Em breve, o Governo vai apresentar uma Estratégia de Combate à Pobreza Energética, com as alterações à tarifa social (para abranger desempregados e lay-off) e medidas de eficiência energética.
Portugal teve no segundo semestre de 2019 a terceira maior descida da União Europeia nos preços da eletricidade (-4,9%), de acordo com o Eurostat. Ainda assim, o país está no top dos mais caros: os portugueses pagam a quarta eletricidade mais cara da UE para consumo doméstico, em termos de poder de compra das famílias. Já o gás também é o quarto mais caro da Europa, depois da Espanha, Suécia e Itália. A culpa é dos impostos, diz a ERSE, que pesam 49% na fatura. A maior fatia vai para os CMEC e as renováveis.
Em entrevista, por escrito, ao ECO/Capital Verde, a a propósito do Dia Mundial da Energia, o secretário de Estado da Energia, João Galamba, confirmou que, além das descidas de preços conseguidas pelo Governo nos últimos três anos, em 2020, soma-se agora a redução que está a ser aplicada pelos comercializadores em mercado livre, que estão a replicar a “descida dos preços do mercado grossista de eletricidade”. No entanto, “não podemos, neste momento de incerteza, afirmar qual será a evolução futura dos preços da eletricidade no consumidor”, diz o governante.
Em breve, o Governo vai apresentar uma Estratégia de Combate à Pobreza Energética, que incluirá as alterações à tarifa social (para abranger desempregados e situações de lay-off) e as questões da eficiência energética
Sobre os leilões do solar, Galamba confirma que este ano será realizado apenas um, em agosto, e admite que “as condições de mercado podem ser adversas nalguns casos” em termos de decisão de investimento dos interessados.
Portugal teve a terceira maior descida da UE nos preços da eletricidade em 2019. Irá manter-se em 2020 e 2021?
A descida de preços de 2019 não deve ser confundida com a atual descida dos preços no mercado grossista, comum aos vários mercados de eletricidade na Europa. Existem outros elementos relevantes na fixação do preço final de eletricidade pago pelos consumidores, por exemplo ao nível das tarifas de acesso às redes. Assim, não podemos, neste momento de incerteza, afirmar com a devida propriedade qual será a evolução futura dos preços da eletricidade no consumidor, tanto mais que as tarifas de acesso definidas pelo regulador, aplicadas em 2021, só serão conhecidas em dezembro.
Com os preços a descer nos mercados grossistas, as tarifas reguladas de eletricidade já desceram, a seguir serão as do gás. Esta tendência está a ser seguida pelos comercializadores no mercado livre ou os consumidores estão a ser prejudicados?
A descida dos preços do mercado grossista de eletricidade já foi replicada por alguns comercializadores, atendendo também ao papel de referencial, para o mercado retalhista de eletricidade, desempenhado pelas tarifas praticadas pelo Comercializador de Último Recurso, a SU Eletricidade.
Com o teletrabalho e o ensino à distância, as famílias estão a gastar mais luz e gás. Além da expansão da tarifa social aos casos de desemprego e lay-off, que outros apoio dará o Governo no acesso à energia?
Foram implementadas várias medidas de apoio aos consumidores de eletricidade e gás natural, como por exemplo a prorrogação das tarifas transitórias de eletricidade e de gás natural ou o pagamento fracionado de dívidas sem juros até 12 pagamentos mensais. Para lá destas medidas, algumas específicas para o período excecional que vivemos, o Governo está a trabalhar numa Estratégia de Combate à Pobreza Energética, que será anunciada dentro em breve, e nela se incluirão as alterações à tarifa social e as questões da eficiência energética, procurando dar uma resposta mais global a este importante risco que existe na sociedade portuguesa.
O Governo está a trabalhar numa Estratégia de Combate à Pobreza Energética, que será anunciada dentro em breve, e nela se incluirão as alterações à tarifa social e as questões da eficiência energética.
Há que realçar o impacto positivo do teletrabalho na redução dos consumos de combustíveis fósseis associados ao transporte de, e para o local de trabalho, com impacto positivo não só na carteira dos consumidores (aliado também à descida dos preços), mas também nas emissões de gases com efeito de estufa.
Próximos leilões do solar estão marcados para agosto. A pandemia afetará o seu sucesso porque os investidores estão reticentes?
As condições de mercado, como sabemos, podem ser adversas nalguns casos. Essa adversidade está patente na nossa decisão de só realizar um leilão em 2020, mas que em nada compromete os nossos objetivos e a trajetória que estipulamos para estes quatro anos. Uma vez que a capacidade de injeção de eletricidade na rede elétrica permanece um bem escasso, existe bastante procura por ligação à rede, ao mesmo tempo as zonas onde se localizam os lotes que serão colocados em leilão estão em regiões de maior exposição solar, do que aquelas que foram adjudicadas no leilão de 2019.
No fundo, estamos otimistas para o próximo leilão, em boa parte devido ao sucesso do primeiro e pela interação que temos tido com vários promotores. Para 2021 ainda não temos nada estipulado, mas é certo que, havendo metas para cumprir, serão necessários novos leilões nos próximos anos, os quais, e à semelhança do próximo leilão, poderão trazem novidades.
A expansão das renováveis está a correr como previsto ou já se nota uma travagem por causa do Covid-19?
Do que nos é possível avaliar, quer pelos contactos que temos tido com os promotores, quer pelas informações que temos recebido das nossas entidades, a expansão das renováveis mantém-se no ritmo esperado. Os centros eletroprodutores renováveis em construção mantém, regra geral, o cronograma proposto, e no caso dos projetos vencedores do leilão de 2019 mantém-se o calendário previsto. Para aliviar alguns dos constrangimentos, em particular no decorrer do estado de emergência, tomamos uma importante medida, entre outras, que permitiu a substituição do certificado de exploração por um certificado provisório para promotores de Unidades de Produção para Autoconsumo (UPAC) e Unidades de Pequena Produção (UPP), possibilitando que 220 projetos de pequenos produtores de energia elétrica e produtores em autoconsumo de energia renovável (capacidade instalada inferior a 1MW e num total de 30 MW), que aguardavam licenciamento, pudessem começar a produzir de imediato.
A transição para um novo modelo de consumo energético é o ambiente natural para o desenvolvimento de novos modelos de negócio, mais sustentáveis, mais resilientes e alinhados com os objetivos de longo prazo.
As alterações climáticas e os seus impactos convocam o país para uma resposta coletiva inequívoca que o contexto da pandemia causado pelo Covid-19 veio reforçar. Ao mesmo tempo que nos exigem respostas, as atuais circunstâncias mostram-nos novos caminhos e oportunidades que importa aproveitar. A transição para um novo modelo de consumo energético é o ambiente natural para o desenvolvimento de novos modelos de negócio, mais sustentáveis, mais resilientes e alinhados com os objetivos de longo prazo, nomeadamente quanto ao seu impacto no caminho para a neutralidade carbónica. Exemplo destas novas oportunidades, é a aposta de Portugal no hidrogénio verde (renovável) o qual irá mobilizar importantes investimentos (previsão de 7000 milhões de euros em projetos de produção até 2030) e que terá potencial para dinamizar um novo ecossistema económico, aliado ao enorme potencial para a descarbonização.
Em termos de política energética, quais são os aspetos mais relevantes que destaca em Portugal?
Se olharmos aos últimos dois anos, e no que toca à política energética, podemos afirmar que alcançámos importantes conquistas. Não seguindo propriamente uma ordem de importância, destacaria:
- Em primeiro lugar o facto de Portugal se encontrar no bom caminho para alcançar a meta de renováveis para 2020. Em 2018, Portugal alcançou uma incorporação de renováveis no consumo final bruto de energia de 30,3%, muito próximo da meta de 31,0% para 2020, o que demonstra o caminho percorrido por Portugal nos últimos anos, sendo um dos países da União Europeia com maior incorporação de renováveis (6.º em 2018).
- Em segundo, e nunca é demais realçar, os resultados muito positivos alcançados no primeiro leilão de atribuição de capacidade de receção na rede realizado em 2019 e onde se alcançaram resultados históricos à data (tarifa média ponderada atribuída no regime garantido foi de 20,33 €/MWh, com um mínimo de 14,76 €/MWh e máximo de 31,16 €/MWh) e que estamos certos que podem ser replicados no próximo leilão a realizar brevemente.
- Em terceiro lugar, aprovámos o Plano Nacional Energia e Clima 20021-2030 (PNEC 2030) que constitui o principal instrumento de política energética e climática nacional para a próxima década rumo a um futuro neutro em carbono, que estabelece metas ambiciosas, mas exequíveis, para o horizonte 2030 (redução das emissões de gases com efeito de estufa entre 45% a 55%, 47% de energia proveniente de fontes renováveis e 20% no setor dos transportes, redução de 35% no consumo de energia primária e 15% de interligações elétricas) concretizando as políticas e medidas rumo à neutralidade carbónica em 2050 ao mesmo tempo que posiciona Portugal novamente entre os países mais ambiciosos da Europa no combate às alterações climáticas.
- Em quarto, implementamos o novo regime para o autoconsumo e comunidades de energia renovável (Decreto-Lei nº 162/2019) o qual possibilita e fomenta o autoconsumo individual, o autoconsumo coletivo e possibilita a constituição de comunidades de energia, permitindo que cidadãos, empresas e demais entidades públicas e privadas, produzam, consumam, partilhem, armazenem e vendam a energia produzida a partir de fontes de energia renovável, participando, assim, ativamente na transição energética. Neste âmbito estamos certos, pela dinâmica já criada, que este novo regime trará grande oportunidades para o setor energético, mas também para os consumidores, sejam eles domésticos ou empresariais.
- Em quinto, e mais recentemente, aprovámos, para consulta pública e discussão com os agentes do setor, a Estratégia Nacional para o Hidrogénio que tem como objetivo principal introduzir um elemento de incentivo e estabilidade para o setor energético, promovendo a introdução gradual do hidrogénio enquanto pilar sustentável e integrado numa estratégia mais abrangente de transição para uma economia descarbonizada. Esta Estratégia visa introduzir um elemento de incentivo e estabilidade para o setor energético, promovendo a introdução gradual do hidrogénio, enquanto pilar sustentável e integrado, numa estratégia mais abrangente de transição para uma economia descarbonizada, e deve também ser entendida como facilitadora do cumprimento das metas e objetivos que já constam do PNEC 2030, baixando os custos da estratégia de descarbonização proposta.
- Em sexto, estamos em vias de aprovar, após um processo de consulta pública, a Estratégia de Longo Prazo a Renovação de Edifícios a qual assenta de forma integrada, e em paralelo, em três objetivos: (i) melhoria das condições de vida nos edifícios, tendo como prioridade a mitigação da pobreza energética, o conforto térmico, a melhoria da qualidade do ar interior e a promoção da saúde e bem-estar dos ocupantes; (ii) oportunidade de crescimento económico por via dos cobenefícios associados à renovação do parque de edifícios existentes; (iii) cumprimento das metas ambientais e energéticas definidas no Roteiro para a Neutralidade Carbónica e no Plano Nacional de Energia e Clima. Em paralelo com todas estas iniciativas, destacava igualmente outros importantes marcos recentes.
Além de tudo isto, antecipámos o fim da produção de eletricidade a partir de carvão, a qual cessará no Pego até 2021 e em Sines até 2023; assegurámos pelo terceiro ano consecutivo uma redução no preço da eletricidade para as famílias; licenciámos mais de 1.200 MW de energia renovável sem tarifas subsidiadas, sendo expectável que até final de 2020 estejam ligados um total de cerca de 1,5 GW de solar fotovoltaico, duplicando a atual capacidade instalada; a dívida tarifária será reduzida em 46%, de 5.080 milhões de euros em 2015 para 2.757 milhões de euros em 2020; desbloqueámos o sobreequipamento eólico, enquanto via racional e eficiente para aumentar a capacidade instalada eólica; aprovámos o primeiro Plano de Desenvolvimento e Investimento na Rede de Transporte de Eletricidade para a próxima década (PDIRT-E 2018-2027) num montante total de investimento de cerca de 535 milhões de euros na Rede de Transporte de Eletricidade; aprovámos os primeiros Planos de Desenvolvimento e Investimento das Redes de Distribuição de Gás Natural 2019-2023 (PDIRD-GN 2018) num montante total de investimento de cerca de 300 milhões de euros nas Redes de Distribuição de Gás Natural.
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