O espaço de trabalho são muitas obras de arte

Os escritórios das empresas estão em constante mutação e, cada vez mais, apostam numa modernização das suas instalações. Ver uma peça de arte numa sala de reuniões já não é assim tão pouco comum.

Modernos, tecnológicos, artísticos. Cada vez mais as empresas veem o espaço de trabalho como algo mais. Palavras como “transparência”, “identidade” e “inovação” serviram de mote para uma disrupção da mentalidade das empresas. “É um fator de enorme impacto na dinâmica do trabalho e na cultura das organizações”, nota Matilde Horta e Costa, corporate affairs & talent director da sociedade de advogados Vieira de Almeida (VdA).

Na visão de Nuno Galvão Teles, managing partner da sociedade Morais Leitão, o espaço de trabalho é uma “peça central” na qualidade do trabalho. “O design e a arquitetura têm impacto na medida em que representam uma visão de negócio e uma identidade própria”, nota o managing partner.

Para o arquiteto Miguel Saraiva, CEO do ateliê Saraiva+Associados (S+A), as empresas pugnam cada vez mais por uma modernização dos espaços e é uma “obrigação para com aqueles que preenchem o dia-a-dia do espaço “empresa”.

Um espaço cuidado e moderno pode ser um fator de produtividade para os trabalhadores de uma empresa. “Num tempo de desafio persistente, as pessoas precisam de se sentir bem no local de trabalho. Sentindo-se bem, os ganhos de produtividade são quase imediatos, fruto da motivação mais adequada”, nota Nuno Galvão Teles.

Também a empresa portuguesa Landing.jobs, fundada por José Paiva e Pedro Carmo Oliveira, considera que o atual espaço de trabalho que possui influencia a produtividade da equipa.

Com uma coleção de arte iniciada há 20 anos pela Fundação PLMJ, Patrícia Dias Mendes, diretora da Fundação, garante que a arte museológica “desenvolve a criatividade dos recursos humanos e, logo, estimula e aumenta a produtividade”.

VdA: um edifício “de” e “com” histórias

Na sociedade de advogados VdA é fundamental que os “espaços se adaptem à evolução das formas de trabalhar mas que sejam, também, ambientes onde os colaboradores se revejam, vivam e tomem como seu, e aí se inspirem”, explica Matilde Horta e Costa. Neste seguimento, todos os gabinetes possuem uma peça de arte. A sociedade liderada por João Vieira de Almeida é composta por obras de diferentes artistas contemporâneos, como de Rui Chafes, José Pedro Croft e Ana Pérez-Quiroga, adaptando o espaço às novas formas de trabalho.

“Quisemos que o edifício da VdA em Lisboa fosse um lugar de histórias e com história, não só porque representa a valorização de um legado patrimonial e cultural do original, mas porque é um espaço pensado para uma firma com cerca de 45 anos de história”, assegura a corporate affairs & talent director da sociedade. Recentemente, a VdA mudou de instalações e reabilitou, na zona de Santos, em Lisboa, uma antiga fábrica metalúrgica do século XIX com o intuito de valorizar o “edifício preexistente, respeitando a sua história e memória”. O projeto ficou a cargo da OPENBOOK Architecture e PMC Arquitectos e foi premiado internacionalmente.

O novo espaço de trabalho da sociedade é “mais amplo” composto por gabinetes “transparentes e desenhados ao detalhe”, escadas “largas, abertas e transversais entre pisos” e ainda por “zonas comuns, multifuncionais, como lounges e meeting points“.

“Partimos o mármore”

No último ano a Morais Leitão também levou a cabo várias alterações na imagem e no espaço de trabalho. “Partimos o mármore”, foi a metáfora usada por Nuno Galvão Teles para resumir a “reconversão” da arquitetura da sociedade de advogados. “Na receção e no nosso último andar partimos mesmo o mármore, substituindo-o por materiais mais claros. Mas, simbolicamente, cai o mármore, uma pedra que é linda, que é digna, mas que é pedra pesada, e que representa um passado e uma advocacia que já não existem”, explica.

No escritório são expostas peças de autores “maioritariamente portugueses” como Cabrita Reis, José Pedro Croft, Júlio Pomar e Pedro Calapez, através da parceria que possuem com a Fundação Serralves. A inovação do espaço da Morais Leitão centra-se, no entanto, na parede que permite a exposição permanente de obras de arte digital, oriunda do Collective of Two (Gonçalo Santana Ferreira e Vasco Borges).

Arte nos escritórios
A sociedade possui uma obra de arte digital, oriunda da Collective of Two (Gonçalo Santana Ferreira e Vasco Borges). A obra combina tecnologia com escultura em tempo real.Hugo Amaral/ECO

“A primeira obra exposta combina tecnologia com escultura em tempo real. Os movimentos dos nossos computadores enviam sinais para a “tela”, pequenas explosões e traços de energia que são o caos aparente do trabalho anónimo e individual”, conta Nuno Galvão Teles. O sócio acrescenta ainda que nesta peça de arte existe ao centro “uma força gravitacional força-os a formar uma esfera perfeita, mas sempre desafiada pelo permanente movimento dos dedos nos teclados e ratos”. Ou seja, quanto mais atividade houver no escritório, mais luz tem a esfera.

De um restaurante a uma empresa de recrutamento moderna

A empresa Landing.jobs também mudou a sua sede recentemente e, apesar de o espaço estar apenas a 90%, está a tornar-se naquilo que idealizaram. Pedro Carmo Oliveira, cofundador, conta à Pessoas/Advocatus que o local onde se sediam é um local histórico.

Isto era um restaurante self service, o primeiro do género em Portugal, e foi inaugurado a 25 de abril de 1973. No ano em que iria completar o seu primeiro aniversário, organizaram uma festa e compraram centenas de cravos para a festa. Quando chegaram para trabalhar estava a decorrer um golpe de Estado e disseram para levarem as flores porque iriam estragar-se. A senhora levou e distribui pelos soldados”, explica Pedro Oliveira, assegurando querer fazer um mural em homenagem depois de descobrir a história.

O espaço de trabalho da empresa é composto ainda por uma mural do artista Eduardo Nery que é transversal a todos os andares do prédio. “Houve gente de fora que olhou para o painel de Nery e disse: ‘isto tem a ver com a vossa marca’. Porque a nossa marca tem muitas cores verdes e é retilínea”, conta Pedro Oliveira.

Arte nos escritórios
Na sede da empresa existe um mural do artista Eduardo Nery que é transversal a todos os andares do prédio.Hugo Amaral/ECO

Sedeada na zona do Marquês de Pombal, a Landing.jobs é ainda composta por uma zona de meetups com baloiços, puffs e relvado artificial que permite aos trabalhadores terem reuniões informais, conviverem e fazerem as suas refeições. “Sabíamos muito bem o que não queríamos: o open space, que é uma das piores coisas para a produtividade, principalmente numa cultura portuguesa. Cada sala cria a sua microcultura”, remata o cofundador.

“A coleção de arte é “camaleónica””

A sociedade de advogados PLMJ possui uma fundação que contém uma galeria com cerca de 1.300 obras de artistas portugueses e de países de língua oficial portuguesa. “Uma coleção de arte inserida em espaço de trabalho é um fenómeno que se tornou “profissionalizado”, ficando além de uma mera intenção decorativa”, nota Patrícia Dias Mendes, diretora da fundação.

Fotografia, pintura, escultura, desenho e vídeo são “categorias versadas” na coleção da Fundação PLMJ, criadas por “artistas já consagrados, mas também por artistas emergentes”.

As peças de arte estão expostas na galeria num dos andares da sociedade e nos gabinetes dos trabalhadores.

“A coleção de arte é ‘camaleónica’ no sentido da sua regular mudança, quer no edifício sede e escritórios PLMJ, onde os advogados e colaboradores têm a possibilidade de escolher obras de arte para os seus respetivos gabinetes, mas também porque a Fundação PLMJ organiza anualmente diversas exposições em território nacional e internacional”, conta a diretora.

“Trazer arte para a vida das pessoas”

A Saraiva+Associados (S+A), um ateliê com representação em 13 países, considera que o espaço de trabalho “tem de ser parte integrante do ADN das pessoas”, refere Miguel Saraiva, CEO e fundador do ateliê.

“A componente de confronto com arte e funcionalidade é essencial para o bem-estar dos nossos colaboradores e clientes. Hoje é uma das partes mais importantes da nossa imagem”, nota o CEO.

Arte nos escritórios
O ateliê de Miguel Saraiva é composto por diversas obras, como o mural de Akacorleone (Pedro Campiche) que pretende “trazer arte para a vida das pessoas”.Hugo Amaral/ECO

O ateliê de Miguel Saraiva é composto por diversas obras, como o mural do Akacorleone (Pedro Campiche), uma escultura de João Castro Silva e bustos feitos por ceramistas da Viúva Lamego, anteriores a 1923. Com todas estas peças, a S+A pretende “trazer arte para a vida das pessoas, acrescentar algo no seu dia de trabalho, criar sentimentos distintos entre os vários colaboradores”.

Advocacia, Alfama e arte

A Abreu Advogados procura um espaço de trabalho “funcional”, “sóbrio” e “adequado” à atividade que desenvolve e que promova a “transparência, a colaboração e o conhecimento” na sociedade. “Somos por natureza inovadores, disruptivos e provocadores, sempre com o fito na qualidade do nosso trabalho ao serviço dos clientes”, nota Manuel Andrade Neves.

Com uma nova sede em Alfama, a sociedade de advogados entendeu que necessitava de um “projeto cultural que soubesse aproveitar o edifício”. Uma obra do português Bordalo II compõe o anfiteatro o que, para sócio, foi uma aposta “na mosca”, uma vez que cumpriu todos os objetivos idealizados.

Atualmente têm firme uma colaboração com a Associação Carpe Diem Arte e Pesquisa que possibilita uma “série de exposições de artistas plásticos portugueses com a curadoria de Lourenço Egreja”, conta Manuel Andrade Neves. Para 2020 são esperados novos artistas para compor o espaço de trabalho da sociedade, como Teresa Palma Rodrigues, Cristina Ataíde, Manuel Caeiro, Rui Pedro Jorge, Betina Vaz Guimarães e Sofia Leitão.

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