É um exercício de auto-avaliação. Das 67 promessas de “virar a página da austeridade” no Programa de Governo, António Costa virou 42, está para virar 15, e ainda não virou 10.
No dia debate do Estado da Nação, que coincide com o último ano de legislatura, o Governo de António Costa revisitou o seu Programa de Governo para fazer um balanço do que foi e não foi feito nos últimos quatro anos.
Diz o Governo, neste exercício de autoavaliação, que já cumpriu 81% das medidas inscritas no seu programa e sustenta que estão em curso 10% das 19% de medidas ainda por concluir.
Este balanço de atividade consta de uma nota divulgada pela Secretaria de Estado dos Assuntos Parlamentares em referência a um ‘site’ hoje lançado pelo Governo www.prestarcontas.gov.pt.
O capítulo do programa de Governo que talvez diga mais aos portugueses é precisamente o primeiro, que António Costa intitulou de “Virar a página da austeridade”. Neste capítulo, o Governo diz que já cumpriu 85% das medidas, ou seja, 57 das 67 promessas.
Mas as contas do Governo pecam por algum otimismo, já que para chegar aos 85% o Governo soma as “medidas cumpridas” às “parcialmente cumpridas”. Sendo que algumas destas “parcialmente cumpridas” estão no Parlamento e já não dependem do Governo.
No total das 67 promessas, 42 segundo o Governo já foram integralmente cumpridas, 15 parcialmente cumpridas e 10 ainda não saíram do papel.
As páginas viradas da austeridade
Entre as medidas “integralmente cumpridas” (ver listagem em baixo), o Governo destaca medidas emblemáticas que falam diretamente para os bolsos dos portugueses, como o fim da sobretaxa de IRS, a reposição da atualização anual das pensões, a redução do IVA da restauração para 13% e a subida do Salário Mínimo Nacional, que passou de 505 para os atuais 600 euros.
Há outras medidas que o Governo classifica de integralmente cumpridas, mas que têm uma avaliação subjetiva. É o caso da promoção de “uma cultura empreendedora nos jovens (módulos, cursos e estágios de empreendedorismo)”.
Nas medidas “parcialmente cumpridas”, o Governo sublinha o “combate à excessiva precarização das relações laborais” ou a “revogação da norma (Código Trabalho) que permite contratar a termo para postos de trabalho permanentes jovens à procura do 1º emprego ou desempregados de longa duração”. Estas matérias já estão a ser votadas no Parlamento.
A descida da TSU que ficou pelo caminho
Entre as promessas de viragem de austeridade não cumpridas, a mais emblemática é o “apoio complementar ao aumento do rendimento das famílias (redução progressiva e temporária da taxa contributiva dos trabalhadores com salário base inferior a 600 euros)”.
Esta medida foi importada do estudo feito pelo grupo de 12 economistas — do qual fazia parte Mário Centeno — que serviu de inspiração e base ao programa económico do Governo. A promessa era reduzir a contribuição social paga pelos trabalhadores de forma gradual, entre 2016 e 2018, passando o valor dos 11% atuais para 7%. A partir daí, a taxa voltaria a subir novamente até aos 11%, mas de forma ainda mais gradual, de 0,5 pontos ao ano até 2026.
Esta medida ficou pelo caminho logo aquando da negociação dos acordos com o Bloco de Esquerda e PCP.
No grupo de dez medidas não cumpridas, o Executivo de António Costa elenca também uma das bandeiras do programa eleitoral, mas que não saiu do papel: “a criação do Complemento Salarial Anual (tendo em vista situar o rendimento dos trabalhadores com baixos salários e elevada rotação do emprego acima da linha da pobreza)”.
Neste lote das 10 medidas por cumprir, o Governo inclui ainda a revogação “do banco de horas individual por mero ‘acordo’ entre o empregador e o trabalhador”. Esta é outra das medidas está no Parlamento, sendo que a intenção do PS é manter os bancos de horas individuais existentes durante um ano e criar, em alternativa, a figura de um novo banco de horas grupal.
✔️Medidas integralmente cumpridas
- Reposição, nos valores de 2011, da prestação Complemento Solidário para Idosos (CSI)
- Reposição, nos valores de 2011, da prestação Rendimento Social de Inserção (RSI)
- Programa Nacional de Apoio à Economia Social e Solidária
- Potenciar a inovação social (surgimento de novas organizações ou iniciativas sociais)
- Extinção da Sobretaxa sobre o IRS entre 2016 e 2017
- Reposição da atualização anual das pensões, suspensa desde 2010
- Reposição, nos valores de 2011, da prestação Abono de Família
- Adaptação do quadro regulamentar de aplicação dos fundos comunitários (maior celeridade e remoção de constrangimentos)
- Dinamizar o investimento e melhorar a capacidade de atração de financiamento, em rubricas orçamentais europeias
- Criar condições e capacidade técnica para o máximo aproveitamento de fundos europeus (Portugal 2020 e outros)
- Dinamizar o acesso a fundos comunitários (maior transparência, acessibilidade e clareza nas condições de acesso)
- Captação de fundos provenientes de investidores internacionais (de natureza institucional e de natureza personalizada)
- Aplicação de recursos financeiros em empresas e investimentos estratégicos, inseridos em clusters
- Benefício fiscal do custos de financiamento de empresas (promovendo o recurso a capitais próprios e a redução dos níveis de endividamento bancário)
- Duplicação do crédito fiscal para investimentos acima de 10M€ e desburocratizar a concessão de um crédito fiscal automático
- Instituir uma lógica de serviço e atendimento personalizado aos investidores (nacionais e internacionais)
- Reduzir a dependência de crédito bancário, reforçando o papel do mercado de capitais no financiamento das PME, em especial através de instrumentos de capital
- Aceleração dos processos de reestruturação empresarial e capitalização (redução de dívida e sua conversão em capital)
- Benefícios fiscais (IRS) para quem decida investir no capital de startups
- Campanhas de divulgação das potencialidades de acolhimento de investimento estrangeiro
- Promover a captação de investimento estrangeiro na rede da diáspora portuguesa (países de acolhimento)
- Plano de atração de investimento estrangeiro estruturante, potenciando o desenvolvimento estratégico da economia
- Aprovar medidas de simplificação administrativa, para reduzir custos de conteito na vida empresarial, focando-as nos aspetos mais críticos para a actividade das empresas
- Relançar o programa «Licenciamento Zero», orientado para o investimento e para atividades empresariais
- Investimentos seletivos e complementares que valorizem o investimento público já realizado, criem sinergias e potenciem recursos (C&T, recursos naturais ou posição geoeconómica)
- Redução do IVA da restauração para 13%
- Criação de programas de forte incentivo à reabilitação urbana, um setor fortemente potenciador de emprego
- Reposição do pagamento dos complementos de reforma nas empresas do Sector Empresarial do Estado
- Revalorização gradual do Salário Mínimo Nacional (2016 a 2019), num quadro de reforço da Concertação Social
- Desbloquear a Contratação Colectiva, nomeamente por via da emissão de portarias de extensão
- Reposição dos feriados suprimidos em 2012 (feriados civis de 5 de outubro e 1 de dezembro e dois feriados religiosos)
- Desbloquear a negociação coletiva no setor público (negociação de matérias salariais e horários de trabalho)
- Combate à utilização desvirtuada de políticas ativas de emprego (associadas à precariedade e à desvalorização do trabalho)
- Programa de reconversão de competências, orientado para o setor das tecnologias de informação e comunicação
- Criação de uma Rede Nacional de Incubadoras
- Promover a cultura empreendedora nos jovens (módulos, cursos e estágios de empreendedorismo)
- Facilitar a demonstração da existência de contratos de trabalho em situações de utilização indevida de contratos de prestação de serviços
- Reavaliar o regime de entidades contratantes (esforço contributivo de empregadores e trabalho independente mais equilibrado)
- Revisão das regras para determinação do montante de contribuições a pagar pelos trabalhadores a recibo verde
- Avaliação do regime de proteção no desemprego para trabalhadores independentes
- Avaliação dos riscos cobertos pelo regime de trabalho independente (equilíbrio entre deveres e direitos contributivos, vinculação ao sistema previdencial de Segurança Social)
- Eliminação progressiva do recurso a trabalho precário e programas de tipo ocupacional no setor público
Medidas parcialmente cumpridas
- Tributação favorável de mais-valias mobiliárias ou imobiliárias aplicadas em startups
- Regime fiscal favorável (na tributação de mais-valias resultantes do sucesso dos projetos destas empresas)
- Fomentar a criação de parcerias entre entidades do setor público e da economia social
- Resolução mais célere e barata de conflitos, em centros de resolução alternativa, na utilização de fundos comunitários
- Novos instrumentos de financiamento do investimento de empresas de menor dimensão (crowdfunding e peer2peer)
- Medidas que facilitam o acesso à contratação pública a novas PME
- Apostar na valorização do território como forma de atrair investimento estrangeiro
- Lançar o programa «Declaração Única», suprimindo obrigações declarativas e comunicações obrigatórias para o Estado e outras entidades públicas que não sejam necessárias
- Criação de programas de recuperação do património, que potenciam o aumento de emprego
- Criação de uma grande aceleradora de empresas, que apoie a internacionalização de startups
- Criação de uma Rede Nacional de Fab Labs (prototipagem)
- Combater a excessiva precarização das relações laborais através da modelação do regime contributivo aplicável aos contratos a termo e outras formas de contratação não permanente no sentido de desincentivar o recurso a relações de emprego atípicas
- Melhorar a capacidade inspetiva e de atuação em matéria laboral, reforçando a ACT (dissuadindo o incumprimento das regras laborais)
- Revogação da norma (Código Trabalho) que permite contratar a termo para postos de trabalho permanentes jovens à procura do 1º emprego ou desempregados de longa duração
- Limitação dos contratos de trabalho de duração determinada a necessidades devidamente comprovadas
❌Medidas não concretizadas
- Apoio complementar ao aumento do rendimento das famílias (redução progressiva e temporária da taxa contributiva dos trabalhadores com salário base inferior a 600€)
- Modernização e consolidação (simplificação administrativa e promoção de redes municipais de economia social)
- Criação de uma linha de adiantamento financeiro para microempresas com investimentos em I&D
- Aprovar um regime de «Taxa Zero para a Inovação», dispensa de pagamento de taxas administrativas e emolumentos (empresas criadas por jovens investidores e start-ups inovadoras)
- Revisão e simplificação do regime aplicável às zonas empresariais responsáveis (ZER)
- Criação do Complemento Salarial Anual (tendo em vista situar o rendimento dos trabalhadores com baixos salários e elevada rotação do emprego acima da linha da pobreza)
- Revogar a existência de banco de horas individual por mero «acordo» entre o empregador e o trabalhador
- Apoio a reformas a tempo parcial e incentivos à contratação de jovens desempregados ou à procura do primeiro emprego
- Programa de apoio ao emprego para empresas que contratem simultaneamente jovens desempregados ou à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração
- Adoção de mecanismos de arbitragem e utilização de meios de resolução alternativa de litígios (conflitualidade laboral)
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
As 10 páginas da austeridade que Costa ainda não virou. E as 42 promessas cumpridas
{{ noCommentsLabel }}