medidas positivas para a classe média, claro, mas também para os mais pobres. Esta é a melhor forma para enfraquecer as forças populistas e xenófobas que dão respostas muito simplistas para a crise.
Panama Papers e outras fugas de informações mostraram que existe evasão fiscal na União Europeia. O que pode ser feito para realmente impedir que estas situações ocorram no futuro?
Para mim é preciso fazer duas coisas muito concretas. A primeira medida — e a mais importante — é elaborar um sistema onde as empresas paguem impostos onde têm os lucros. Não pode continuar a existir um padeiro, por exemplo, aqui em Lisboa que paga mais impostos do que as grandes empresas tais como as multinacionais norte-americanas. Esta é a primeira coisa muito importante a fazer.
Não pode continuar a existir um padeiro, por exemplo, aqui em Lisboa que paga mais impostos do que as grandes empresas tais como as multinacionais norte-americanas.
O segundo ponto seria a União Europeia construir, finalmente, uma lista negra de paraísos fiscais. Para isso acontecer temos também de formar uma lista de sanções para esses países que funcionam como um paraíso fiscal. Não podemos ter um sistema onde países em risco de não cumprir o défice imposto pela meta [da Comissão Europeia] podem ser sancionados e países com paraísos fiscais não o sejam. Estamos a lutar para mudar isso.
Os problemas do sistema financeiro e bancário italiano contam com a ajuda suficiente da UE?
A Comissão Europeia, em conjunto com o Governo italiano, está a trabalhar em negociações profundas para chegar a um acordo para resolver a situação e estamos confiantes de que isso acontecerá em breve.
Como se podem resolver os desafios da banca europeia com níveis tão elevados de crédito malparado?
Não é um assunto que passe por mim, tem mais a ver com os Governos nacionais, não só o italiano como os outros. Estes devem discutir com a Comissão Europeia no sentido de encontrar uma solução. Sobre este tema, posso dizer que quando os planos de resolução são aprovados não tem sido dado um período suficiente para a sua implementação. Além disso, as consequências não têm sido bem medidas.
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Gianni Pittella: Geringonça “não é exportável”
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