A sócia da SRS Advogados é a advogada do mês da edição de março da Advocatus. A advogada comparou as funções de um sócio às de um maestro.
Mafalda Alves esteve à conversa com a Advocatus e comparou as funções de um sócio às de um maestro. Para a nova sócia da SRS Advogados, a arbitragem tributária colmatou um dos principais problemas do sistema judicial tributário, a “morosidade”. Sobre o Orçamento do Estado, a advogada mostra-se preocupada com o “aumento da despesa pública” e a “falta de medidas de promoção do investimento e da produtividade”.
Integrou recentemente, enquanto sócia, a SRS Advogados. Como está a ser o início da nova etapa profissional?
Estou muito contente com o passo que dei. A SRS é uma sociedade com uma visão estratégica clara, com a qual me identifico, e com um modelo de governance muito maduro, o que lhe permitiu estar sempre na linha da frente da evolução do “setor” da advocacia em Portugal, mas também lançar as bases e preparar o futuro. A SRS é uma sociedade que está “à frente do seu tempo”, o que me deixa muito otimista.
A SRS nasceu no primeiro “escritório internacional” em Portugal, tendo esse modelo evoluído, mais tarde, para uma parceria internacional, com a Simmons & Simmons. Estes fatores trouxeram-nos o benefício de implementar, há quase três décadas, um modelo de gestão profissional, assente no CA e nos managing partners, bem como de desenvolver, em função da conjuntura aplicável, o nosso modelo de internacionalização. São desafios inerentes à nossa génese, muito trabalhados, mas que nos são “naturais”.
Por outro lado, em minha opinião, um dos maiores desafios das sociedades de advogados atualmente é o alinhamento da sua gestão com as expectativas da liderança do futuro, ou seja, dos sócios dos próximos 5-10 anos. É uma geração que nasceu com a noção de que o trabalho “generalista” pode ser substituído pela tecnologia, cabendo ao advogado “acrescentar valor”, o que, acreditam, permite também uma conciliação da vida profissional com a vida pessoal. A SRS aposta nesta estratégia há muito tempo e está, neste contexto, bem preparada para o futuro.
Um dos maiores desafios das sociedades de advogados atualmente é o alinhamento da sua gestão com as expectativas da liderança do futuro.
Encontrei na SRS é um escritório com profissionais de excelência, um ótimo ambiente de trabalho, um rumo com o qual me identifico e um escritório preparado para os desafios do futuro. Espero, apenas, estar à altura do desafio.
Qual é a principal característica que um sócio deve ter para desempenhar da melhor forma o seu papel?
As funções de um sócio são, em certa medida, semelhantes às de um maestro. É alguém que faz parte da orquestra e que sabe ler a partitura, como qualquer outro músico, garantindo, no entanto, que cada instrumento mantém o “andamento” certo, não podendo por isso deixar de “marcar o ritmo”/de dirigir.
Se, no trabalho que desempenha, o maestro tiver o poder de “inspirar” os seus músicos, a sinfonia será perfeita. Eu tive a enorme sorte de me cruzar com esse(s) sócio(s).
Foi adjunta do Secretário de Estado dos Assuntos fiscais, entre 2013 e 2015. Como foi a experiência?
Ser adjunta do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, do Dr. Paulo Núncio, foi, acima de tudo, um enorme privilégio. Foi uma legislatura que herdou uma herança pesada e que se deparou com uma grave crise económica e financeira. No entanto, esses fatores não impediram que se implementassem as reformas fiscais de que o país há tanto precisava. A reforma do IRC, do IRS e da fiscalidade verde lançaram as bases para uma fiscalidade moderna que, volvidos mais de quatro anos, continua a dotar o país de maior competitividade e a permitir o crescente aumento do investimento estrangeiro.
Não sendo talvez percetível para a maioria dos “não fiscalistas”, assistimos nos últimos dois anos à implementação de um conjunto de normas europeias e internacionais cujo impacto nos operadores económicos poderia ser bastante significativo. No entanto, a antecipação dessas medidas nas reformas realizadas – nomeadamente na reforma do IRC -, permitiram aos operadores nacionais uma “estabilidade” que, não precisando de ser anunciada, reflete a destreza dessas reformas, em linha com as melhores práticas internacionais. Foi um enorme privilégio trabalhar na/e com a equipa dessa Secretaria.
É árbitra do Centro de Arbitragem Administrativa. Quais são as vantagens de recorrer a este meio de resolução de litígios?
A arbitragem tributária veio colmatar um dos principais problemas do sistema judicial tributário – a morosidade. Este problema resulta, muitas vezes, na descapitalização ou na própria inviabilidade de exercício da atividade das empresas. Não sei se estamos perante um sistema perfeito, mas a arbitragem tributária assegura, de facto, uma tutela jurisdicional efetiva. De nada serve o acesso aos tribunais se, após a prolação de uma sentença favorável, a empresa já não dispõe dos meios necessários para laborar.
A arbitragem tributária veio colmatar um dos principais problemas do sistema judicial tributário – a morosidade.
A arbitragem ainda é pouco utilizada no ordenamento jurídico português?
Quase 10 anos depois da introdução do regime, a arbitragem tributária consolidou-se no nosso ordenamento jurídico. A sua consolidação é a melhor prova de que a celeridade inerente à via arbitral serve os propósitos da justiça. Acredito que, enquanto não se resolver o tema da morosidade dos tribunais judiciais, o acesso à arbitragem possa registar uma tendência crescente em Portugal.
O conceito de carga fiscal tem sido muito discutido em Portugal. O Governo tem argumentado que a subida da carga fiscal resulta do impacto positivo que o crescimento económico e a melhoria no mercado de trabalho têm nas contas públicas. Concorda com os argumentos do Governo?
O que o Governo alega é que a receita fiscal tem melhorado em função do crescimento económico e dos níveis de emprego. Quanto à carga fiscal, parece-me claro que não só não diminuiu, com aumentou na última legislatura. Com a argumentação expendida pelo Governo perde-se, em minha opinião, a oportunidade de tornar a nossa economia mais competitiva – a descida da taxa de IRC, que havia sido acordada pelo Governo PS e não se verificou é um ótimo exemplo, resultando da análise histórica da evolução desta taxa que a sua descida pode, inclusivamente, contribuir para uma maior receita fiscal, em resultado da competitividade da economia.
Quanto à carga fiscal, parece-me claro que não só não diminuiu, com aumentou na última legislatura.
Se, em tempo de crise económica, o aumento da carga fiscal pode ser inevitável, não me parece justificável que, face à melhoria das condições económicas, a mesma não seja reduzida.
Como encara o Orçamento do Estado para este ano, tendo em conta o contexto de crise que se vive?
Trata-se, ainda, a esta data, de uma proposta. No entanto, há dois temas fundamentais que me preocupam neste orçamento: por um lado, o aumento da despesa pública (sendo que o aumento do número de funcionários públicos e dos seus salários não se tem refletido na eficiência dos serviços do Estado) e, por outro, a falta de medidas de promoção do investimento e da produtividade (associada à ausência de propostas que colmatem falhas graves de funcionamento dos organismos públicos essenciais ao bom funcionamento da economia).
Como caracteriza o contexto fiscal português atual?
É um contexto marcado, ainda, por uma elevada carga fiscal, que penaliza as famílias e as empresas. Se o aumento da carga fiscal se impôs numa conjuntura de grave crise económica, à escala internacional, a verdade é que essa carga fiscal se está a tornar estrutural.
Por outro lado, sendo evidente o impacto positivo que as reformas do IRC e do IRS tiveram nas empresas e nas famílias, é também certo que nada tem sido feito para potenciar esse efeito. Esta tendência é acompanhada de uma ausência de reformas fundamentais, como a reforma para a sustentabilidade financeira e social do sistema público de pensões.
Não me parece que estejamos no melhor caminho sendo, contudo, essencial garantir que não estamos a “hipotecar” as novas gerações.
Com cerca de 15 anos de experiência, como descreve o seu percurso profissional?
É um percurso de dedicação – tento vestir a camisola e dar o melhor de mim em cada projeto. No entanto, é também um percurso de muita sorte e de oportunidades não sonhadas. Tive o enorme privilégio de trabalhar com os melhores fiscalistas que conheço e de ter sido convidada para projetos que nunca pensei. Espero que o desafio que a SRS me propôs e a confiança depositada neste projeto possam ser o culminar de um percurso de dedicação e, se possível, de sucesso – esforçar-me-ei para que tal aconteça.
Quais são os principais desafios da área de direito fiscal?
São vários. A constante mutação e dificuldade de interpretação da legislação fiscal é, talvez, o maior desafio. Essa dificuldade associada às alterações de paradigma que se têm verificado no direito fiscal internacional resultam num risco acrescido do trabalho que desenvolvemos diariamente.
A constante mutação e dificuldade de interpretação da legislação fiscal é, talvez, o maior desafio.
Por outro lado, o facto de a tributação ter sempre subjacente um facto que carece de enquadramento em outros ramos do direito impõe-nos um maior conhecimento de outras matérias, e uma constante interação com as demais áreas de prática.
Continua, no entanto, a ser uma área muito desafiante, de cujo input os operadores económicos já não podem prescindir.
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Mafalda Alves: “As funções de um sócio são semelhantes às de um maestro”
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